Coluna Fato&Comentário
Por Edison d'Ávila -
“A vaquinha do seu Zena”
No tempo em que as famílias tinham muitas ocasiões de conversas, encontros e diversões em casa, antes que a televisão e o telefone celular dessem fim a tais tertúlias familiares, uma das diversões caseiras era um jogo chamado à época de víspora.
Agora a víspora se chama bingo ou loto e se joga marcando os números de uma cartela. Números que eram anunciados, como se dizia, por um cantador. Essa pessoa, quando bem escolhida, além de cantar os números, fazia-o de forma jocosa, divertindo os jogadores, a estimular-lhes divertimento e alegria.
Pois, em Itajaí, de antigamente, era costume o bom cantador substituir os nomes de alguns números por expressões divertidas e matreiras. Assim, o número 7 era cantado como “a conta do mentiroso”; o 15, como “a idade de menina”; já o 33 era dito “a idade de Cristo”, e assim seguia-se com o divertido cantador. Quando surgia o número 25, então ele invariavelmente cantava: “a vaquinha do Seu Zena !”
Essa espirituosa expressão se relacionava com o número da vaca, no popular Jogo do Bicho. Mas por que tal associação divertida entre o Jogo do Bicho e o Seu Zena? Quem era o Seu Zena?
Samuel Heusi Júnior ou Zena era filho de destacado comerciante e liderança política de Itajaí no Império e na Primeira República. O pai exerceu as funções públicas de vereador, presidente da Câmara Municipal e Prefeito. Pai e filho também fizeram parte do movimento maçônico itajaiense.
Zena se revelou bom comerciante e empreendedor do comércio e indústria. Teve panificadora, café e salão de jogos; criou a primeira fábrica de gelo e produziu os primeiros picolés da cidade.
Muito ligado a empreendimentos comerciais de entretenimento, alimentação e esportes, com destaque para o hipismo, ele entendeu de trazer para Itajaí o Jogo do Bicho, antes que fosse decretado como contravenção penal. Muito popular no Rio de Janeiro, onde fora criado pelo Barão de Drummond no ano de 1892.
O Jogo do Bicho por aqui teve logo larga adesão popular, a banca do Seu Zena se fortaleceu e ele se tornou mais ainda conhecido como o dono do jogo.
A adesão fora tão grande que pobres, remediados e ricos, todos queriam fazer a sua “fezinha”. Havia mesmo aqueles mais viciados que chegavam a ir a pé da Fazenda a Barra do Rio somente para saber a centena do número duma casa com que sonhara na noite anterior. Ou se buscava quem pudesse interpretar sonho noturno em que pessoas ou bichos houvessem aparecido. Todo número, dezena e milhar, onde quer que se encontrassem, serviam de motivação para se fazer o jogo.
O Jogo do Bicho era acessível, somente se jogava o dinheiro que se quisesse, e tinha credibilidade, porque nunca se deixou de pagar prêmios, mostrando-se apenas o volante do jogo com os números apostados. Conta-se mesmo que certo jogador que apostava no número de um bicho por mais de ano, caiu doente e não fizera os jogos. Pois, naqueles dias saiu enfim o número do bicho em que ele havia posto tanta fé. Sabedor disso, Seu Zena mandou empregado da banca ao hospital pagar o prêmio ao doente e azarado jogador, mesmo não tendo ele feito o jogo. Porque dizia o dono da banca: o azar não pode ser maior que a sorte!