Maurício: Eu sempre gostei muito da atividade física. Eu nasci ouvindo sobre remo desde a barriga da minha mãe. Numa família de 10 irmãos, eram quatro mulheres e seis homens. Os seis foram remadores. Eu escutei sempre aquelas histórias do meu pai e dos meus tios sobre o remo. Eu fui um jogador de futebol de salão frustrado, eterno reserva, e com muita determinação e resiliência fui para o remo. Foram 10 anos remando pelo Clube do Rio Grande do Sul, no nível de competição, com resultados muito bons, fui campeão brasileiro, campeão sul-americano de masters e várias vezes campeão estadual. Me casei com a Lídia no final da década de 80 e vim morar em Itajaí. Os dois clubes de maior tradição da história na cidade, Clube Náutico Marcílio Dias e Clube Náutico Almirante Barroso, começaram no remo. O futebol veio depois no Marcílio e no Barroso. [Os clubes de futebol, em geral, tinham essa tradição no remo...] O remo era um esporte muito popular no Brasil, muito praticado, principalmente no início dos anos 1900. O divisor de águas foi a Copa do Mundo de 50, mas até a Copa de 50, o remo atraía multidões no Rio de Janeiro, em Florianópolis e em outras cidades. Quantos milhares de torcedores do Flamengo, de Botafogo, Vasco, Corinthians, não percebem que o símbolo do Corinthians, por exemplo, são dois remos. O Esporte Clube Corinthians Paulista começou no remo. No Rio de Janeiro, Clube de Regata do Flamengo. O Botafogo, eu vou contar a história, tinha o Botafogo futebol e tinha o Botafogo remo, uniram-se os dois e veio o Botafogo de Futebol e Regatas. Aos vascaínos, Clube de Regatas Vasco da Gama começou com o remo.
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"A Studio Remo é a única academia que tem uma sala de remo indoor"
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O senhor criou a primeira academia do Brasil com remo indoor. Como surgiu a ideia?
Maurício: Eu acho que a Studio Remo não aconteceu nem antes nem depois. Eu sempre fui conhecido como o maluquinho da cidade na atividade física, me pegavam correndo na rua. Então uniu-se essa coisa. Eu olhava as aulas de bike indoor, pensei por que não aulas de remo indoor?! Foi um conjunto de ideias: a vontade de empreender acima de tudo, daquilo que eu sou apaixonado, surgiu a ideia de fazer a Studio Remo. A última notícia que eu tive há uns dois anos, do presidente da Confederação Sul-Americana de Remo no Brasil, não tem nenhuma academia só com uma sala de remo específica. Se tem depois me corrijam, porque eu não sei. Tem remo nas academias, mas não uma sala específica do remo nem na América do Sul. A Studio Remo é a única academia que tem uma sala de remo indoor dentro das suas atividades. Isso é uma coisa que me orgulha bastante. [O remo é um esporte bem completo?] Quando você rema, você utiliza, dizem os especialistas, 85% dos músculos do corpo. Eu brinco e digo que eu quero que alguém me mostre esses 15% que não usa, porque quando eu remo eu uso tudo. É um esporte que mexe com toda a cadeia muscular: costas na hora da pegada, final de braço, cada remada você trabalha o carrinho, um leg press, cada remada no final você faz um abdominal. Como poucos esportes, trabalha de maneira conjunta força e resistência. Quando você faz um trabalho de corrida, por exemplo, aeróbico, você foca no trabalho de resistência, tem até que cuidar para não definhar os músculos. A corrida em excesso emagrece demais, você pode perder força. A musculação seria outro extremo, um trabalho extremo de força. No meio desses dois está o remo.
"A hora que tiver um barco A8 singrando as águas de Itajaí, pronto, vou me realizar"
As aulas de remo na Studio Remo chamam a atenção por serem bastante dinâmicas e alegres – esse espírito faz parte da filosofia do remo?
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Maurício: Eu trouxe para a Studio Remo e treinei meus professores para que eles transformassem as aulas de remo na mesma linguagem que se pratica no barco. Remar é uma alegria, é uma determinação, é guerra... No mundo todo tem uma frase do remo: remadores nunca desistem, nunca desistem. Porque depois que é dada a largada, você tem que chegar no final, porque você está remando com um conjunto. No futebol, você dá uma ida para a lateral, dá uma respirada. O remo, meu amigo, largou, você tem que chegar. Senão você acaba com todo um companheirismo.
"Os dois clubes de maior tradição da história na cidade, Clube Náutico Marcílio Dias e Clube Náutico Almirante Barroso, começaram no remo"
Por que é importante praticar atividade física? Existe idade para começar? E para parar?
Maurício: As pesquisas que estão saindo não é achismo, é científico: os benefícios da atividade física. Vamos começar pela pergunta: quando começar? No remo, é uma coisa. Na atividade física, em geral, é outra coisa. Respeitando o desenvolvimento do corpo, não tem idade para começar. É só escolher a atividade certa. Remar, por exemplo, eu não aconselho antes dos 13, 14 anos de idade, pelo nível de exigência que o remo tem. Até quando se faz atividade física? Eu quero ver se eu parto para o outro lado fazendo atividade física. Os benefícios dela, eu vou começar pelo final. Hoje, eu tenho 63 anos. Eu cuido, como filho único, dos meus dois pais idosos. A limitação física deles tem sido um problema maior ao cuidar deles. Meu pai foi remador quando jovem. Minha mãe nunca participou. Eu acho que a atividade física é um ato de amor aos seus filhos. Porque é pesado para o filho ter que trocar a fralda do pai. Quando você perde os seus movimentos, é muito mais do que perder a mobilidade, é perder a dignidade. Não é ficar saradão, forte. Não é disso que estamos falando. Estamos falando de autodeterminação, de capacitação de você ter para a sua mobilidade e sua autossuficiência. A atividade física, está comprovado, melhora o cérebro. As chances de você desenvolver doenças degenerativas, como o Alzheimer ou Parkinson diminuem muito com a atividade física. Agora, no meio, autoestima, longevidade, saúde, exposição, tudo de bom.
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"O remo era um esporte muito popular no Brasil, muito praticado, principalmente no início dos anos 1900"
O senhor tem o objetivo de criar um projeto de remo como política pública em Itajaí. Pode explicar como será esse projeto?
Maurício: Fiz uma primeira tentativa, criei no Itamirim o Departamento de Remo. Trouxe alguns barcos de Florianópolis, formei remadores aqui. Ganhamos regatas em Florianópolis. Foram dois ou três anos de muita luta, mas uma luta inglória, sem verba, jogados para cá e para lá. Paralelo a isso, eu fiz uma regata para tentar iniciar, que botou mais de cinco mil pessoas na pracinha do centro. Trouxe clubes da Argentina, Flamengo, Vasco. O prefeito João Macagnan, meu amigo Paulo Cruz era o secretário, fizemos uma festa maravilhosa. Passaram-se muitos anos e agora, com a Studio, lancei essa primeira ideia, com apoio do procurador-geral do município, o doutor Márcio Dornelles. Ele mandou um texto em que falou uma coisa que nunca esqueci: “Maurício, temos que fazer. Itajaí tem que parar de ficar de costas para o rio”. [Pode explicar o projeto?] O projeto já tem nome. Eu dei início lá em Florianópolis ao projeto Rema Floripa, que é a reorganização dos clubes de remo com o meu amigo Valério Gomes. Toda aquela área que tem os clubes de remo está sendo revitalizada e ganha-se o remo de Florianópolis. Dados esses primeiros feedbacks positivos, eu pensei que era a hora de nós fazermos o Rema Itajaí de novo.
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"A Studio Remo é a única academia que tem uma sala de remo indoor dentro das suas atividades"
Onde seria a sede desse projeto e o que falta para ele sair do papel?
Maurício: Muitas pessoas podem pensar que seria maravilhoso que fosse aqui no Saco da Fazenda. Não dá, porque a gente rema de costas. Como a gente rema de costas, o trânsito intenso de barcos, bambus e tal, não dá para fazermos ali, estaríamos muito limitados e botando os remadores em risco. O local, vale aqui um parêntese, eu sempre fui apaixonado pelo remo argentino. Eu sempre quis saber onde era o remo lá, está a uma hora de Buenos Aires, em Tigre. A cidade, por sua história, respira remo. Aqui eu remeto à Murta. O trânsito de barcos lá em cima diminuiu consideravelmente, passa um barco ou outro. Não há obstáculos. Já tivemos algumas reuniões. Vai ser na Murta, próximo da praça do Coreto, fazer com que a Murta se transforme numa Tigre. [Em qual etapa está o projeto?] O doutor Márcio está buscando o setor adequado da prefeitura, mas junto com a Confederação Brasileira de Remo (CBR). Vou fazer um resumo das etapas que já tiveram. Primeiro bate-papo com o doutor Márcio, um apoiador. Fomos recebidos pelo prefeito Robison Coelho, com o secretário de Turismo, ele olhou para mim e disse assim: “vamos fazer”. Ele é um marcilista. [Poderia ser uma parceria com o Clube Náutico Marcílio Dias?] Vamos pensar qual é o caminho, mas é uma possibilidade enorme. Ou o Barroso, o Instituto Sorrir, enfim. Já tivemos uma reunião com o Instituto Sorrir, com a Giovanna e o James. As duas meninas de projeto da nova gestão da CBR estão apaixonadas e já falaram que querem que o projeto de Itajaí seja um piloto e vão apoiar. Eu acredito que em uns 60 dias nós temos isso bem elaborado no papel. [Qual o investimento para um projeto como esse?] Quero fazer um projeto vencedor, um projeto que encha os olhos. Posso falar que talvez possa ser o centro de treinamento da Seleção Brasileira. O molde eu tenho todo na minha cabeça, dos clubes da Europa, dos Estados Unidos, da própria Argentina, que são clubes sociais. É para fazer algo que atraia famílias, que atraia as pessoas, que tenha a questão social que vai atender, claro, às comunidades mais necessitadas, às escolas municipais, mas vai trazer também o pessoal.
"As chances de você desenvolver doenças degenerativas, como o Alzheimer ou Parkinson diminuem muito com a atividade física"
Qual é a principal referência do remo atualmente no Brasil?
Maurício: O Lucas, remador do Botafogo, tem tido belos resultados, é uma referência para nós, esteve nas Olimpíadas representando o Brasil. Infelizmente, por esse descaso com o remo, o Brasil disputou uma única vez uma final do remo, se eu não me engano, na década de 70. Tem a minha madrinha, um fenômeno, um caso único pela determinação dela, a Fabiana Beltrame. Me desculpe outros remadores, mas o Lucas e a Fabiana hoje são referência. E essas duas irmãs, a Kátia e a Cláudia, que também tiveram resultados significativos fora do Brasil. [Falta categoria de base?] Falta. O novo presidente da CBR veio para mudar. O remo brasileiro é o quarto, quinto lugar na América Latina. Nós estamos perdendo pro Paraguai, pro Chile.
O senhor organizou a primeira competição de canoa havaiana em Itajaí há cerca de 10 anos. Por que esse tipo de evento não teve continuidade?
Maurício: Eu trouxe duas OC4 para cá e remamos várias vezes. A OC4 é boa para pegar onda e tal. Foi um evento de dois dias em Cabeçudas e movimentou completamente a cidade. A gente trouxe algo em torno de três mil atletas do Brasil todo para Itajaí. Eu não concordaria contigo quando você diz 'por que não deu certo'. Houve a continuidade. Em Cabeçudas, hoje, tem lá as canoas e tem lá uma turma que começou comigo, depois passaram alguns professores, ainda remam lá direto. O esporte está se desenvolvendo na região, mas o evento de canoas aí só tem um maluco para fazer. A gente precisa do maluco de volta.
"Quando você perde os seus movimentos, é muito mais do que perder a mobilidade, é perder a dignidade"
O senhor firmou parceria com a prefeitura de Itajaí para “adotar” parte da praça Beira Rio. Como surgiu essa ideia e com qual objetivo?
Mauricio: A praça foi uma coisa de querer ficar inventando projetos. Eu falei na época com o Rodrigo Lamin e tive muito apoio do Valério Gomes, da Multilog, com a Lei do Incentivo ao Esporte e a confiança da prefeitura para eu cuidar daquele espaço. Já viram a festa que é ali, final de semana, da gurizada jogando bola?! Isso me dá uma satisfação... Tem um piso superespecial que a gurizada joga altinha. [A população cuida daquele espaço ou tem muitos casos de vandalismo?] Generalizar a população seria muito ingrato. Eu diria que a população desfruta. Os casos de vandalismo são uma agulha no palheiro.
"Remar é uma alegria, é uma determinação, é guerra.."
Qual é o teu sonho para Itajaí com o remo?
Maurício: É ver um barco A8, que é a coisa mais linda do mundo, singrar as águas do Itajaí-açu com itajaienses remando. Infelizmente hoje, para os Jogos Abertos, Itajaí tem que trazer estrangeiros para remar. A hora que eu tiver numa lancha, vendo um barco A8 singrando as águas de Itajaí, pronto, vou me realizar. É isso que eu quero.
"[Meu sonho] É ver um barco A8, que é a coisa mais linda do mundo, singrar as águas do Itajaí-açu com itajaienses remando"