Os GMs já tinham sido condenados à prisão e à perda do cargo público. Na semana passada, a prefeitura foi notificada que a Justiça também reconheceu o caso como “tortura institucional” ao responsabilizar o município pela indenização. A decisão é recebida como um marco civilizatório por especialista da área do Direito.
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Os GMs já tinham sido condenados à prisão e à perda do cargo público. Na semana passada, a prefeitura foi notificada que a Justiça também reconheceu o caso como “tortura institucional” ao responsabilizar o município pela indenização. A decisão é recebida como um marco civilizatório por especialista da área do Direito.
Na decisão do desembargador substituto Alexandre Morais da Rosa, a justiça reconheceu os atos como tortura institucional com requintes de crueldade. “Trata-se de uma lógica estrutural que preserva práticas antidemocráticas herdadas das ainda recentes práticas autoritárias, em que se tolerava e até mesmo fomentava o cometimento de ‘ilegalidades justificadas’, contando com a leniência ou cegueira deliberada de quem deveria controlar e reprimir a brutalidade de agentes de segurança pública”, escreveu em sua decisão.
O desembargador Alexandre ainda frisa que os agentes de segurança pública tendem a desumanizar as vítimas como forma de justificar a violência e a tortura. “No contexto da atuação de agentes de segurança pública, essa instrumentalização do poder manifesta-se na desumanização da vítima, que é reduzida à condição de ameaça, sem voz e sem direitos [rebaixada e tratada como objeto], em franca violação da dignidade da pessoa humana”, justifica.
O desembargador ainda reforça que a violência, quando exercida por agentes de segurança do estado, assume contornos ainda mais perversos. “Por ser frequentemente desproporcional, seletiva e direcionada a parcelas específicas da população, notadamente os “sem-voz”, os “outsiders” e os “subcidadãos” que residem em áreas periféricas nas quais a plena cidadania é, dia após dia, negada”, pontuou.
Ao DIARINHO, a prefeitura de BC informou que o município foi intimado na última semana e está em prazo de contestação. “O caso está em análise na procuradoria”, disse, em nota, a prefeitura.
Deficiente foi abordado embaixo de passarela e torturado por GMS
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No dia 26 de janeiro de 2024 os GMs abordaram um homem de 31 anos com deficiência intelectual na passarela da BR 101, na avenida Marginal Oeste. A vítima foi algemada, colocada no porta-malas da viatura e levada para uma área de matagal na Várzea do Ranchinho. No local, o homem passou por uma sessão de tortura, com intenso sofrimento físico e mental. O espancamento causou diversos machucados no rosto, pescoço, tórax, barriga, costas e pernas.
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O homem ainda teve os cabelos cortados, como forma de humilhação. Após ser torturado, foi abandonado pelos GMs, já desacordado. Após retomar a consciência, conseguiu caminhar pelas margens da BR 101 até a base da empresa Arteris Litoral Sul. Ele foi socorrido por funcionários da concessionária da rodovia e encaminhado ao PA da Barra.
Em janeiro deste ano, os dois GMs foram condenados a dois anos e nove meses de prisão, em regime aberto, e à perda do cargo público pelo crime de tortura contra a vítima com deficiência. Os agentes também responderam a um processo administrativo da secretaria de Segurança.
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Marco civilizatório, opina doutor em Direito
O advogado Luiz Fernando Ozawa, doutor em Direito, considera a decisão um marco civilizatório para a justiça de Santa Catarina e para os direitos humanos no estado. “Esta decisão tem um caráter pedagógico para todos nós, pessoas da cidadania, mas também aos órgãos da estrutura municipal, estadual e da União Federal para que não deixemos as nossas comunidades de lado e cuidemos uns dos outros, em especial das pessoas da base da pirâmide social brasileira, que são aqueles que estão em grau de miserabilidade, que não acessam o Estado, senão através da represália, através do controle e através da polícia”, disse o doutor.
Ozawa acredita que a decisão deve ser recebida com bastante entusiasmo. “Essa incomum e rara decisão é um marco civilizatório para a justiça de Santa Catarina e para os direitos humanos do estado, em especial na proteção das pessoas mais vulneráveis da base da pirâmide social catarinense, uma vez que o Estado tem, não raras vezes, agido de forma truculenta, bastante ofensiva e não economizado em atos de violência, inclusive contra pessoas que não têm as mínimas condições de oferecer sequer resistência”, completa.