Prefeitura vai propor internação involuntária de andarilhos
Proposta inspirada em outras cidades visa atender de forma “humanizada” quem sofre com dependência química e transtornos mentais
João Batista [editores@diarinho.com.br]
Situação está sendo discutida pelo município, MP, polícias e secretaria de Segurança
(foto: João Batista)
Proposta inspirada em outras cidades visa atender de forma “humanizada” quem sofre com dependência química e transtornos mentais (Foto: João Batista)
A prefeitura de Itajaí elabora proposta que prevê a internação involuntária de pessoas em situação de rua que sofrem com dependência química ou transtornos mentais. Um grupo de trabalho foi criado pra formatar o projeto, com base em iniciativas já adotadas em outras cidades, como Florianópolis, que aprovou lei semelhante neste mês. A medida visaria reduzir a população de rua e definir ações pra reinserção social.
Em Itajaí, um anteprojeto foi entregue pelo vereador Beto Cunha (PSDB) ao prefeito Volnei Morastoni (MDB) prevendo o modelo de “internação involuntária humanizada”. “Em Florianópolis já ...
Em Itajaí, um anteprojeto foi entregue pelo vereador Beto Cunha (PSDB) ao prefeito Volnei Morastoni (MDB) prevendo o modelo de “internação involuntária humanizada”. “Em Florianópolis já foi aprovado e aqui em Itajaí podemos, sim, trazer essa solução para um problema social que nós estamos vivendo em nosso município”, comenta, defendendo a mesma proposta para Itajaí.
Na capital, o projeto recebeu recomendação das defensorias públicas da União (DPU) e do Estado (DPE-SC) para que o município não adotasse a medida. Ainda assim, a proposta avançou na câmara e virou lei no dia 4 de março. O entendimento das defensorias foi que a internação involuntária tem que ser medida excepcional e não adotada como política pública, devendo ser priorizado o fortalecimento de serviços extra-hospitalares existentes, como Centro Pop e Caps.
A lei aprovada em Floripa prevê que, após o tratamento, a pessoa seja encaminhada pra cursos profissionalizantes. O projeto abrange a oferta de cuidados médicos e apoio multidisciplinar pra que a pessoa se recupere totalmente da dependência química ou dos transtornos e retorne ao convívio social e familiar. A internação compulsória deve ser autorizada por um médico e comunicada a órgãos como o Ministério Público.
“O que nós queremos com isso é proteger o direito à vida da pessoa em situação de rua. Nós já ouvimos inúmeros relatos de pessoas que voltaram para o convívio familiar, mercado de trabalho, após tratamento. É isso que buscamos, a reinserção social, oferecer uma nova chance a essas pessoas”, defende Beto Cunha.
Na entrega do anteprojeto do vereador ao prefeito, Volnei informou que a situação dos moradores de rua em Itajaí já tem sido discutida pelo município com o MP, as polícias, a secretaria de Segurança e outros setores da prefeitura. No ano passado, uma audiência pública também tratou do tema na Câmara de Vereadores.
Projetos de outras cidades, como Criciúma, São José, Chapecó e Balneário Camboriú, onde uma proposta já tramita na Câmara de Vereadores, são consideradas na criação da lei sobre a internação involuntária em Itajaí. “É lógico que o atendimento tem que ser humanizado porque nós estamos tratando, acima de tudo, com pessoas, com seres humanos”, comentou o prefeito.
Nova proposta será apresentada ao prefeito
A secretária de Assistência Social, Neusa Geraldi, coordena o comitê intersetorial que discute medidas para a população de rua. Ela informa que o processo está adiantado, faltando os complementos da secretaria de Saúde pra que a proposta seja apresentada na semana que vem ao prefeito. Depois, ainda haverá análise da procuradoria para, então, ter o encaminhamento pra câmara.
O trabalho vai resultar em três projetos de lei, um sobre a internação humanizada, outro que proíbe o uso de drogas e álcool em praças e locais públicos, e outro com ações de segurança, que prevê combater crimes como furtos de fios e portões. Para a internação, que será feita em clínicas credenciadas, a secretária destaca que haverá um protocolo de trabalho antes, durante e depois da internação.
Os procedimentos incluem avaliação médica, acompanhamento do tratamento e ações pra reinserção social e no mercado de trabalho após a recuperação. “É uma coisa que tem que ser muito bem pensada. Não é simplesmente pegar e levar”, comenta Neusa. Ela observa que a intervenção do poder público é necessária quando a pessoa, com a saúde comprometida, não tem mais condições de dar conta da própria vida.
Em muitos casos, a pessoa também não tem família. “A gente também não pode deixar esse cidadão morrendo aos poucos na rua. Tem que ter alternativas de saúde pra poder tratar dessas pessoas”, avalia. Dependendo da situação, a secretária explica que várias medidas serão adotadas, conforme os serviços já existentes para andarilhos. Sobre eventuais contestações, Neusa ressalta que a internação involuntária já é prevista na Lei Federal 10.216/2001, que é aplicada nos municípios. “É também uma estratégia e uma forma de poder ajudar essas pessoas. Porque um número significativo de pessoas em situação de rua tem transtorno mental e estão totalmente comprometidas. Então, precisa de uma intervenção de saúde pra ajudar”, completa.
Além dos projetos, o município também elabora um diagnóstico sobre a população de rua em Itajaí. O estudo, com previsão de ser concluído na semana que vem, será base pra criação do Plano Municipal de Atendimento à População em Situação de Rua. O documento vai definir como cada secretaria deve atuar, dentro de suas competências, nessa área.
MP apura lei em Floripa
Em Florianópolis, a nova lei já virou alvo de denúncia que está sendo apurada pelo Ministério Público. A 33ª Promotoria da Capital, que atua na área da saúde pública, informou que abriu um procedimento preliminar por meio do qual pediu informações à prefeitura. O processo ainda está em andamento.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem jurisprudência contra a internação obrigatória como política de saúde. “A internação compulsória deve, quando possível, ser evitada, de modo que a sua adoção apenas poderá ocorrer como última opção, em defesa do internado e, secundariamente, da própria sociedade”, diz trecho de uma das decisões.
As defensorias públicas seguem a mesma diretriz, de que a medida deve ser exceção. Em 2023, uma decisão do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), também proibiu a retirada e o transporte forçado de pessoas em situação de rua, em caso polêmico envolvendo medida pra internação compulsória de usuários de crack em São Paulo (SP).
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