Na época de finados, minha mãe sempre os utilizava, pois carregados com material de limpeza, baldes, vasos, flores, vassouras e escovões, lá íamos rumo ao cemitério para a faxina dos túmulos de nossa família. Nós, pequenos, adorávamos o programa.
Em frente à prefeitura havia o Bar São Jorge que vendia um pão de forma muito bom. Todo final de tarde, eu ia compra-lo. Certa vez na minha ausência, a mãe mandou minha irmã, Flávia. Como não tinha os Cr$ 5,00, deu-lhe uma nota de Cr$ 50,00 – aquela nota roxinha da princesa Isabel – com recomendação que no bar, fosse direto ao balcão e que tivesse cuidado com o troco, pois eram cinquenta cruzeiros! Flávia confusa ante toda a responsabilidade, chegou ao balcão e disse: “Moço, eu quero um pão de cinquenta!”, ao que ele respondeu: “Minha filha, pão de cinquenta só se for daqui até a Prefeitura!”
Naquelas imediações havia uma papelaria, pequenininha, atendida por uma senhora idosa muito atenciosa. Ficava esta loja acima do nível da calçada, havendo depois da porta alguns degraus até o balcão. Às vezes estavam ali uma moça muito bonita e um rapaz, provavelmente parentes da proprietária. Há alguns anos encontrei na fila de supermercado esta moça – quarenta anos depois – e para lhe ser agradável, comentei sobre a simpatia da sua mãe, quando eu pequeno ia à papelaria. Ela respondeu: “minha mãe nunca teve lojinha na rua Hercílio Luz! Eu sou uma Brandão!” Pesquisando depois, descobri afinal que a senhora tão simpática era sua sogra, da família Gonzaga. Em junho de 1958, fui pegar um despertador que estava no conserto na Relojoaria Benno. Ficava ela em um prédio baixo e antigo, bem em frente à Sociedade Guarani. Recebi o relógio, paguei e quando estava indo embora o rapaz que lá trabalhava disse: “Bom que tu vieste agora, pois já ia fechar a loja para ir ouvir em casa o jogo Brasil x França”. Comentei então que ainda faltava meia hora para o início, mas ele me explicou: “Sei disso, mas eu adoro ouvir “A Marselhesa!” Hoje, quando vejo esta pessoa – um – senhor recordo de quanto era diferente o ensino na época. Dizia-se que se procurava o “saber – universal”, muita cultura geral. Cultura inútil? Duvido.
Não posso precisar se foi em 52 ou 53. Meu pai e eu voltamos da missa da Matriz, então a igrejinha da Imaculada, pela Hercílio Luz. Paramos na esquina com a Sete de Setembro onde a sede do Guarani estava sendo construída. Na rua, pessoas cercavam um carro batido na noite da véspera. Neste acidente tinha falecido o filho do Seu João e da Dona Luíza, nossos vizinhos de frente e donos da Bombonière Itajaí. Acidentes deste tipo eram muitos raros e foi meu primeiro contato com a tal fatalidade, pois conhecia o rapaz.
Mais adiante, a loja do seu Abécio Werner. Em frente ao Hotel Garcia, sabem? Lá, tinha de tudo. Desde as serrinhas tico-tico dos nossos trabalhos manuais do Salesiano, às gaiolas, ferramentas, fios, parafusos, fechos, fechaduras, puçás, anzóis, etc, etc, etc... Seu Abécio tinha o dom de adivinhar o que as pessoas queriam. Aquele ganchinho que pega assim, para segurar aquela coisa assim, naquele lugar assim, tudo com mímica. Ele entendia tudo e trazia a coisa certa. Na época, quando uma pessoa não conseguia se explicar direito, logo se dizia: “Tás me achando com cara de Abécio Werner?”.
E a Hercílio Luz, com mão dupla, com pouco trânsito, onde se localizava a maior parte do comércio de Itajaí, tinha outras histórias. Muito papo para outras conversas...
Em tempo: O terno da sorte, atribuído a Egon Müller era de fato do Elias Krieger. Ele, modesto, não quis esta correção. Disse-me que o Egon era amigo e barrosista bastante para levar o crédito. Mas esclareceu: o terno era preto de risquinhas brancas.