À sombra do Morro do Gravatá, em Penha, e às margens do rio que leva o mesmo nome e divide o município de Navegantes, está a Vila dos Pescadores. Um pequeno recanto — quase secreto até pouco tempo — que ainda resiste ao avanço da urbanização. Encravada numa área reconhecida como de preservação permanente, a vila é monitorada por órgãos ambientais como o Ima, o Ibama e o Ministério Público.
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São apenas 28 casas simples e bem cuidadas, alinhadas ao longo de uma trilha estreita entre a mata e o costão. Lá vivem cerca de 100 pessoas, em harmonia com a fauna local: garças, saracuras ...
São apenas 28 casas simples e bem cuidadas, alinhadas ao longo de uma trilha estreita entre a mata e o costão. Lá vivem cerca de 100 pessoas, em harmonia com a fauna local: garças, saracuras, tucanos, aracuãs, cágados e pequenos mamíferos compartilham o território com os humanos.
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O acesso é rústico: uma ponte de madeira conecta o vilarejo ao restante do mundo. Carros não entram. Só pedestres, bicicletas e motos. Antigos moradores lembram que, antes da construção do molhe de Navegantes, era possível chegar também pela praia. A maré baixa deixava o trajeto com água até os tornozelos; na cheia, até a cintura.
Meio século de histórias
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A história da vila começa há cerca de 50 anos, com o pescador Binho, já falecido, que ergueu a primeira casa e um pequeno rancho de pesca. Seu filho Iran ainda vive ali. Inicialmente ocupada apenas por pescadores, a comunidade se diversificou com o tempo. Algumas casas foram vendidas até o início dos anos 2000, mas desde 2009 está proibida qualquer negociação de imóveis, assim como a construção de novas casas.
A vida é simples, com infraestrutura mínima. A água vem de poços cavados pelos próprios moradores. A energia elétrica é precária: apenas sete relógios atendem todas as residências. A regularização do fornecimento é uma das reivindicações urgentes da comunidade.
A comunidade vigia e cuida
Os moradores não apenas habitam, mas cuidam ativamente da vila. Mantêm a trilha que liga o povoado à Praia de São Miguel, fiscalizam o manguezal, protegem a mata e orientam os visitantes. Nos fins de semana, o local chega a receber mais de 500 pessoas.
Maria da Conceição Neves, mais conhecida como Preta da Vila, vive ali há 38 anos. Ela preside a Associação de Moradores, criada em 2006 com apoio do Ministério Público. Preta também acompanha quem passa em direção à gruta existente aos pés do morro. O pequeno altar, construído há mais de quatro décadas, homenageia um menino de Blumenau que se afogou no local no fim da década de 1960. Lá, há uma foto do garoto e uma imagem de Nossa Senhora Aparecida, colocada depois pelos moradores.
Mesmo com tanto zelo pela natureza, os moradores enfrentam processos por suposta ocupação irregular. Um deles, julgado à revelia pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4), resultou na perda do direito de moradia.
De acordo com Jeann Neves, filho de Preta, o processo alegava que a vila era ocupada apenas por ranchos de pesca, sem habitação. “Essa informação só foi corrigida agora, num recurso ao Superior Tribunal de Justiça”, explica. A sentença determinava que a prefeitura construísse um galpão para equipamentos e demolisse todas as casas.
A comunidade contratou um novo advogado e aguarda decisão do STJ. Preta destaca que a legislação ambiental mudou em 2009, garantindo o direito de permanência às famílias que já viviam em áreas de preservação antes dessa data. E é com essa esperança que a vila resiste.
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