Se você quiser ser livre, em sentido absoluto, impondo suas vontades e seus interesses sobre os outros tal qual uma criança ainda não iniciada nas regras sociais, é melhor entrar numa floresta e tentar dominar os “instintos selvagens do mundo selvagem”. Lá você poderá aplicar todas as suas vontades, tudo em torno de seus interesses, e procurar subjugar os destinos naturais das vidas naturais. Lá é o lugar dos que, diante da vida social e das regras de convivência morais, éticas, sociais, políticas, religiosas... desejam se impor. Mesmos os proprietários de escravos não poderiam ser livres porque sempre lhes restaria impor seus apetites e disposições pessoais. Ninguém pode ser livre se tiver que se impor!
Meu saudoso e querido pai, pessoa simples e de pouco estudo formal, carregador de sabedorias e de princípios fortes, dizia que “Manda quem sabe pedir!” e “Quem grita perde a razão!”. É preciso docilidade na vida. A vida é um complexo de coisas [não um complicado de coisas], porque absorvida pelas relações sociais e seus valores; é um entrelaçado de seres, meios como um atravessar de muitas redes nos corpos e nos tempos: se enrolam, nos protegem e nos comprimem sob padrões de existência.
É preciso ter AUTOCONFIANÇA como ato de sabedoria. O difícil, talvez, seja afastar a arrogância. Há uma linha – e ninguém sabe onde fica – que distingue a prepotência, a condição de se colocar com superioridade moral, ética, social. Em frente ao espelho o prepotente se crê o mais belo e capacitado, com atitudes de tirano e desprezo aos outros e aos atos dos outros. A autoconfiança, a condição existencial de acreditar em si mesmo, não resvala na necessidade de se vingar das pessoas. Este é um sinal de fumaça a indicar labaredas de insegurança. Quem tem autoconfiança abraça os outros, valoriza os próximos, acena com elogios.
São agradáveis e especiais os seres emptáticos. As telas e os convívios atravessados pelas redes sociais dificultam em demasia a empatia. As moldagens de fotos e descrições de felicidade permanente, inexistentes, ilusórias são catapultas para o diáfano, ao vago, ao pueril, ao corpo esburacado. Entender os sentimentos dos outros e associar-se às emoções alheias, misturadas às regras sociais e morais, ingeridas na infância, é a papinha que nos fortalece ou enfraquece na iniciação ao comportamento e regras alimentares. Comer segue regras, e garfamos as regras.
Caminho andado, formação moral e ética estabelecida por mãos familiares, nos primeiros passos ainda inseguros, passando de um móvel ao outro em curto espaço e com as fraldas a dificultar o compasso, somos alimentados e crescemos com regras e princípios. Somos porque os outros... Surge a AUTENTICIDADE, resultado da formação primária. Somos quem somos porque os outros nos permitem ser, e sabem quem somos. Muitos sabem de você. Vivemos com os outros! Ao tentar ser outra pessoa, disfarçando a violência vulcânica que conturba o sono, ou tentando impressionar terceiros pelos autos do que não se é, há um tombo logo em frente. Nem mesmos as redes sociais são capazes de proteger seu caráter. Os outros sabem quem você é!
Nossa liberdade, por vivermos em relações sociais e políticas, é vigiada pelos valores das relações sociais e morais: princípio e meio. E se você exerce cargos públicos, eletivos ou efetivos, nem mesmo a floresta poderá lhe proteger. Lá há outros seres, pequeninos e grandões, que lhe tirarão o sono e o sossego. Até os bichos e as árvores sabem de você! Você está exposto! Sempre! E isso é bom! Primeiro é interessante saber quem você é! Os outros sabem!
*Mestre em Sociologia Política