Em linha reta, a distância de Balneário Camboriú até o Haiti, na América Central, é de 5620 quilômetros. Pros 400 haitianos que vivem na Maravilha do Atlântico, contudo, a lonjura é incalculável. Aqui, encontraram idioma e costumes diferentes. Conheceram também um tal de salário no fim do mês. O preço da distância de parentes e amigos é pago com doses intensas de saudade. Pra esquecer um pouco do sentimento, a secretaria de Desenvolvimento e Inclusão Social de Balneário organiza hoje, às 20h, um Natal especial pros haitianos. As músicas e danças ficam por conta dos estrangeiros. O frango assado com arroz e maionese é à moda brasileira. O festerê rola no centro Comunitário Casa da Sogra, no bairro dos Municípios.
Tá certo que o jeito de festejar é diferente. Jean Inocent Monfifton, 28 anos, há dois anos em BC, lembra que os haitianos emendam um dia de festa atrás do outro. O que chamamos de Natal pra eles ...
Tá certo que o jeito de festejar é diferente. Jean Inocent Monfifton, 28 anos, há dois anos em BC, lembra que os haitianos emendam um dia de festa atrás do outro. O que chamamos de Natal pra eles é réveillon. Eles comem, bebem, dançam e cantam. A gente se preocupa em fazer um fim de ano feliz pra quando chegar o ano novo. Manda embora todas as dificuldades, os problemas e coisas ruins, explica.
Jean é presidente da associação de Haitianos de Balneário, que conta com 53 membros inscritos. A criação do grupo foi uma forma de manter os laços com a terra natal. Lá eles deixam o português de lado e conversam em crioulo, a língua falada no Haiti.
Trabalhando na construção civil e a mulher como camareira em hotel, Jean não pensa em voltar pro Haiti. Mesmo achando o Brasil um país receptivo, o que lhe prende aqui são as melhores condições de vida. A fluência em cinco idiomas (francês, inglês, espanhol, crioulo e agora português) não pesa no currículo haitiano. Lá, ele trabalhava como cinegrafista e contava as gourdes (moeda local) pra não passar fome. Um gourde é equivalente a seis centavos de real. Jean conta que é rei o haitiano que consegue arrecadar 300 gourdes por mês, ou 17 pilas.
Na região, os haitianos trabalham em peso na construção civil, mas as portas de restaurantes, hotéis e supermercados também têm sido abertas. De acordo com a coordenadora do centro de Referência de Assistência Social (Cras) do bairro dos Municípios, Sônia Regina Garcia, à medida que os haitianos conseguem emprego e juntam dinheiro, trazem os familiares de mala e cuia pra cá.
É nesse momento que a secretaria de Desenvolvimento e Inclusão Social entra em cena. Nós passamos a acompanhar essas famílias e suas necessidades, explica Sônia. Segundo a coordenadora, a maior parte dos haitianos mora em casas alugadas no bairro dos Municípios. A estimativa é que Balneário Camboriú já abrigue 400 gringos do Haiti.
Depois de um ano trabalhando pesado como ajudante de pedreiro, Miguel Louine, 26, trouxe a irmã. A mãe dele, no entanto, não tem coragem de deixar o Haiti. Há um ano e cinco meses na Maravilha do Atlântico, faz dois que tá desempregado. Ele concluiu um curso de operador de elevador e está apto a apertar os botõezinhos e fazer as honras da casa pra quem sobe e desce das alturas. Miguel corre atrás de trampo em algum hotel, condomínio ou qualquer outra coisa que pintar. Pra irmã, de 27 anos, que não entende nada do português, ele conseguiu um trampo numa lavanderia.
A língua é muito difícil. Assim que cheguei, não consegui nem comprar uma roupa ou pedir comida. Eu aprendi sozinho. Quando um brasileiro tava conversando, eu parava pra escutar e prestava atenção, revela Miguel. Apesar do desemprego, ele garante que não troca esta página verde e amarela de sua vida por nada do passado.