Agropecuária

Bancada adota ‘discurso tóxico’ em anúncios nas redes sociais

Posts se valem de desinformação e greenwashing para promover agenda política do setor, dizem pesquisadores da Ufrj

Frente Parlamentar da Agropecuária impulsiona anúncios nas redes sociais com conteúdo desinformativo, aponta estudo (foto: Agência Brasil)
Frente Parlamentar da Agropecuária impulsiona anúncios nas redes sociais com conteúdo desinformativo, aponta estudo (foto: Agência Brasil)

A Frente Parlamentar da Agropecuária (Fpa), mais conhecida como a bancada ruralista do Congresso, publicou anúncios nas redes sociais ao longo de todo o ano passado com conteúdo desinformativo, descontextualizado, distorcido e/ou que minimizavam os impactos negativos do setor, de modo a promover sua agenda política no legislativo. É o que aponta uma análise elaborada pelo Netlab, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

O relatório avalia que a comunicação digital da Fpa, por meio de posts patrocinados nas redes da Meta (como Facebook e Instagram), adota o que foi classificado como “discurso tóxico”. ...

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O relatório avalia que a comunicação digital da Fpa, por meio de posts patrocinados nas redes da Meta (como Facebook e Instagram), adota o que foi classificado como “discurso tóxico”. O laboratório, que há mais de uma década estuda as redes sociais e o fenômeno de desinformação no Brasil, considera como “tóxicos” anúncios que recorrem a algum nível de desinformação e/ou ao chamado greenwashing (uma espécie de maquiagem verde).

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Foram analisados 207 posts patrocinados nas redes da Fpa publicados entre janeiro e novembro de 2023. Quase metade (94 anúncios, 45%) tinha conteúdo que foi classificado como tóxico pela equipe do Netlab.

Por que isso importa?

O objetivo do lobby digital, dizem os pesquisadores, é influenciar a opinião pública sobre temas como o marco temporal, o projeto de lei sobre agrotóxicos, planos de infraestrutura e a Cpi do Mst.

“A desinformação consiste no uso intencional de informações falsas, descontextualizadas ou distorcidas para manipular a opinião pública, descredibilizar inimigos e/ou introduzir vieses sensacionalistas”, explicam os pesquisadores. Já o greenwashing, dizem, “se caracteriza pelo uso de estratégias narrativas que ocultam práticas antiecológicas ou minimizam/negam seus impactos negativos”.

Segundo o grupo, liderado pelas pesquisadoras Marie Santini e Débora Salles, também se encaixa como greenwashing a divulgação de “atividades ecologicamente corretas em campanhas de publicidade para desviar a atenção daquelas ambientalmente hostis”.

Entre os temas estavam assuntos caros à bancada ruralista bem no momento em que eles estavam sendo debatidos no Congresso, como a adoção de um marco temporal para a demarcação de terras indígenas, a Cpi do Mst e o projeto de lei sobre agrotóxicos.

As 207 publicações analisadas no estudo são anúncios patrocinados, impulsionados para alcançar um público maior. Eles são pagos pelo Instituto Pensar Agropecuária (Ipa), organização bancada por associações do setor que tem “o objetivo de defender os interesses da agricultura e prestar assessoria à Frente Parlamentar da Agropecuária por meio de acordo de cooperação técnica”, como eles mesmos se definem.

Foram gastos pelo menos R$ 77,7 mil nos anúncios, que somaram 19,8 milhões de impressões. Considerando apenas aqueles com conteúdo considerado tóxico, o investimento foi de R$ 31,4 mil, e eles alcançaram 8,2 milhões de impressões.

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Destes, a maior parte (39 anúncios, 41%) teve como objetivo criminalizar movimentos sociais, com motes como “quem se organiza é criminoso” e “invasão é crime”. O Mst foi um dos principais alvos, com boa parte das publicações patrocinadas em abril do ano passado, como já havia revelado reportagem da Pública. Na época, o movimento social promoveu uma série de ocupações ao redor do país no âmbito do “Abril Vermelho”, campanha que lembra o massacre de Eldorado dos Carajás, ocorrido em 1996.

Segundo os pesquisadores, o conteúdo chegava a estimular discurso de ódio.

A segunda temática mais comum foi a de “negacionismo dos impactos ambientais do agronegócio” (17 dos anúncios considerados “tóxicos”). O foco desses anúncios foi a promoção de projetos de lei que flexibilizam a legislação ambiental, como o de agrotóxicos, e de projetos de infraestrutura como a Ferrogrão, ferrovia que pretende ligar o Mato Grosso ao Pará e é criticada por ambientalistas.

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Uma das estratégias de comunicação usadas pela Fpa no ano passado foi vender a ideia de que eles estão amparados na ciência e são eles os alvos de negacionismo e desinformação, como no post sobre o projeto dos agrotóxicos.

A análise do Netlab foi focada nas redes da Meta, que fornece alguma transparência sobre quem paga os anúncios, assim como seu alcance e público alvo, o que facilita a investigação. Mas a estratégia da Fpa se espalhou por várias outras plataformas, como o Twitter/X, em uma estética moderna, com a utilização de fundos virtuais dinâmicos, de memes e humor.

Nesse esforço, entra também o que os pesquisadores classificaram como “disputa semântica”, com o uso de tons didáticos e explicativos. Um exemplo frequente, dizem, é o reforço ao uso do termo “pesticidas” em vez de “agrotóxicos”. “O intuito é minimizar a percepção de que são produtos tóxicos à vida humana e à natureza”, aponta o Netlab.

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Se ambientalistas chamam o projeto de lei de “PL do Veneno”, o léxico da Fpa fala em “modernização” da legislação em busca de um aumento da produção de alimentos “seguros e de qualidade” para o Brasil e o mundo.

De acordo com os pesquisadores, tudo isso acaba funcionando como uma tentativa de inverter uma das acusações mais comuns contra o setor.

 

Fato ou fake às avessas

Anúncio da Fpa no Facebook promovendo os pesticidas em nome da “ciência” (foto: reprodução)
Anúncio da Fpa no Facebook promovendo os pesticidas em nome da “ciência” (foto: reprodução)

 

“É a estratégia de acusar o outro daquilo que, na verdade, é você que faz. Eles se valem de afirmações científicas, mas que são falsas ou pelo menos enviesadas. Acusam os outros de negacionismo, mas negacionismo é selecionar evidências ao seu bel-prazer”, disse Débora Salles, uma das coordenadoras da análise, à reportagem. “Da mesma forma que é greenwashing dizer que o agro não tem impacto socioambiental, negar os riscos que uma obra como a Ferrogrão pode ter, por exemplo”, diz.

“Práticas de greenwashing combinadas com desinformação mostram o agro brasileiro como um exemplo mundial de sustentabilidade e de avanço tecnológico para a preservação ambiental, o que seria motivado por uma das legislações ambientais mais rígidas do mundo”, escrevem os pesquisadores do Netlab.

Dentro dessa estratégia, muitos dos anúncios se valeram da estética “fato ou fake”, comum nos sites de checagem de informação. Assim, fatos bem embasados sobre o setor – como a relação histórica e ainda atual com o desmatamento da Amazônia e do Cerrado e as emissões nacionais de gases do efeito estufa – são taxados de mentira, dando lugar a uma narrativa de que o setor não só é um exemplo, como vítima.

“O agronegócio é apresentado como exemplo mundial de preservação ambiental, e os agrotóxicos, como provedores de alimentos de qualidade. A noção de um ‘agro de verdade’ é associada à sustentabilidade, sugerindo que se dissemina uma ‘ideia mentirosa’ sobre um agro que não preserva o meio ambiente”, relatam os pesquisadores.

Segundo Débora, isso é muito eficiente, porque gera dúvida nos usuários das redes. “Tem um poder de convencimento muito grande. Ninguém vai achar que uma instituição que se imagina séria, uma frente parlamentar, está fazendo uma checagem falsa. Mas no fim das contas é isso: uma checagem negacionista”, afirma Débora.






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