ITAJAÍ
Conselho de Saúde se articula contra projeto que veta a comprovação de vacina
Moção contra proposta de vereadores considera o projeto de lei um “retrocesso sanitário”
Redação DIARINHO [editores@diarinho.com.br]
O conselho Municipal de Saúde de Itajaí (Comusa) aprovou uma moção de repúdio contra o projeto de lei que proíbe a exigência do comprovante de vacinação da covid-19 pra acesso a locais e serviços públicos ou privados. A proposta em andamento no legislativo tem autoria dos vereadores Beto Cunha (PSDB) e Adriano Klawa (PSL), que defendem a medida pra garantir a "liberdade individual de quem optou em não se vacinar".
O Comusa considera o projeto um “rotundo retrocesso sanitário e uma injustificável intromissão” dos autores em assuntos de políticas públicas de saúde. A moção foi aprovada pelos conselheiros em reunião na segunda-feira. “O referido projeto é a prova mais cabal do desconhecimento sobre as consequências que a inexigibilidade da comprovação vacinal contra covid pode trazer à população de Itajaí”, destaca o documento dos técnicos.
Continua depois da publicidade
A moção ressalta, ainda, que a proposta está na contramão de parecer da agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), de que o direito individual não pode e não deve se sobrepor ao direito coletivo de se proteger contra a covid-19. Para os autores do projeto, porém, a exigência do comprovante seria medida sem amparo constitucional que feriria o direito à liberdade citado no artigo 5º da Constituição.
O presidente do Comusa de Itajaí, Edimar Garcia, destaca que a proposta dos vereadores é um retrocesso no combate à pandemia. O entendimento é que as vacinas têm sido a forma mais efetiva de proteção contra doenças infectocontagiosas. “A exigência de comprovante de vacinação (que existe há décadas no Brasil) está baseada no princípio da proteção da nossa população frente a esta pandemia e a diversas outras doenças”, explica.
“Muitos brasileiros não conviveram com pessoas sequeladas da poliomelite, muitos médicos nunca trataram crianças com sarampo porque temos vacinas e a exigência da vacinação em crianças”, completa Edimar. Ele ainda contesta o argumento de que a exigência do comprovante obrigaria as pessoas a se vacinar, tolhendo a liberdade individual. “Temos que lembrar que o direito à vida, na CRFB/88, vem antes do direito à liberdade”, frisou.
Conselho se mobiliza contra projeto
O presidente do conselho de saúde de Itajaí tem a expectativa que o projeto de lei não passe na câmara. Além da questão de saúde, ele avalia que a proposta também é inconstitucional. Se o projeto passar, Edimar adianta que o assunto vai entrar na pauta do conselho e deve ser alvo de representação junto ao ministério Público. O conselho também vai atuar junto ao prefeito e à secretaria de Saúde pra vetar o projeto.
O conselho já está mobilizado contra a proposta. A moção de repúdio aprovada foi entregue em todos os gabinetes dos vereadores de Itajaí. O documento considera o projeto de lei “anticientífico, ilegítimo, imoral e antiético” por negar, mesmo que de forma indireta, a efetividade das vacinas por meio da aceitação do comportamento negacionista dos que não querem se vacinar.
“Ao permitir o acesso irrestrito de indivíduos não vacinados contra covid-19 a quaisquer ambientes, públicos ou privados, ou a serviços, significa expor, de forma irresponsável e inconsequente, todos aqueles que tentam se proteger através da vacinação”, diz a manifestação do conselho.
Ao DIARINHO, o vereador Adriano Klawa já havia ressaltado não ser contra a vacinação e que fez ações pra agilizar a imunização na cidade. “Sobre o projeto, a finalidade do mesmo é garantir o direito constitucional de ir e vir”, defendeu. O vereador Beto Cunha não retornou à reportagem.
Continua depois da publicidade
Projetos pra barrar exigência de vacina são inconstitucionais, afirma advogado
Continua depois da publicidade
Projeto com a mesma justificativa está em discussão na câmara de Balneário Camboriú. Em Navegantes, a proibição já foi aprovada e aguarda a sanção do prefeito. Para o advogado Luiz Carlos Avila Junior, presidente da comissão de Direito Constitucional da OAB de Itajaí, os projetos de leis dos municípios da região são absolutamente inconstitucionais.
“Isto porque o supremo Tribunal Federal decidiu no ARE [Agravo em Recurso Extraordinário] 1267879 em dezembro de 2020, que é constitucional a obrigatoriedade de vacina, sendo lícito a imposição de restrições àqueles que não tomaram a vacina”, explica. Ele observa que a decisão tem efeito vinculante e repercussão geral, ou seja, aplica-se a todos os casos sobre a mesma questão.
O advogado avalia que o entendimento do STF é adequado porque parte do princípio de que as doenças que podem gerar epidemias podem ser evitadas ou contidas por vacinas. Segundo Ávila Junior, a decisão considera que o ordenamento constitucional tem como valor supremo a dignidade da pessoa humana. “O entendimento, de forma muita objetiva, é que ninguém estará seguro enquanto todos não estiverem seguros”, frisa.
Continua depois da publicidade
O advogado lembra que o entendimento não é exclusivo do STF, adotado também na maioria dos países e cortes constitucionais. Ele ressalta que nenhum direito é absoluto e, por isso, a pessoa tem a liberdade de não se vacinar e o estado não pode obrigá-la. “Em compensação, é direito do Estado impor limitações a essas pessoas, pois colocam em risco a saúde de toda população”, diz.
Ainda conforme a advogado, a limitação da liberdade pelo passaporte de vacinação é o equilíbrio dos direitos constitucionais, da liberdade compensada com o direito a uma vida digna. “As insurgências ou pretensões de evitar o uso dos “passaportes de vacina” não têm qualquer viabilidade jurídica, nascendo de forma clara já morta”, conclui.
STF cobra governo federal
O governo Federal trava uma disputa com a Anvisa sobre a exigência do passaporte da vacina pra entrada de estrangeiros pelos aeroportos. A medida é recomendada pela agência pra barrar novas variantes, mas o ministério da Saúde alega que a obrigatoriedade vai contra direitos individuais. “Melhor é perder a vida do que a liberdade”, disse o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga.
O ministro do supremo Tribunal Federal (STF), Luís Barroso, deu prazo de 48 horas pro governo federal se manifestar. Por enquanto, o governo decidiu apenas pelo isolamento de cinco dias pra estrangeiros não vacinados, sem explicar como a quarentena seria controlada.
A manifestação de Luís Barroso foi em ação do partido Rede Sustentabilidade, que pede a obrigatoriedade de comprovação de vacinação para quem entra no Brasil. O ministro já deu a entender que deve atender ao pedido de liminar, ao dizer que adota em suas decisões os padrões científicos recomendados por autoridades mundiais de saúde.
Redação DIARINHO
Reportagens produzidas de forma colaborativa pela equipe de jornalistas do DIARINHO, com apuração interna e acompanhamento editorial da redação do jornal.