Crônicas da vida urbana
Por Crônicas da vida urbana -
OS MASCARADOS
Um cartum, de meados dos anos sessenta, mostrava uma moça num balcão de loja. Ela apresentava ao vendedor um jeans – que nessa época entravam no mercado – com as formas de seu corpo, e este lhe dizia:
- Não podemos trocar a peça, senhorita – há evidências de ter sido usada...
Outra entrada para o assunto, são as proverbiais colocações da minha avó:
- O uso do cachimbo faz a boca torta.
Embora se guarde a quarentena com o máximo de rigor, não há como subsistir sem uma ou outra fugida até a agência bancária ou, principalmente, ao supermercado. Situações nas quais, evidente, há que usar a tal máscara. E aí penso que, se algum dia essa pandemia passar, e antes de chegar a próxima, estaremos todos com orelhas de abano, forçadas para a frente pelos elásticos.
Aliás alguém que entenda de logística me explique: por que essas máscaras têm que vir da China – origem do vírus, não esquecer – quando são de confecção simples, dá prá fazer em casa assistindo novela?! Até vôos charters para trazê-las estão sendo programados, e só aí já tem um rio de dinheiro envolvido, com alguém ganhando muito dinheiro.
Fala-se na crise que se seguirá, e fará com que a gente se arrependa de não ter contraído o vírus. Não seria uma forcinha à economia regional, encomendar às confecções brasileiras – principalmente as pequenas, vítimas mais fáceis – essas máscaras?
Mas voltando ao assunto das orelhas, logo vão surgir as variantes capitalistas: máscaras da griffe Armani ou Prada – em volta deles, a coisa está feia – para frequentar shoppings e lojas chiques. E as feitas com camiseta velha, para uso cotidiano... adivinhe quais irão se tornar sonhos de consumo. Ou então, algum herdeiro de casa real divulgando a necessidade das máscaras...
Quem, quando piá, brincava de Zorro – ou de Irmãos Metralha - já tem prática no uso de máscara. Talvez por isso, dizia-se também do cara metidão, posudo, se achando o máximo sendo muito pouca porcaria: “é um mascarado”. Mas nós, dessa geração, e que somos o atual grupo de risco, sabemos que aquelas máscaras, também usadas em carnaval para garantir algum anonimato na folia, não servem na atual conjuntura: não garantem o nariz e a boca... Atualmente, as boas seriam aquelas tipo Jedi, cobrindo o rosto todo e com filtros que, além do mais, dão um tom cinematograficamente cavernoso à voz. Pode ser útil.
Lá nas bandas do extremo-oriente, é comum ver nos filmes pelas ruas, muita gente mascarada – lá, como proteção contra a poluição. Cenário surrealista que aos poucos se está configurando nas cidades brasileiras. Quer dizer, vamos pelo mesmo caminho, e vamos nos sentir ricos, vivendo em regiões ultra industrializadas – e não apavorados com pandemia.