Investigação do STF
Dalçóquio é um dos líderes de bloqueios, aponta relatório da PRF
Luciano Hang e outras 21 pessoas são citadas como lideranças do movimento que tentou paralisar o Brasil após aleições
Redação DIARINHO [editores@diarinho.com.br]
O empresário Emílio Dalçóquio, herdeiro da Transportadora Dalçóquio, foi apontado pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) como um dos líderes das manifestações que promoveram bloqueios nas rodovias federais após a derrota nas urnas do presidente Jair Bolsonaro (PL).
O nome dele apareceu em um documento enviado pela PRF ao Supremo Tribunal Federal (STF) e que a Agência Pública teve acesso com exclusividade na última quinta-feira. O documento ainda aponta que caminhões a serviço da Havan foram enviados para os mesmos bloqueios. Emílio, Luciano Hang e outras 21 pessoas são apontadas como “lideranças que atuam nesses movimentos, bem como donos de alguns veículos utilizados nos bloqueios”.
Hang e Dalçóquio já haviam virado notícia quando participavam de um grupo de WhatsApp de empresários bolsonaristas em que foi defendido um golpe de estado caso Lula (PT) ganhasse a eleição. O caso foi revelado pelo colunista Guilherme Amado, do Metrópoles, em agosto.
Os dois são aliados do governador eleito em Santa Catarina, Jorginho Mello (PL), e tiveram papel importante na campanha de Jair Bolsonaro no estado. Luciano Hang doou R$ 1,02 milhão a campanha de Bolsonaro. O presidente teve 69,27% dos votos em território catarinense.
Em um vídeo que passou a circular logo após às eleições, Emílio Dalçoquio convoca o setor do agronegócio e os caminhoneiros a participar de protestos. “Agora vai ficar no coração de cada um aceitar o Brasil ser comunista ou não. Eu não aceito”, disse a um grupo de pessoas em um vídeo que foi gravado num bar de Itajaí. “Saiam daqui e vão defender o Brasil também, é isso que nós esperamos, porra”, acrescentou no vídeo que foi postado nas redes.
Foi justamente em SC o maior número de registros de bloqueios de rodovias federais em todo o país, chegando a 41 interdições no dia 31 de outubro. Santa Catarina é o estado onde nasceu o atual diretor-geral da PRF, Silvinei Vasques. Através de vídeos postados nas redes houve, ao menos, dois flagrantes de policiais rodoviários catarinenses apoiando os bloqueios.
Um dos maiores bloqueios do estado aconteceu em Itajaí, em frente aos negócios da família Dalçóquio. Além de sócios de uma rede de postos de gasolina e de um hotel, eles são donos da Transportes Dalçóquio – que publicou nota logo após as eleições informando que Emílio não faz parte da direção da empresa e que as opiniões dele não refletem a do Grupo Dalçóquio.
Segundo agentes da PRF ouvidos pela Agência Pública, é de conhecimento que membros da família Dalçóquio apoiam e ajudam a articular bloqueios de rodovias, desde a greve de caminhoneiros de 2018. Apenas uma hora após o resultado das eleições, cerca de 50 pessoas se aglomeravam no KM 117 da BR 101, em frente ao posto Santa Rosa, que foi fundado pela família.
Emílio acompanha Bolsonaro desde 2015
Emílio Dalçóquio, herdeiro da empresa, conhece o presidente Jair Bolsonaro desde 2015. Em dezembro de 2021, ele acompanhou o presidente, a primeira-dama Michelle Bolsonaro e a filha do casal, Laura, em passeio na região. Junto a Luciano Hang, ele foi um dos anfitriões de Jair Bolsonaro em Balneário Camboriú durante a campanha passada. Os dois foram fotografados conversando publicamente pela primeira vez.
Dalçóquio apoiou a eleição de Jorginho Mello ao governo de Santa Catarina, a do ex-ministro da Pesca, Jorge Seif (PL), ao Senado, e de Zé do Trovão (PL) a deputado federal. Trovão foi preso em outubro do ano passado suspeito de organizar atos antidemocráticos e atualmente usa tornozeleira por determinação do ministro Alexandre de Moraes. Mesmo assim, o político esteve nas manifestações contra o resultado das eleições. Trovão foi eleito deputado federal pelas urnas eletrônicas que afirma serem passíveis de fraude.
Havan teria liberado caminhões e estrutura
As lojas da rede Havan foram pontos de concentração dos protestos contra as eleições em Santa Catarina. Na terça-feira, após as suspeitas de que Luciano Hang estaria apoiando os atos, a empresa emitiu uma nota negando qualquer participação.
No entanto, o documento da PRF entregue ao STF aponta justamente o contrário. O relatório da manhã de 31 de outubro registra que a Havan e a Transben Transportes – transportadora da esposa, cunhado e sogro de Hang – além da Premix Concreto, “haviam deslocado veículos de carga até a manifestação no km 83 e estavam presentes de forma organizada” no bloqueio da BR 101, em Barra Velha. Ali, o protesto aconteceu em frente ao posto de combustível Maiochi, que fica próximo a uma loja da Havan e a uma das garagens da Transben.
A Transben tem como principal cliente a rede Havan. Além do bloqueio onde oficiais da polícia rodoviária registraram a participação organizada de seus caminhões, ao menos outros quatro pontos de obstruções de vias em Santa Catarina foram realizados exatamente na frente das lojas de Luciano Hang – nos municípios de Itapema, Indaial, Palhoça e Rio do Sul.
A nota de explicação ressalta que centenas de caminhões, de frota terceirizada, saem todos os dias do centro de distribuição de Barra Velha. “O caminhão citado em reportagem havia se envolvido em um acidente indo parar no canteiro lateral da rodovia e ficando atolado, fato também comprovado pelas autoridades competentes”, afirma a nota divulgada pela loja.
Emílio diz que brasileiros podem comer carne de cachorro
Conhecido por manter a marca Cowboy do Asfalto, Emílio, assim como Luciano Hang, é um bolsonarista raiz. Em vídeos publicados no Youtube e em suas redes sociais, é comum ouvi-lo dizer “que, se o PT voltasse ao poder, o Brasil viraria uma Venezuela e que passaríamos a comer carne de cachorro”. Nesta sexta ele publicou em seu Instagram uma imagem com o seguinte texto: “Nunca imaginei que iria viver para testemunhar uma categoria de caminhoneiros ser mais consciente do que a categoria de professores.”
Atualmente, Emílio faz parte da associação Lux Brasil, que informa “defender ideias conservadoras”. A organização está registrada em nome de Leandro José Castro de Freitas, que foi lotado no gabinete do senador Jorginho Mello até dois meses atrás. Leandro foi exonerado do Senado em setembro.
A Lux Brasil apoiou o Congresso Conservador Brasileiro, que aconteceu em 26 de junho, em Massachusetts, nos Estados Unidos. O evento contou com a participação de influenciadores da extrema-direita, como o blogueiro Allan dos Santos, que está foragido da Justiça.
Em decorrência das paralisações dos caminhoneiros em 2018, Emílio Dalçóquio e Luciano Hang foram investigados pelo Ministério Público Federal por atentar contra a liberdade do trabalho e coação, além de incitar a animosidade de setores das Forças Armadas ao pedir uma intervenção militar. O inquérito foi arquivado em fevereiro de 2019 por falta de provas.
Em nota veiculada nas redes sociais, Emílio chamou de “mentirosas e caluniosas as matérias jornalísticas que estão circulando sobre empresários catarinenses e a meu respeito. Afirmo que essas matérias são falsas e apenas tentam denegrir a minha boa reputação de cidadão e empresário honrado, trabalhador, honesto e patriota”, disse.
Emílio ainda diz que seu posicionamento político é conhecido, mas que não financiou ou fomentou atos antidemocráticos. “Reafirmo, assim, a quem interessar a verdade, que não financiei, liderei, apoiei ou apoiarei qualquer ato dirigido a excessos ou ilegalidades”, afirmou através da nota oficial.