REDES SOCIAIS

Restrição a redes de Bolsonaro divide juristas mas aliados seguem fortes nos aplicativos

Estudo aponta que no WhatsApp e Telegram domina a narrativa bolsonarista de que prisão fere direitos humanos

Carlos Moura/Agência Senado
Carlos Moura/Agência Senado

Por Laura Scofield | Edição: Ludmila Pizarro | Colaboração: Guilherme Cavalcanti

Por descumprir as medidas cautelares impostas desde julho pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, principalmente aquelas referentes ao uso direto ou indireto das redes sociais, Jair Bolsonaro (PL) acabou em prisão domiciliar desde a última segunda-feira (4). A decisão de Moraes dividiu opiniões entre juristas e analistas das redes sociais. Há quem caracterize as medidas como muito restritivas e quem as valide por considerá-las adequadas aos crimes que teriam sido cometidos. Enquanto isso, o discurso bolsonarista segue prevalecendo em aplicativos de mensagens, como revela estudo da Palver.

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O que dizem os juristas

O advogado Thiago Bottino, coordenador do curso de direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), avalia que a aplicação das medidas faz sentido no processo. “No caso do Bolsonaro, [a restrição da comunicação] tem relação com os crimes pelos quais ele está sendo investigado. [Ele] é investigado por atentado à soberania e coação no curso do processo, inclusive por meio das mídias sociais, para colocar as pessoas contra as instituições democráticas e pressionar uma decisão judicial”, explica. 

A avaliação condiz com a da advogada criminalista Maíra Fernandes, também professora da FGV. “Essa medida [de proibir o uso das redes], embora não seja uma medida cautelar prevista expressamente na lei, também não é nova. Roberto Jefferson já teve também medida semelhante, Daniel Silveira, os blogueiros, todos aqueles acusados nos processos de fake news. Por quê? Porque está no cerne da acusação a utilização de redes sociais para a prática de crime”, afirma. 

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Já para o advogado criminalista Matheus Falivene, doutor em direito penal pela Universidade de São Paulo (USP), as restrições não deveriam ter sido aplicadas, porque tolhem o engajamento popular. “Assim como muitas pessoas ficaram indignadas com a prisão do Lula, hoje em dia tem muitas pessoas indignadas com a prisão do Bolsonaro. Então a justiça acaba utilizando esse mecanismo da proibição de entrevista, proibição de falar, como um meio de impedir que tenha uma pressão popular sobre a justiça”, avalia. 

Por que isso importa?

  • A prisão domiciliar do ex-presidente Jair Bolsonaro, em função de não respeitar as medidas cautelares impostas pelo STF, e relacionadas com as redes sociais, tem gerado consequências ao governo Lula.
  • Uma delas é o ‘tarifaço’ imposto pelo presidente dos EUA, Donald Trump, a diversos produtos brasileiros.

Versão de Bolsonaro segue forte nas redes

Ainda que esteja proibido de usar as redes sociais, a versão de Jair Bolsonaro sobre sua prisão — de que ele estaria sendo perseguido por um judiciário parcial — tem ecoado em aplicativos de mensagem. Um estudo feito no WhatsApp e Telegram pela Palver, empresa especializada em análise de trends nas redes sociais, mostra que as narrativas predominantes entre os dias 23 de julho e 5 de agosto são contrárias à prisão domiciliar do presidente. O estudo, acessado pela Agência Pública, analisou os conteúdos compartilhados por pessoas de várias orientações políticas em 105 mil grupos no WhatsApp e 5 mil grupos no Telegram.

O relatório destaca as narrativas dominantes nos grupos analisados. A principal define Moraes como um “violador dos direitos humanos” e caracteriza a prisão de Bolsonaro como ilegal. O estudo também aponta que a prisão de Bolsonaro foi muito repercutida entre os grupos, tendo sido abordada por 892 mensagens a cada 100 mil, com pico no dia posterior à determinação da prisão.

“Os grupos falam de tudo, desde mandar figurinha, falar de futebol, falar de televisão, de novela, até esse tema [da prisão do Bolsonaro]. A gente considera que acima de 50 [mensagens] a cada 100 mil, já há alguma relevância. Mais de 800 é bastante relevante, mostra que existe uma discussão acelerada. Só como referência, [as citações a] Lula são 500, na média”, analisa o responsável pela área de inteligência e co-fundador da Palver, Luis Fakhouri.

Dessa forma, Fakhouri avalia que impedir Bolsonaro de usar as redes não afeta de forma considerável o dia a dia do bolsonarismo nas redes. “O Bolsonaro, quando ele está nas redes, ele não está todo dia… mas o bolsonarismo está todos os dias. Eu não sei se precisa da figura dele nas redes, porque tem o Flávio, o Eduardo, o Carlos e o próprio Nikolas, que, quando falam, as pessoas entendem como uma mensagem bolsonarista, para além do Jair Bolsonaro. É claro que tem um peso quando ele vai lá e grava um vídeo, mas para o dia a dia, não imagino que isso altere tanto”, explica o pesquisador.

De acordo com o relatório, entre 3 e 5 de agosto, 69% do conteúdo viral (mensagens encaminhadas com frequência) e 36% do conteúdo orgânico (respostas ao conteúdo viral) eram contrários à aplicação das medidas contra Bolsonaro. O percentual favorável à medida representava 3% do conteúdo viral e 11% do orgânico. 

Na parte jurídica, Matheus Falivene questiona, em especial, o fato de a permissão de entrevistas ter sido relacionada à proibição da divulgação de conteúdos nas redes sociais. O advogado avalia a medida como “muito restritiva” e “não deixa claro exatamente o que seria descumprimento”. “Hoje qualquer tipo de manifestação pública acaba indo pra rede social e se você proíbe que terceiros postem, você pune o indivíduo por um fato que é cometido por terceiro”, declara. Falivene não diria, por exemplo, que é seguro Bolsonaro dar uma entrevista à imprensa. 

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Por outro lado, Bottini considera que a definição é clara e que Bolsonaro poderia dar uma entrevista à um veículo de mídia profissional sem infringir a cautelar. “Acho que a preocupação do ministro é com as milícias digitais. Não tem uma definição jurídica do que é milícia digital, mas o que a gente está falando é o seguinte: tem contas de pessoas reais, naturais, e tem contas de robôs. Contas falsas, que ficam multiplicando aquilo de uma forma descontrolada e sem que você consiga identificar a pessoa e responsabilizar essa pessoa por isso, o que é totalmente diferente de um veículo de comunicação”. 

Lula também conviveu com restrições de comunicação

Lula durante a entrevista exclusiva para a Agência Pública na sede da Polícia Federal em Curitiba em 2019
Lula durante a entrevista exclusiva para a Agência Pública na sede da Polícia Federal em Curitiba em 2019

Quando foi preso em 2018, o atual presidente da República, Luís Inácio Lula da Silva (PT) passou mais de um ano sem poder falar com a imprensa. Os processos criminais e os momentos da prisão de Lula e Bolsonaro são diferentes, mas guardam essa semelhança: os dois enfrentaram restrições relacionadas à comunicação.

Na avaliação de Bottino, no caso de Lula, não havia relação entre os crimes apontados e a divulgação de informação para justificar a medida. “Lula foi condenado por corrupção e lavagem de dinheiro, isso não tem relação nenhuma com entrevista ou rede social”, afirma. “Lula nunca foi acusado de utilizar rede social ou veículo de imprensa ou qualquer que fosse para a prática de crime. Bolsonaro sim”, complementa a advogada Maíra Fernandes. 

Matheus Falivene, por sua vez, diz que em nenhum dos casos as restrições deveriam ser aplicadas. Para ele, as restrições configuram “medidas arbitrárias que visam tolher a possibilidade de eles moverem as massas” com o intuito de “anulá-los politicamente”, declara.

As semelhanças entre os dois processos, no entanto, acabam aí, avaliam os advogados. Lula havia iniciado o cumprimento de sua pena em regime fechado, em uma época na qual era permitida a prisão após a segunda instância; já Bolsonaro é alvo de medida cautelar e está em prisão domiciliar em caráter preventivo. 

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Lula já havia sido julgado e condenado — condenação que foi anulada em 2021 por erros processuais; enquanto Bolsonaro ainda está em fase de apresentação de alegações finais e deve ser julgado nos próximos meses.

“As situações jurídicas são bem diferentes”, disse Bottino. “O que tem em comum entre eles é que são processos criminais contra ex-presidentes. Porque, de resto, os casos são bem diferentes e a natureza da prisão também. Tem apenas um crime que é comum, organização criminosa”, explicou Falivene. O crime é definido como a união de vários autores “para a finalidade da prática de infrações penais de forma estruturada, ordenada e com divisão de tarefas”. 

Jair Bolsonaro está sendo julgado pelo Supremo por abolição violenta do Estado Democrático de Direito, organização criminosa armada e danos ao patrimônio da União. Já se tornaram réus na mesma ação 31 pessoas — dois militares tiveram a denúncia rejeitada e o influenciador Paulo Figueiredo, parceiro de Eduardo Bolsonaro (PL-SP) na negociação por sanções nos Estados Unidos, ainda não teve seu caso analisado. Eduardo também está sob investigação do STF em função de sua articulação nos Estados Unidos contra as autoridades brasileiras. O julgamento tem sido coberto pela Pública






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