Famílias inteiras enfrentaram o friozinho e o forte vento de 25 nós para se despedirem dos velejadores que fizeram de Alicante sua morada por quase um mês. Na vila, o público se entretinha visitando os estandes, observando os barcos e os velejadores.
O príncipe das Astúrias, Felipe de Borboun, foi o visitante mais anunciado do dia. Perto do meio-dia, caminhando no meio da multidão, o príncipe causou o maior frisson entre os moradores e turistas. Todos queriam acompanhar de perto a passagem da realeza. Com quase dois metros de altura, Felipe era facilmente reconhecido entre as pessoas.
Quem também fez a vila da regata tremer foi o craque do futebol francês Zinedine Zidane. O ex-jogador chegou cedo à vila e ficou o tempo todo no píer ao lado da equipe Abu Dhabi. É uma sensação de liberdade. Eu achava que o barco era maior para abrigar os 11 velejadores. Eles trabalham em equipe e são heróis, opinou Zidane. Fora da área reservada para os barcos, o público procurava o melhor local para ver as celebridades.
Perto ao meio-dia, as famílias dos velejadores começaram a despedida. As mulheres e os filhos cobriram os esportistas de carinho antes da saída para a primeira perna da maior regata de volta ao mundo. Em seguida, numa cerimônia rápida, cada comandante dos barcos falou sobre o que esperava da prova. Enquanto o príncipe seguia para alto-mar a bordo do barco da Telefônica, os velejadores se posicionavam para seguir o caminho. Depois da largada, um barco de apoio resgataria Zidane e o príncipe Felipe para traze-los de volta à terra firme.
Os barcos da Telefônica, Groupana, Sanya, Camper, Puma e Abu Dhabi seguiram para alto-mar. Neste momento a vila também começou a se movimentar. Jornalistas do mundo inteiro e alguns privilegiados conseguiram caronas em barcos para ver a largada do mar. Quem não teve a mesma sorte, seguiu para uma passarela existente atrás dos estandes da vila da regata. De lá havia uma visão privilegiada da largada.
A equipe do DIARINHO embarcou na Nueva Tabarca para registrar a emoção da saída dos velejadores. Antes do início da competição, os seis barcos fizeram uma apresentação para o público. Mais de 500 barcos estavam ao largo, e dentro deles todos só tinham um foco: achar o melhor ângulo para acompanhar os veleiros dos competidores. Dois helicópteros sobrevoavam o local para transmitir a largada através da TV para o mundo todo. Já a guarda civil organizava as embarcações no mar.
Às 14h em ponto um tiro, disparado pelo príncipe Felipe, deu início à competição. A equipe da Camper saiu na frente. Enquanto isso, nas embarcações, as lentes dos fotógrafos seguiam os barcos. Quando já não era mais possível ver os veleiros, os barcos retornaram à vila da regata, onde um clima de nostalgia tomava conta do ambiente.
A largada também foi dada para Itajaí
A viagem da comitiva itajaiense a Alicante se encerrou com o início da Volvo Ocean Race, no último sábado. Os barcos lançados ao mar na competição que vale o título da vela mais cobiçado do mundo indicam que o tempo também começou a correr para nós, itajaienses. Até abril do ano que vem, quando a Volvo chega a Itajaí, são menos de seis meses para deixar a cidade pronta.
Mais difícil que montar a vila da regata, bancar as obras de infraestrutura ou que deixar prontos os atracadouros dos barcos é preparar a cidade para receber o evento.
Alicante, que vem nos últimos anos se transformando numa das principais capitais de vela da Europa, demonstrou que, mais do que obras, é necessário entrosamento entre o poder público e a iniciativa privada para organizar um evento deste porte. É preciso a participação da universidade, do comércio, de clubes de vela, dos setores de serviços e, principalmente, dos moradores da cidade.
O grupo catarinense que veio em busca de ideias e inspiração para montar o evento em terras brasileiras, tem que começar a planejar a Itajaí que queremos a partir deste evento. O prefeito, demais autoridades, jornalistas, funcionários públicos, engenheiros e empresários que vieram à Espanha já entenderam o que representa sediar uma etapa da Volvo Ocean Race.
Ao mesmo tempo em que causa espanto o impacto econômico e turístico que a Volvo representa, fica evidente que Itajaí vai ter que correr atrás para que, ainda que seja com simplicidade, consiga o principal: tornar-se um porto aconchegante e funcional para os navegadores, equipes e os visitantes que estarão na cidade por quase um mês.
O mais formidável de Alicante não é a marina com centenas de barcos, nem as calçadas arborizadas, ou o transporte público eficiente e de preço justo, ou ainda as águas claras da costa do Mediterrâneo. Claro que chamam a atenção as amplas praças, o comércio movimentado, os restaurantes e bares animados, os hotéis, e o impressionante castelo de Santa Barbara. Mas o que mais surpreende é que o povo desta simpática cidade, do taxista ao gerente de hotel, passando pelo comerciante, a prefeita e o garçom, incluindo os aposentados e as crianças, enfim, a comunidade formada pelos mais de 330 mil habitantes, todos reconhecem a dádiva por serem banhados por um litoral maravilhoso.
São pessoas que cresceram aprendendo a usufruir o mar, não só como fonte econômica, mas, principalmente, como fonte de lazer e local para prática de esportes.
Esta é a cidade em que 11 mil crianças estão envolvidas em projetos náuticos e onde é comum haver regatas nas dezenas de clubes de velas espalhados na costa. Esse envolvimento com o mundo náutico é que justifica a escolha de Alicante como sede definitiva da organização da Volvo Ocean Race. Nada aqui é artificial ou feito para um único evento. Ninguém montou uma cidade cenográfica para receber os melhores velejadores do mundo. Aqui, naturalmente, os homens do mar é que se sentem em casa.
Talvez por isso, passeando pela vila da regata, nós, os brasileiros, ficássemos impressionados por ver, usufruindo do mesmo espaço, membros da família real de capitais europeias, alunos da rede pública, aposentados, trabalhadores em seu horário de almoço, turistas, esportistas, grandes empresários...
Esta é a verdadeira lição que se leva de Alicante. A cidade que é agradável e saudável com seus próprios habitantes consegue abrigar com dignidade qualquer evento.
Valeu o anúncio do prefeito Bellini, de que contaremos com uma marina em breve. Mas isso é pouco. Precisamos também do envolvimento das nossas crianças e jovens com o mundo do mar; de mais cuidado com nossos espaços públicos, de mais valor à nossa associação náutica e de mais integração com o saber da nossa universidade. Se nem tudo pode ficar pronto até a regata, tudo bem. O que mais vale é que foi dada a largada para o que pode resultar na transformação da nossa cidade.