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Alvará não é atestado de óbito


Parece que já disseram tudo sobre essa tragédia na boate Kiss, em Santa Maria/RS, mas pelo tamanho dela nunca é de­mais enfatizar os mesmos aspec­tos, ainda que já apontados.

Quando ocorre uma desgraça dessas dimensões em qualquer parte do mundo desenvolvido, as autoridades começam por averiguar as responsabilidades. No Brasil o início é pela isenção prévia de culpabilidade dos en­volvidos, e logo aqui onde a cor­rupção grassa na gestão pública, tão conhecida, praticada, viven­ciada, quanto negada por todos.

Seguindo a linha do acober­tamento, o governador do Rio Grande do Sul pontificou logo que não era momento de achar culpados, clichê já entre autori­dades quando ocorrem esses fa­tos. Culpado não se acha, inves­tiga-se quando se faz necessário, não em casos como este, que salta aos olhos, como costuma dizer o ministro Gilmar Mendes.

Já o comandante do corpo de bombeiros do estado se tornou o “Lewandowski da boate Kiss”. Afirmou reiteradamente que tudo estava normal nessa casa, referente à documentação. Disse que o alvará regular poderia não ter feito a diferença. Se alvará não serve, que se extinga, mas uma fiscalização eficiente, sem corrupção, tem que existir. Seria o mesmo que, após uma queda de avião, se constatasse que o pi­loto não era habilitado. Poderia ser inevitável, mas acredito que o comandante dos bombeiros não se arriscaria a andar num avião pilotado por um leigo.

Certezas passaram a ser criti­cadas mais recentemente, mas sem medo de errar, a não em guerra, pode-se afirmar que, quando morrem inúmeras pes­soas, o que está normal não in­teressa, pela lógica berrante de que as mortes ocorrem pelo que está errado. Nesse caso, quanto mais a casa estivesse de acordo com a documentação, mais a prefeitura, os bombeiros, os en­tes públicos em geral estariam errados.

Não importa quantas portas estivessem previstas pela norma, poderia ser uma, mas que fosse suficiente para a evacuação sem mortes. Ainda assim, deveria ter mais de uma, pois ocorresse difi­culdade na abertura, outra solu­cionaria o problema.

Depois da tragédia, agora to­das as prefeituras e estados cor­rem para fechar boates. Daí não se faz nada com relação à gaso­lina “batizada” nos postos, aos bares com comida estragada e tomando as calçadas dos pedes­tres, aos hospitais com funcioná­rios ausentes e presenças asse­guradas. Tudo fica ao deus-dará, pois o brasileiro não exige e as autoridades não cumprem suas funções, a não ser por poucos dias após uma tragédia.

Já está no esquecimento o Ba­teau Mouche, o morro do Bum­ba, Santa Catarina, Teresópolis, as mortes em piscinas de esco­las, nas embarcações na região Norte. Além desse esquecimento rápido, o brasileiro só se sensibi­liza devido à quantidade simul­tânea de mortos. Se morressem três vezes de um a um, não ha­veria nenhuma manifestação de solidariedade. É assim nos aci­dentes de trânsito, assassinatos, bebês abandonados, pessoas morrendo sem atendimento nos hospitais; nas quedas de aviões, nas enxurradas de todos os ve­rões e tantas outras mazelas.

Essa onda lembra a dos desfi­briladores após a morte de um jogador em campo, a falta de “grooving” (ranhuras) do Aero­porto de Congonhas. A maioria nem lembra mais do nome.

Já o título deste texto poderia ser “vai passar”, sobre essa soli­dariedade e a fiscalização só no momento da comoção; “Santa Maria é aqui”, analogia à músi­ca de Caetano Veloso, sobre esse tipo de irregularidade ser genera­lizado em qualquer canto deste país.

Sobram os argumentos de de­fesa prévia dos responsáveis que não cumpriram com o seu dever. Esses ficarão impunes, sem pre­cisar de defensores como os do mensalão. Caso a documentação esteja correta e uma câmera por perto, não faltará o “poc, poc, poc” de Marco Aurélio Garcia, ao comemorar “a não culpa” do poder público pelos mortos no avião da TAM.

Meio banalizado, mas a vida ainda é o bem maior da humani­dade e por isso causa toda essa comoção nacional. Portanto, nada, absolutamente nenhuma casa, nenhum local, nenhuma medida e muito menos qualquer lei pode estar correta quando coloca a vida em risco. Todas as autoridades públicas e especial­mente o governador e o coman­dante do Corpo de Bombeiros do Rio Grande do Sul precisam ser avisados de que “alvará correto” não pode significar atestado de óbito coletivo.

* O autor é Bacharel em direito


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