No ano passado, o imóvel ganhou tapumes ao redor, mas não para obras. A proteção foi colocada pelo município contra invasões e ocupação por moradores de rua e pra evitar acidentes e mais estragos na estrutura, após a queda de parte do telhado. A ação atendeu medida do Ministério Público e da Defesa Civil.
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O prédio está fechado, sem uso social, desde o decreto de tombamento, em 2007. Em 2021, após questionamento do MP e da Defesa Civil, o movimento negro de Itajaí foi chamado pelo Conselho Municipal de Patrimônio Cultural (CMPC) pra discutir a reestruturação do clube e a recuperação do prédio pra retomada das atividades.
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Essa nova fase de mobilização foi marcada, em 2022, 2023 e 2024 por edições da Virada Afrocultural, em estrutura montada ao lado da associação. A revitalização do clube, porém, ainda esbarra em pendências jurídicas e dívidas que a nova diretoria da entidade tenta resolver para avançar em outras ações.
A advogada do clube, Márcia Guimarães, informa que em junho do ano passado foi formada a nova diretoria, com a eleição da presidente Grazielle Gleise Santana. “Desde essa data estamos correndo atrás das regularizações do CNPJ. O clube foi deixado com muitas dívidas com o fisco nacional e com a prefeitura e outros órgãos (Ambiental e Celesc)”, explica.
Na semana passada, o clube conseguiu atualizar o nome da presidente na Receita Federal e já está pagando multas mas falta de declaração de Imposto de Renda. “O próximo é regularizar as dívidas com a prefeitura”, comenta a advogada. Segundo ela, ofícios requerendo isenção das dívidas já foram enviados à prefeitura e ao deputado federal Carlos Chiodini (MDB).
Márcia também integra o movimento negro em Itajaí. Ela é presidente do Conselho Municipal de Desenvolvimento da Comunidade Negra de Itajaí (Conegi) e da comissão de Igualdade Racial da OAB de Itajaí. Na sociedade Sebastião Lucas, a advogada assessora a diretoria em todos os assuntos jurídicos.
“Não estamos parados. As mobilizações para restaurar o clube estão sendo feitas. Em breve nosso Lukinha estará de pé novamente”, afirma.
Projeto de revitalização aguarda regulamentação do CNPJ

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Virada Afrocultural integra movimento pra revitalização da entidade (Foto: Arquivo/Divulgação PMI)
Os tapumes foram instalados no clube após a última edição da Virada Afrocultural, em 25 de maio de 2024. A medida foi uma imposição da justiça à prefeitura e à entidade, contra invasões e pra segurança de pedestres. Antes do fechamento, o clube foi alvo de denúncias de focos de dengue no local.
Na época, houve uma limpeza geral no prédio, com retirada de lixo e restos de madeira, e vistoria da equipe de zoonoses da prefeitura. Depois, o prédio foi lacrado e recebeu os tapumes. A advogada do clube informa que a entidade já tem um projeto de revitalização, mas os esforços no momento são na regularização do CNPJ.
A partir daí, novas ações poderão avançar. “Por enquanto, não temos nenhuma previsão de quando iremos começar as obras, visto que para requerer verba através de emendas parlamentares o clube não pode ter nenhuma dívida ativa”, ressalta.
Como o clube é um patrimônio tombado pelo município, o projeto de restauração precisa ser levado pra aprovação do CMPC, o que ainda não ocorreu. O valor necessário para as obras ainda será levantado. A entidade planeja uma série de melhorias, que incluem salas para cursos e outras atividades.
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Do auge ao abandono

Prédio é tombado como patrimônio, mas pode ruir sem restauro (Foto: João Batista)
O Sebastião Lucas foi fundado em 22 de maio de 1952, virando símbolo da resistência da cultura negra em Itajaí. A entidade surgiu após a extinção do Clube de Regatas Cruz e Souza, primeira organização náutica catarinense formada por negros, e do Humaitá Futebol Clube, que tocava atividades para a comunidade negra. O clube garantiu espaço de socialização pra negros, numa época em que não podiam frequentar as festas nas sociedades Guarani e Vila Operária. A crise financeira veio no final dos anos 1990. No início dos anos 2000, o local foi alugado pro Galpão da Band, que organizou shows até 2006.
Sem uso, o clube virou alvo da especulação imobiliária, correndo risco de ser vendido e demolido. Em artigo recente, as professoras Evelise Moraes Ribas, da Univali, e Luana de Carvalho Silva Gusso, da Univille, destacaram que o tombamento, em 2007, fruto de mobilização do movimento negro, freou os interesses pra outros usos do imóvel.
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Revisão de leis pode facilitar proteção
As pesquisadoras avaliam que a importância da sociedade está mais ligada à sua história, à localização e ao reconhecimento como território negro do que a edificação em si, sugerindo o registro do lugar como Patrimônio Cultural Imaterial. A medida garantiria proteção jurídica ao espaço do imóvel, permitindo intervenções da estrutura física de forma mais fácil em comparação com as restrições do tombamento.
“Avaliar o atual estado de conservação da edificação, em arruinamento avançado, evidencia que o tombamento não garantiu a preservação da edificação, a manutenção do seu uso, nem a estabilidade legal e jurídica da associação mantenedora”, diz o artigo. O estudo aponta pra necessidade de revisão da lei municipal de patrimônio cultural pra efetivamente garantir a proteção de bens tombados, como o do clube.
“É urgente a reavaliação desse processo legal, podendo inclusive ampliar a sua proteção para o reconhecimento como patrimônio cultural imaterial, ou mesmo alterar o decreto de tombamento permitindo alterações na sua estrutura para que a edificação possa voltar a ter seu uso e finalidade social”, concluem.