VOLTA AO MUNDO
Veleiro dos Schürmann está em Itajaí e se prepara pra largada de nova expedição
Largada será no dia 29 de agosto, de Balneário Camboriú. Conheça as principais inovações feitas no barco nos últimos meses
Redação DIARINHO [editores@diarinho.com.br]
O veleiro Kat, da família Schürmann, chegou nesta semana em Itajaí, onde passa pelos últimos ajustes de preparação para uma nova expedição de volta ao mundo. Em Itajaí, a embarcação será abastecida com suprimentos e receberá a tripulação. A viagem tem partida no dia 29 de agosto, em Balneário Camboriú, seguindo para 11 paradas na costa brasileira até dezembro, quando começa a fase internacional que terminará na Nova Zelândia em 2023.
Nos últimos meses, o veleiro passou por uma série de revisões, manutenções e melhorias. Uma parte dos trabalhos, envolvendo sistemas mecânicos e hidráulicos, ocorreu num estaleiro em Biguaçu. Depois, o veleiro foi pra Guarujá, litoral paulista, pra serviços de tratamento do casco, pintura e adesivação.
Após finalização de serviços no mastro e nas velas, o Kat deixou o iate Clube de Santos, no fim de semana, e rumou pra Itajaí, onde chegou na segunda-feira pra última etapa de pré-expedição. O veleiro, de 24 metros de comprimento e 85 toneladas, conta com seis cabines e capacidade pra 14 tripulantes.
O barco foi construído em Itajaí e inaugurado pela família Schürmann na expedição Oriente, feita entre 2014 e 2016. A nova empreitada com o veleiro será a quarta volta ao mundo dos Schürmann. O nome da embarcação homenageia Katherine Schürmann, filha adotiva da família que faleceu, aos 13 anos, em 2006.
Batizada de “Voz dos Oceanos”, a expedição está focada no problema do lixo plástico nos oceanos. Em entrevista ao DIARINHO, o patriarca da família, Vilfredo Schürmann, 73 anos, falou sobre o projeto, que pretende levantar os impactos do descarte irregular de lixo no mar, chamar a atenção para o problema da poluição e propor soluções.
A expedição terá 61 paradas, 11 delas no Brasil, com ações nos municípios. No ano que vem, uma das paradas será em Nova Iorque, onde os velejadores participam de encontro na ONU, da qual os Schürmann são embaixadores da campanha global Mares Limpos.
Inovações
O veleiro Kat conta com sistemas sustentáveis de geração de energia, tratamento de água e esgoto e reciclagem de lixo. Os sistemas foram aprimorados, passando de 45% pra 75% até quase 100% de geração de energia limpa vinda dos painéis eólicos e solares e hidrogerador.
O barco dispõe de um desalinizador de água do mar, com capacidade de processar 200 litros de água por hora, e um compactador de lixo reciclável. O tratamento de esgoto usa seis tanques de 80 litros com sistema aeróbico e luzes ultravioletas.
O barco está sendo equipado com 37 baterias importadas de litío, quantidade menor que as 47 antigas, e tem metade do consumo e o dobro da capacidade. A parte elétrica é feita em parceria com a Weg, com a digitalização total da navegação, que poderá ser vista online.
O veleiro recebeu dois novos motores, mais econômicos no consumo de diesel. Na parte hidráulica, os tanques de óleos foram reduzidos de 400 pra 200 litros e tem a ver com a instalação apenas de um piloto automático e a troca de uma bomba de três HPs por uma de 1,2 HP, para gastar menos energia.
Bate-papo com o capitão Vilfredo Schürmann:
"Eu sou feliz vivendo no barco"
Como surgiu o projeto Voz dos Oceanos?
Vilfredo: Na nossa segunda volta ao mundo, a gente passou por uma ilha chamada Henderson Island. Não havia ninguém na ilha, mas o que nós vimos de plástico foi muito grande. A gente recolheu aquilo e levamos tudo pra capital da Polinésia francesa. Naquela época, se você falasse muito de plástico era chamado de ecochato. Nós sempre fomos ecológicos. Agora, nessa última [expedição], nós estávamos entre Papua Nova Guiné e o Japão, e tinha uma ilha que nós passamos. Ancoramos e, quando chegamos, o que nós vimos de plástico! Em pouco tempo, nós estávamos com o inflável cheio de plástico. Eu fiz no Facebook um filminho que, em duas semanas, deu dois milhões de pessoas, viralizou, e 150 mil compartilhamentos. Isso sete anos atrás. Aí a gente viu que, quando chegasse, era preciso fazer alguma coisa nesse sentido. Sentamos numa mesa e começamos a analisar. Aí nós instituímos a conexão Família Schürmann, com a primeira viagem em Maragogi, no Nordeste. (...) Fizemos cinco, a outra do Rio de Janeiro até Ilha Bela. Chegamos na Ilha Grande, deu uma ressaca e tiramos garrafas de plástico, de 20, 30 anos, que estavam lá. Na ilha Anchieta, fizemos uma boca de baleia de metal com uma rede bem fininha e começamos a arrastar, em uma hora, o que tinha de microplástico você não imagina. Isso aí nos despertou. O pessoal acha que o lixo está só no litoral, mas 70% do lixo vem dos rios, que vai pro mar. Então, é um legado que Heloísa e eu queremos deixar. Queremos mostrar que o Brasil faz coisas legais.
Quais as atividades previstas ao longo da expedição?
Vilfredo: Nós íamos fazer várias ações em praias, mas não dá com a pandemia. A própria saída vai ser uma coisa pequena, mais online. A gente não tem condições, então, o que vamos fazer é muito online. Lá, em Ilhabela, vamos fazer todas as escolas. Vamos fazer algumas ações pra mostrar o que esses lugares fazem, quais os desafios deles. O mais importante é educar, porque todo esse plástico está indo pro mar.
Qual a expectativa pra essa viagem depois desse período da pandemia?
Vilfredo: Eu estou muito feliz. Quando eu estive na pandemia, quatro meses nas Falklands/Malvinas, que não podia vir pra cá, comecei a escrever o livro sobre o submarino da 2ª guerra que achamos aqui, em 2011. Eu terminei o livro e disse:“Heloísa, se você quiser viver no barco, você vai viver, se você quiser passar com os netos...”. Ela disse: "Eu vou visitar meus netos, mas eu vou viver no barco, temos casa, tudo". Quando tu passa dos 70, tens que ter a prerrogativa de fazer o que você quiser da vida. Aqui eu tenho tudo. É a minha vida, se o homem lá de cima me der saúde, vou continuar. Eu estou vivendo no barco, essa é a minha casa. Agora estou aqui, ou em qualquer lugar, eu sou feliz vivendo no barco.
Quais reflexões vieram sobre o lixo e o futuro do planeta?
Vilfredo: Nós queremos um projeto do Brasil para o mundo. Essa é a ideia de divulgar. A gente tem condições de fazer um bom trabalho. O plástico não vai acabar. Tem que diminuir, tem que reciclar. Nós reciclamos 6%, a China recicla 32%, os Estados Unidos já reciclam 30% e nós somos o quarto maior produtor de lixo de plástico do mundo. As indústrias estão indo nesse foco, no propósito de trabalhar com catadores, de ter parcerias. Esse é nosso objetivo e é isso que acho que muda um pouco o cenário. Vai mudar, eu tenho certeza absoluta.