O envolvimento de Cleiton com o carnaval começou ainda na infância, em uma família simples de Itajaí. A mãe comprava LPs e CDs com os sambas-enredo do ano, e ele passava horas ouvindo. Quando chegava fevereiro, a rotina era virar a noite assistindo aos desfiles do Rio pela televisão. “A Sapucaí para mim era aquele sonho distante da televisão, de assistir de madrugada em casa. A minha alegria era tocar no carnaval de Itajaí”, recorda.
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Na juventude, participou de blocos locais como o Macunaíma e o Unidos da Loca, além de tocar instrumentos de percussão em escolas menores da região. A ponte para o Rio surgiu primeiro pelo futebol: torcedor do Vasco, ele começou a viajar em 1995 para assistir jogos e, aos poucos, passou a frequentar o carnaval da capital fluminense.
Em 2011, desfilou pela primeira vez no Rio e recebeu convite para compor na Portela. “Meu primeiro samba foi na Portela, ao lado de Waldir 59 e Casquinha”, conta. A partir daí, ampliou contatos, passou a disputar sambas em várias agremiações e aprendeu os mecanismos das quadras cariocas. Desde 2017, defendeu obras na Portela, Imperatriz Leopoldinense e na própria Mocidade, até alcançar sua primeira vitória.
Além da trajetória no samba, Cleiton também tem passagem pela vida pública: já foi secretário de Habitação em Itajaí, conciliando a profissão de advogado com a paixão pelo carnaval.
O samba da liberdade
Em 2026, a Mocidade levará para a avenida a irreverência de Rita Lee. O samba escrito por Cleiton e parceiros traz versos como “Um belo dia resolvi mudar, cansei dessa gente careta” e o trocadilho “Santa Rita Leeberdade”. O enredo e a sinopse foram desenvolvidos pelo carnavalesco Renato Lage e será o primeiro desfile de segunda-feira no Grupo Especial.
O samba nasceu a muitas mãos, a partir da sinopse entregue pelo carnavalesco Renato Lage. O texto orientava os compositores sobre o que deveria estar presente na letra, já que o enredo precisa dialogar com alegorias e fantasias para não perder pontos na Sapucaí.
Segundo Cleiton, a construção começa quando alguém traz a primeira melodia, acompanhada de um esqueleto de letra. “Alguém chega com uma melodia e a gente começa a rabiscar em cima da sinopse. Cada um coloca uma palavra, um verso”, explica. As discussões aconteciam em encontros presenciais, mas também em longas trocas por WhatsApp, até que a música fosse tomando forma.
O acabamento só veio no estúdio, no dia da gravação, quando ainda houve alterações significativas. E mesmo depois de o samba ser declarado vencedor, a obra continuou sendo refinada em parceria com a escola. “A gente passou a tarde toda na Mocidade mudando duas ou três palavras e um pouquinho da melodia”, lembra.
Para Cleiton, estar nesse ambiente de criação ao lado de compositores consagrados é parte do aprendizado. “Eu sou só um aprendiz, perto desses grandes campeões, mas tô cada vez aprendendo mais”, admite.
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Bastidores caros e competitivos
Por trás do brilho, as disputas de samba-enredo no Rio envolvem investimentos altos. “Só para chegar à final da Mocidade a gente gastou na faixa de R$ 90 mil”, relata.
O clima também é particular. “É realmente como se fosse uma eleição. Tem que contratar intérprete, gravar, levar torcida. É um mundo bem diferente do que a gente vive aqui”, descreve.
As escolas de samba, lembra Cleiton, têm importância que vai além do desfile. “A Portela tem um balcão de emprego, a Mangueira atende várias crianças. A Sapucaí é a cereja do bolo, mas a escola é muito mais que a festa”, diz.
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Orgulho de Itajaí
A conquista tem valor simbólico para quem começou na beira do rio. “Eu passava pela Beira Rio lembrando que já toquei tamborim ali. Hoje eu posso dizer: eu tenho um samba na Sapucaí”, afirma.
Agora, ele se prepara para conciliar a rotina de advogado com os compromissos carnavalescos. “É um momento ímpar. Quero viver isso de perto e espero que venham outras vitórias”, projeta.
No fim, Cleiton deixa uma lição de vida: “Não fica adiando o sonho. Vai atrás hoje. Eu vim de família simples e parecia impossível, mas vale a pena acreditar.”
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