O presidente da Aprasc, Elisandro Lotin, está soltando fogo pelas ventas. Uma aberração, lasca. Assim ele define a nota informativa assinada pelo tenente Ricardo Sartori, que determina que soldados doentes repousem no alojamento do quartel da PM da Maravilha do Atlântico. O documento, pendurado nos murais do 12º batalhão no dia 27, diz que os soldados que apresentarem atestado médico receberão a visita do oficial do dia e terão que fazer o repouso no alojamento do quartel. Quem não cumprir a determinação vai em cana.
Nós consideramos isso um assédio moral explícito, abuso de autoridade, que fere qualquer princípio da dignidade humana. Com ameaça de prisão, torna-se mais grave ainda, dispara Elisandro, que entrou com mandado de segurança na sexta-feira passada, para derrubar a determinação. Elisandro tem 20 anos de polícia e diz nunca ter presenciado um abuso tão grande. Os mais antigos dizem que na década de 80 chegou a acontecer, mas era em plena ditadura militar, desabafa.
Ele carca que mandar um oficial na casa do doente para constatar se o cara está mesmo malzão é o mesmo que dizer que o atestado do médico não vale nada. E se for uma doença psicológica, por exemplo, aí prende o cara?, questiona. Elisandro alega que muitos PMs trampam doentes para não perder a hora extra, que chega a corresponder a 40% do salário. Só pega atestado médico quem está no limite, afirma.
Por julgar a medida uma sacanagem, a associação foi pra dona justa. É preciso que os nossos comandantes entendam que a gente vive na democracia e que os regulamentos da polícia não podem ferir a Constituição, defende.
A presidenta da comissão de direitos humanos da OAB de Balneário Camboriú, Luiza Mueller Jenichen, ficou dicara quando soube da novidade. Mesmo que seja militar, a prisão ocorre quando acontece um crime. Não existe lógica para isso, é ilegal, lasca.
Na tarde de ontem, a comissão se reuniu e entendeu que há abuso de poder, o que poderia caracterizar assédio moral, mas também acredita que a medida pode evitar safadezas. Para entender melhor o caso, os dotores decidiram pedir mais detalhes sobre a determinação; querem entender se os alojamentos são adequados ao atendimento dos puliça doentinhos. A comissão diz que, para o cumprimento do atestado no Batalhão, é necessária indicação médica. Caso contrário, configura-se violação à dignidade do milico.
O major Ronaldo de Oliveira está interinamente no comando do Batalhão e alega que a medida é para preservar os policiais que trampam. Segundo ele, o comando vivia recebendo denúncias de soldados que pegavam atestados para fazer bicos ou para festar. Como não conseguiam comprovar as denúncias, o quartel ficava defasado. O subcomandante conta que nos 20 dias que antecederam a ordem, 15 PMs apresentaram atestados médicos. Até ontem, 19 dias depois da nova determinação, rolaram apenas dois atestados na corporação.
Segundo o major, nos dois casos o oficial do dia que visitou os doentes entendeu que era melhor que os colegas permanecessem em casa. Gostaria que essa associação (Aprasc) justificasse a redução drástica de PMs doentes, dispara o comandante interino. Ele jura que a visita do oficial do dia na casa dos PMs doentes não é para botar pressão, mas para auxiliar os soldados. Levar ao hospital ou comprar um remédio na farmácia, se precisar. A medida é para dar amparo ao policial militar, jura.
Sobre o repouso dos doentes no alojamento do quartel, o major garante que o local tem estrutura, e não há nada de errado nisso. O local de trabalho é a rua. O alojamento é considerado o local de repouso do militar, diz.
Quartel pode ficar empestiado
Outro que ficou espantado com a determinação do comando da PM da Maravilha do Atlântico foi o especialista em medicina do trabalho e em perícias médicas, Deoclecio Marioto. Segundo ele, a medida pode deixar o quartel inteiro doente. Quando uma pessoa está doente, ela é afastada pelo médico do convívio de outras pessoas justamente para não transmitir doença, explica.
Para o dotô, não há cabimento fazer um doente ir até o local de serviço para repousar. Além disso, ele alega que o oficial do dia não tem capacidade de analisar se o puliça está mesmo dodói. Ele explica que existem outras formas de saber se os funcionários estão dando o cano, sem ferir a dignidade da pessoa. Um médico do batalhão deveria analisar o quadro clínico no intuito de avaliar o atestado. A situação seria resolvida com perícia médica, sugere.