Robison: Do ponto de vista jurídico é reversível. Independentemente da questão política, é um retrocesso vincular novamente o Porto de Itajaí à Companhia Docas do Estado de São Paulo. Foi algo que já vivemos lá atrás, em 1995, quando tivemos o processo de municipalização, foi uma grande vitória para Itajaí. É praticamente uma unanimidade no setor portuário, de logística, de comércio exterior e no meio político de Itajaí, grande parte dos nossos deputados federais, a continuidade do modelo de municipalização. Esse consenso local, infelizmente não está sendo ouvido lá em Brasília.
Houve conversa com o governo federal sobre o consenso sobre o modelo de municipalização do Porto de Itajaí?
Robison: Desde a vitória nas eleições, estive na Antaq, na Secretaria de Portos, conversando com técnicos e com o ministro Silvio [Costa Filho], e o secretário Alex [de Ávila]. Quando houve aquela votação do processo de empresa pública no porto, nós conversávamos com os nossos vereadores, sabíamos do risco, sabíamos que tinha um movimento de bastidores que defendia o processo de federalização. A gente vivenciou a extinção da Portobras; ficar ligado à Codesp, de 1990 a 1995, foi um período difícil. Obviamente que gerenciar o Porto de Itajaí, para eles, não era muito bom. Nós competimos com o Santos. A gente sabe que sempre foi muito difícil de gerenciar, tanto é que se buscou a alternativa da municipalização em um processo apartidário. [Qual alternativa para evitar a federalização?] Nós levamos a proposta de uma renovação temporária com o município de Itajaí e que nesse período houvesse uma construção. Até para fazer uma maldade precisa planejar. Essa falta de planejamento da mudança da autoridade portuária pública municipal para a companhia Docas de São Paulo é traumática. Existem contratos, existem operações simultâneas em Itajaí, contêineres, carga geral e transatlânticos...
Qual a principal mudança de um porto municipal ao federalizado?
Robison: As decisões passam a ser tomadas por quem não é do município, quem não entende a vocação do município. Hoje, existe praticamente uma unanimidade no setor que operações de carga geral devem ser realizadas em Itajaí. Quem garante que o governo federal, que a companhia Docas, em Santos, que é um concorrente de Itajaí, entenda assim? Nós estamos entregando a autoridade portuária para um concorrente, que é o Porto Santos. Quem garante que eles vão defender aquilo que o município e a classe política defendem? O governo federal tem condição de decidir se vai federalizar ou municipalizar, mas sem debater, sem fazer audiência, sem ouvir os trabalhadores os quais eles representam? Esse debate tem que acontecer, é um respeito com a nossa cidade. Tudo aquilo que o Porto de Itajaí adquiriu durante esse período do convênio de delegação nós perdemos para o governo federal e pra Docas de São Paulo. Um exemplo é a área da Marejada, onde é feita a Ocean Race; o parque do Atalaia; a área adquirida recentemente em frente ao Samurai; a sede ali da Portobras, que é uma área que seria muito interessante do ponto de vista do turismo. Não são somente as operações. Tem uma série de ativos que o município acaba perdendo. Nós entendemos que os prazos estão muito curtos para uma mudança de CNPJ e, talvez, nós não conseguiremos, nesse período, alfandegar. A JBS, que é um gigante, teve quase quatro meses para alfandegar o terminal. Vocês imaginem conseguir fazer isso em três semanas? Nós colocaríamos em risco todas as operações feitas na área pública do porto.
"É um retrocesso vincular novamente o Porto de Itajaí à Companhia Docas do Estado de São Paulo"
Como o governo do estado de Santa Catarina está vendo essa situação?
Robison: O governador esteve conosco em Brasília e defende o posicionamento que nós defendemos em Itajaí. O governo federal já delegou a Santa Catarina a administração de três portos: São Francisco, Imbituba e Laguna. O porto de Itajaí é municipalizado. No governo do Jorginho Mello, que é do PL, a gestão dos três portos nunca esteve tão bem. A relação com o governo federal, com os técnicos de Brasília, do Robison, enquanto secretário de Portos, sempre foi muito boa, porque era uma discussão técnica. [Mas não faltou a relação política? O presidente Lula veio a SC e o governador faltou ao evento...] A relação entre PT e PL é uma relação conflituosa do ponto de vista político. Aqui nós estamos defendendo o que é melhor para a cidade, para o estado e para o país. Quando nós colocamos uma questão técnica, nós temos que buscar o melhor modelo. Por que estão tirando o Porto de Itajaí? Por que o prefeito é do PL e o vice é do PL? Estão agindo com fígado lá em Brasília...
Antes da saída da APM Terminals, ainda no governo Bolsonaro, houve discussões sobre a privatização total. Essa discussão atrasou o lançamento do edital definitivo. O senhor era favorável a privatização?
Robison: Sempre fui favorável à cidade de Itajaí. Primeiro que a paralisação das operações não aconteceu durante o governo Bolsonaro. Até dezembro de 2022, as operações aconteceram em Itajaí. Houve uma falha da autoridade portuária público-municipal, porque o governo Bolsonaro defendia a privatização, da mesma forma que o governo Lula defende. Os dois governos estão praticamente defendendo a mesma coisa. O governo Bolsonaro defendia a privatização das operações, da dragagem, e a privatização da autoridade portuária. O governo Lula, do PT, já anunciou a privatização da dragagem, a privatização das operações, e que a autoridade portuária não fica em Itajaí.
O ministro Silvio Costa Filho disse: “Infelizmente, o Porto de Itajaí foi fechado no governo anterior. Não se teve nenhuma atenção pelo porto. Pelo contrário, o que nós vemos é um porto fechado, um porto desestruturado e mais do que isso, desempregando milhares de pessoas”. Onde o governo Bolsonaro pecou em relação ao porto de Itajaí?
Robison: Primeiro que não houve paralisação no governo Bolsonaro. Até dezembro de 2022 as operações ocorreram normalmente. Houve três processos desastrosos na gestão municipal. Houve um processo de contrato transitório deserto. O outro ganhou uma empresa que todo mundo sabe que os donos foram parar na cadeia. O terceiro foi avocado o processo para Brasília e também foi um processo desastroso. A primeira empresa não tinha capacidade de tocar. A segunda também não tinha condição. A nossa sorte é que no processo ganho pela segunda empresa, houve um terceiro que comprou, assim garantindo a retomada das operações. Esses quatro últimos anos foram extremamente desastrosos, mas nós tivemos boas histórias durante esse período de 30 anos de delegação. Houve uma virada de chave na cidade a partir do momento que nós saímos da Companhia Docas. Itajaí era a sétima economia do Estado, passou para a primeira quando as decisões passaram a ser feitas aqui, independente do governo, porque o PT também tocou a cidade por quatro anos.
"A carga geral bota a comida na mesa do trabalhador portuário"
Houve recentemente a criação de uma empresa pública para gerir o porto. Por que demorou tanto para essa aprovação acontecer?
Robison: Demorou bastante e nesse ponto o governo federal está coberto de razão. Nós somos o único porto do Brasil que não criou a empresa pública. Inclusive, na nova Lei de Portos, que está sendo desenhada, diz que a autoridade portuária que não tiver empresa pública formada perde automaticamente a sua delegação. Itajaí perdeu muito de não ter formado a empresa pública. [E por que essa demora, prefeito?] Má política, infelizmente. Se eu sou o prefeito de Itajaí e naquele momento não tenho a maioria na Câmara de Vereadores para colocar esse projeto de aprovação, eu peço urgência e levo esse projeto para a sociedade. Faltou boa vontade política da gestão atual de colocar isso como uma prioridade. [Mas os vereadores não deveriam pensar no bem da cidade?] Com certeza. O município mandou esse projeto, a Câmara durante esse período não mandou para a votação, mandou agora recentemente porque houve uma pressão do nosso grupo político de transição. Se a empresa pública já tivesse sido construída aqui em Itajaí, já tivesse sido montada, nós não teríamos vivido nada disso que nós vivemos nesses últimos dois anos. Não teria sido lançado um edital frágil, não teria acontecido uma licitação deserta e o processo não teria sido avocado pra Brasília.
Seguindo a federalização, qual o seu projeto para continuar a expansão das áreas? A gente poderia ter um terminal de multipropósito buscando atender os segmentos que já fazem parte da natureza do Porto de Itajaí?
Robison: Sem dúvida. Eu sempre digo que o navio de contêiner paga a conta, a carga geral bota a comida na mesa do trabalhador portuário. Se o porto ficar na mão do município, vamos aumentar a área do porto organizado. Isso já está dentro do nosso planejamento, tanto do ponto de vista de área primária de armazenagem como de cais, para criar terminais exclusivos, porque nós temos um espaço praticamente morto que pode ser aproveitado, estendendo ali pela rua Blumenau.
Como a prefeitura de Navegantes e a Portonave têm observado essa discussão?
Robison: Com muita preocupação. Durante esse período em que nós não tivemos movimentação portuária, o Porto de Itajaí não deixou de ter arrecadação. Nós estávamos parados aqui, mas lá estavam operando, eram quase R$ 6 milhões por mês de arrecadação, através dos navios que adentravam no canal e era um recurso utilizado para continuar a manutenção da dragagem.
Como estão as tratativas para a segunda etapa da bacia de evolução do Complexo Portuário de Itajaí? C
Robison: Se ficar com o município, eu resolvo e da mesma forma que nós resolvemos na Baía da Babitonga. Adiantar a receita do privado, como adiantaram agora a receita para custeio da dragagem, que estava atrasada pela autoridade portuária pública municipal. Adianta a receita e, no decorrer do tempo, vai abatendo na cobrança das tabelas. [Quem será o superintendente do porto de Itajaí?] Primeiro precisamos ter a certeza de que a administração portuária ficará conosco, mas o superintendente, assim como todas as outras indicações que estamos fazendo, é alguém técnico e do mercado, que entenda da atividade portuária. Enquanto secretário de Estado, o nome do superintendente do Porto de Imbituba, por exemplo, foi construído em consenso com o governo federal. Independente da questão ideológica e partidária, nós construímos um nome de consenso, um técnico vindo de Brasília que administra o porto de Imbituba. Isso poderia ser feito aqui também.
Existe alguma cartada final, ações que serão tomadas para tentar evitar a federalização?
Robison: A decisão está na mão do presidente da República. A gente tem feito todos os esforços possíveis, unindo lideranças locais, movimentos acontecendo, nós temos uma agenda em Brasília semana que vem, com a Frente Parlamentar de Portos. Todo esse trabalho de pressão política, de convencimento, nós estamos fazendo por entender que é o melhor modelo para Itajaí.