Rede pública de saúde de Itajaí
Advogada espera há dois anos que enfermeiro que a abusou durante exame ginecológico seja punido
O caso dela não seria o único envolvendo o abusador. Prefeitura informou que enfermeiro está em função administrativa
Franciele Marcon [fran@diarinho.com.br]



Dois anos após fazer uma denúncia sobre violência sexual que sofreu dentro do posto de saúde Jardim Esperança, no bairro Cordeiros, em Itajaí, uma advogada da cidade ainda aguarda que o enfermeiro acusado do crime seja punido. A denunciante afirma que foi abusada durante um exame ginecológico preventivo, coletado pelo enfermeiro, que durou mais de uma hora e aconteceu a portas trancadas.
A advogada de 34 anos conta que foi abusada no dia 28 de janeiro de 2021, mas afirma que não foi a primeira vítima do enfermeiro. Outras mulheres também relataram terem sido abusadas durante atendimento médico no posto de saúde de Cordeiros.
No caso da advogada, ela conta que estranhou o exame, que coleta material para prevenção ao câncer do colo do útero ser feito por um enfermeiro homem, sem a presença de uma mulher, e já ficou bastante nervosa. O enfermeiro, ainda segundo a denunciante, fez perguntas sobre a atividade sexual dela.
“Em suas conversas, ele sempre desviava do objetivo principal (o exame), chegando a fazer comentários sobre a vida sexual de outros pacientes, parecia que queria ganhar minha ‘confiança’ para que eu abrisse sobre minha vida particular. Em seguida o enfermeiro iniciou uma sequência de perguntas sobre minha vida sexual”, narra.
Entre as perguntas, segundo a vítima, ele questionou se ela sentia desejo sexual por homens, como estava a libido e se ela já tinha feito sexo anal. Logo após tirar a roupa e colocar o avental para o exame, começou o abuso sexual. O enfermeiro teria pedido pra ela deixar os seios à mostra, fez comentários sobre a diferença de tamanho entre os seios, os apalpou, e tocou os mamilos. “Me sentindo constrangida e suando frio, o enfermeiro me questionou: está tudo bem? Balancei a cabeça afirmando. Eu me encontrava paralisada, com toda aquela invasão”, conta a vítima.
A violência piorou quando o enfermeiro introduziu o aparelho “espector” Papanicolau na vagina para fazer a coleta de material a ser analisado, quando ele teria acariciada a vagina e feito comentários com conotação sexual.
“Essa coleta de preventivo durou mais de uma hora. Por três vezes bateram na porta, após verificarem que ela estava trancada, mas o enfermeiro ignorou. O enfermeiro ficou trazendo conversas de cunho sexual, invasoras, desconexas com a finalidade daquele exame”, conta a vítima.
No final do exame, o enfermeiro pediu para ver a paciente na próxima semana, porque teria constatado um corrimento vaginal. Também alegou que entraria em contato pelo WhatsApp para encaixar a advogada em sua agenda. O enfermeiro mandou mensagens via aplicativo e fotos feitas durante a consulta sem o consentimento da paciente. A vítima bloqueou o contato do enfermeiro.
Prefeitura investiga conduta do acusado
A Secretaria de Saúde de Itajaí afirma que tem conhecimento do caso. O enfermeiro é funcionário efetivo do quadro da saúde e foi aberta uma sindicância na Procuradoria-Geral do Município para investigação e o processo está em fase final, faltando apenas as alegações finais e o relatório de conclusão do caso, que devem ocorrer em até 60 dias.
“Desde o recebimento da denúncia, em 2021, o servidor foi remanejado para funções administrativas e de apoio, e não realiza atendimentos individuais”, afirma a secretaria.
Sobre o fato de o enfermeiro estar atuando, a prefeitura afirma que ele faz somente serviços administrativos e de apoio, não ficando sozinho com pacientes.
O caso foi registrado pela vítima na época, também, na polícia Civil.
Enfermeiro seria autor de série de abusos
Outra vítima conversou com o DIARINHO e relatou ter sofrido abusos antes mesmo do caso da advogada, dentro do mesmo posto do Jardim Esperança. O caso desta vítima foi ainda pior, com violência sexual mais grave cometida pelo denunciado.
Uma médica do município também contou ao DIARINHO que recebeu denúncias de três pacientes e chegou a denunciar o caso à secretaria, contando que os abusos ocorreriam desde 2020. Logo após as denúncias, o enfermeiro A.S. chegou a ser afastado do posto, mas acabou retornando ao trabalho.
Atualmente, ele estaria trabalhando em um posto de outro bairro de Itajaí, fazendo inclusive atendimento às pacientes. “Há dois anos venho buscando justiça pelo assédio que aconteceu comigo e pelas outras mulheres que não tiveram coragem de denunciar. Não vou desistir de ver a justiça acontecer, esse enfermeiro não vai parar de fazer vítimas, estou gritando por providências”, disse a advogada.
Gerente cometia assédio moral e sexual na UBS São João

Terceirizadas da UBS São João foram demitidas
Servidoras terceirizadas também denunciaram terem sofrido abusos morais e sexuais no posto de saúde do bairro São João. O acusado dos crimes é um homem que ocupava cargo comissionado de gerente da unidade básica de saúde, na rua Juca Cesário. Os abusos, segundo as vítimas, ocorriam em horário de trabalho e até na frente de pacientes.
As vítimas procuraram a vereadora Anna Carolina Martins (PSDB) para fazer a denúncia e também a presidente da ONG Grupo Vítimas Unidas, Maria do Carmo dos Santos, que falou com os vereadores na terça-feira no plenarinho. O objetivo é que ela ocupe a tribuna livre na próxima quinta-feira.
“As vítimas que eram terceirizadas foram demitidas e retiradas pelo responsável da empresa. Trata-se de um caso grave de perseguição a mulheres que denunciaram um assediador. Nós, do Grupo Vítimas Unidas, estamos acompanhando o caso muito de perto. Queremos respostas e vamos exigir dos vereadores respostas. Por que funcionárias que fizeram o correto, ao denunciar o assediador, foram retiradas de forma humilhante da unidade de saúde e demitidas?”, questiona Maria do Carmo.
Segundo Anna, as vítimas contaram que sofreram abusos sexuais e morais e após as denúncias foram demitidas do cargo. “Os casos ocorreram no ano passado. Elas foram conversando e perceberam que não era somente com uma. Se uniram e denunciaram administrativamente. A secretaria exonerou o gerente. Só que, além disso, retirou todos os terceirizados daquela UBS. Elas se sentiram vítimas duas vezes, porque sofreram a retaliação após a denúncia”, explica.
A vereadora Anna, além de receber as vítimas, protocolou um requerimento para buscar informações da prefeitura sobre o caso de abuso e assédio e sobre a demissão das funcionárias, que ocorreu pela empresa terceirizada. As vítimas também procuraram um advogado para orientá-las.
Segundo a Secretaria de Saúde, quatro servidoras oficializaram a denúncia no dia 10 de janeiro deste ano contra o gerente da Unidade Básica de Saúde do São João. A exoneração preventiva do acusado, segundo a prefeitura, ocorreu no dia 11 e foi tomada em função das suspeitas relatadas e por se tratar de um cargo comissionado.
Além da exoneração, a Procuradoria-Geral abriu uma sindicância para investigar a denúncia. O caso corre em sigilo. Diferente do que alegam as vítimas, a prefeitura afirma que nenhuma funcionária que denunciou o caso foi demitida pela empresa terceirizada.