Coluna Fato&Comentário
Por Edison d'Ávila -
Negros na vida social de Itajaí
Na última quarta-feira, dia 20 de novembro, aconteceu o primeiro feriado do Dia Nacional da Consciência Negra; ocasião em que se traz à memória a grande contribuição dos brasileiros de cor negra à economia, cultura e sociedade do país, nestes mais de 500 anos de história do Brasil.
Ocasião é também para se lembrar a discriminação e o preconceito sofridos por negros e negras e que demanda ainda eliminação completa, para maior democratização da sociedade brasileira.
Essa chaga social do preconceito de raça também teve larga presença na sociedade de Itajaí, herança maléfica dos séculos de escravização do negro. Até os anos de 1970, por exemplo, negros aqui não podiam frequentar clube social de brancos e, por isso, tinham o seu próprio clube. Anos antes, nem de clubes esportivos podiam eles participar, quando então fundaram também o próprio clube de esporte. Casamentos interétnicos sempre foram e são raríssimos e a presença de preconceito ainda é notada em várias situações do cotidiano das atividades econômicas, laborais e sociais da cidade.
Com esforço e resiliência, todavia, muitos negros e negras itajaienses foram transpondo barreiras do preconceito e da discriminação racial e ocupando espaços de relevo na vida social de Itajaí. Eles se fizeram respeitar por seus valores pessoais, saber reconhecido nas áreas em que passaram a atuar e competência no que faziam.
Mesmo correndo risco de possíveis omissões, e sem maiores pesquisas no universo social de 200 anos de Itajaí, apontam-se agora nomes de mulheres e homens de cor negra que tiveram evidência no dia-a-dia da cidade, em diferentes setores da vida social.
Dr. Pedro Ferreira e Silva, chegado a Itajaí em 1887, que o cronista Juventino Linhares disse ter sido moreno, “do moreno peculiar aos naturais do Estado da Bahia”. Outros diziam que ele era de “cor trigueira”, eufemismo talvez a querer esconder a cor mulata do primeiro médico residente em Itajaí, vereador, prefeito, deputado estadual e deputado federal. Ao mesmo tempo, deixando à vista o preconceito racial que vigia, somente atenuado nesse caso pela elevada posição de médico e político estimado pelo povo.
Manoel Ferreira de Miranda, professor e jornalista. Fundou o Liceu Infantil, em que foram seus alunos dentre outros o jornalista Jayme Fernandes Vieira e Irineu Bornhausen. Criou em 1914 o primeiro jornal diário – Diário de Itajaí. Na década de 1950, seu nome fora proposto para patrono de uma escola pública estadual da cidade, mas sem aceitação. Então, em 2016, recebeu enfim a devida homenagem com seu nome sendo patrono da uma escola de Educação Infantil no bairro Murta.
Sebastião Lucas Pereira, líder sindical, participou da fundação da Sociedade XV de Novembro, primeira associação de trabalhadores do porto de Itajaí, em 1906, da qual veio depois a ser presidente. Numa histórica fotografia daquela ocasião, pode-se vê-lo segurando o estandarte da Sociedade. Também passou a ser presidente do Sindicato dos Arrumadores, ao ser a Sociedade XV de Novembro transformada em sindicato, cuja carta de criação ele recebeu das mãos do próprio presidente Getúlio Vargas, a seu convite, no Palácio do Catete, no Rio de Janeiro.
José Tolentino da Silva, trabalhador do porto e músico destacado. Participou da fundação do grupo musical “Os Foliões”, do Grêmio XXI de Julho, clube social fundado por músicos, e da “Banda Musical Guarani”, de cuja sociedade mantenedora (Sociedade Musical Guarani) fazia parte.
José Adil de Lima e Paulo Caramuru da Silva, líderes sindicais, presidentes de sindicatos de trabalhadores e de intensas atividades políticas. O primeiro, dirigente do Partido Comunista Brasileiro em Itajaí, candidato a vereador pelo PTB, pelo que esteve preso na época do regime militar; o segundo, Paulo Caramuru, de orientação liberal, foi suplente de vereador e ativo líder comunitário.
Maria Lopes Klüser ou Maria Cartola e Altamiro José Pereira, primeiros Mãe e Pai-de-Santo, responsáveis pela sobrevivência e difusão dos cultos religiosos de matriz africana na cidade, arrostando preconceitos e afirmando a relevância das religiões advindas da África. Maria Cartola deu início ao culto público de Umbanda em Itajaí, no ano 1949. Já Altamiro foi feito, logo depois, pai-de-santo no Centro de Umbanda de Malvina Airoso Pereira, em Florianópolis, mas aqui também muito atuante.
Maria Isabel Costa, professora normalista, bacharel em Letras, emérita professora de Língua Portuguesa e primeira diretora negra de um estabelecimento de ensino público em Itajaí, o antigo Ginásio Normal Lauro Müller, escola estadual, na Vila Operária, em Itajaí. Com a anexação do antigo Ginásio Normal ao Colégio Estadual Deputado Nilton Kucker, tornou-se professora nesse estabelecimento de ensino, até sua aposentadoria por tempo de serviço.
Idésio Moreira, atleta atacante do time de futebol do Clube Náutico Marcilio Dias e principal figura do clube, que segundo Gustavo Melim Gomes, em “Almanaque do Marcílio Dias”, foi o “maior artilheiro de todos os tempos e tetracampeão municipal em 1958-60-61-62”. Atuou também em clubes de outras cidades catarinenses e no Paraná, como Carlos Renaux, de Brusque; Metropol, de Criciúma; Ferroviário, de Curitiba/PR.
Flávia Oliveira Santos, primeira integrante negra do primeiro escalão da administração municipal de Itajaí, tendo ocupado o cargo de Procuradora-Geral do Município. Graduada em Direito, pós-graduada pela Universidade Federal de Santa Catarina, Mestre em Ciências Jurídicas, professora titular dos Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito da Univali. Possui movimentado escritório de advocacia na cidade.
 
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