Justiça
Prisão causa polêmica com o MP e a polícia
Promotor se manifestou publicamente criticando a decisão da 1ª Vara Criminal de Balneário Camboriú e do delegado
Franciele Marcon [fran@diarinho.com.br]

A detenção e a posterior liberação de três supostos assaltantes de uma loja de celulares, em Balneário Camboriú, causou um mal estar institucional entre a justiça, o ministério público, a polícia Militar e a polícia Civil. A PM prendeu três pessoas acusadas do assalto, tráfico de drogas e posse de armas na noite de quinta-feira, após um assalto a uma loja de celulares na avenida Central.
A operação da PM teve buscas em dois apartamentos, apreensões e a detenção de três suspeitos - um quarto teria fugido. Na delegacia, contudo, o delegado de plantão não constatou os elementos legais para a prisão dos suspeitos ser considerada um flagrante de assalto.
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O delegado entendeu que apenas um dos suspeitos poderia ser autuado e preso por tráfico e porte ilegal de arma. Os demais envolvidos foram liberados. O suspeito ficou preso e menos de 24 horas depois foi levado para a audiência de custódia na justiça. O juiz considerou nula a apreensão feita na casa dos suspeitos e liberou o acusado para responder pelo crime em liberdade. Após isso, o promotor criminal José de Jesus Wagner criticou publicamente a justiça e a polícia Civil que, segundo ele, “erraram” .
O assalto
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O roubo de 12 celulares Iphones aconteceu às 19h50 de quinta. Após buscas da PM, por volta das 23h teria sido identificada a casa de um dos suspeitos do crime. Os PMs entraram no local sem mandato judicial e prenderam três pessoas alegando flagrante. Um deles teria confessado o crime aos PMs e no apartamento dele foram encontrados seis celulares, roupas usadas no roubo, um revólver calibre 38 com seis munições e mais de um quilo de maconha.
O suspeito também teria contado onde estava um quarto envolvido no assalto, num endereço da rua 908. A PM foi ao local, entrou no apê novamente sem ordem judicial, mas o suspeito teria fugido pela sacada. Nesse endereço a PM encontrou mais celulares roubados e uma arma falsa.
O delegado David de Queiroz autuou somente um dos três presos levados pela PM à delegacia, mas não por flagrante de assalto. Segundo o entendimento do delegado, o flagrante ocorreu por tráfico e porte ilegal de arma de fogo. Na audiência de custódia, o juiz Roque Cerutti relaxou a prisão do suspeito entendendo que não houve flagrante de assalto, como também entendeu o delegado, e tampouco de tráfico ou porte de arma, pois as provas apresentadas pela PM eram totalmente nulas diante da falta de flagrante do roubo e dassr buscas na casas do bando não serem em situação de flagrante e sem ordem judicial.
MP vai recorrer da decisão

Promotor José Wagner criticou delegado e juiz
O promotor José de Jesus Wagner decidiu não só recorrer da decisão, como criticar o juiz e o delegado do caso por “erro”. “O delegado entendeu que não houve flagrante em relação ao roubo, apenas pelos crimes de tráfico e posse irregular de arma de fogo com numeração suprimida. Assim, o juiz Roque Cerutti relaxou o flagrante desses dois crimes (tráfico e arma), pois então não haveria flagrante desses dois crimes, pois haveria nulidade, decorrente de não flagrância do crime roubo. Vou recorrer porque a PM foi acionada de imediato, iniciaram-se uma série de diligências por parte do serviço de inteligência e pelo policiamento ostensivo, com base nas filmagens existentes e informações colhidas na cena do crime”, justifica o MP.
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Segundo o promotor, a PM constatou que os celulares roubados estavam sendo vendidos no centro de BC e, com as imagens, descobriu a identidade de um dos autores, que foi preso. “No apartamento dele, estavam mais duas pessoas, não envolvidas no crime, mas ali foram encontrados a droga e a arma do crime. Durante as diligências, foi localizada a casa do outro envolvido, que fugiu do local, contudo foram localizados alguns celulares roubados e a roupa usada no cometimento do roubo. Todas essas diligencias foram continuas e envolveram cerca de 10 policiais militares”, fala o promotor.
Para o represente do MP, a prisão em flagrante “ estava evidente em toda a operação da PM”.
Juiz considerou toda a operação ilegal

Juiz considerou as prisões nulas
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No despacho, o juiz Roque Cerutti, da 1ª Vara Criminal da Comarca de BC, decidiu relaxar a prisão em flagrante porque a falta de prisão em flagrante pelo roubo invalidou toda a operação na casa dos suspeitos.
“Com relação a não lavratura de flagrante no que tange ao crime de roubo, parece ter agido com acerto o Delegado de Polícia, tendo em vista que, em princípio, não se demonstrou que no momento da prisão o réu se encontrava em qualquer das situações de flagrâncias previstas no art. 302, do CPP, até porque não foi abordado em via pública e nem encontrado com ele os instrumentos, armas objetos ou papéis que façam presumir ser o autor da infração, sendo que a arma de fogo e a res furtiva somente foi apreendida após o ingresso na residência do conduzido e diga-se que até o momento da apreensão os policiais não sabiam da existência dos aludidos objetos”, completou.
O juiz acrescenta que nos autos “os PMs chegaram ao lar do conduzido por acaso, em razão deste supostamente ter sido visto adentrando no prédio onde fica localizada a sua residência, sem, contudo, ter sido visto os objetos do roubo ou a arma empregada, pelo que entendo que não poderia de fato ter sido lavrado o flagrante por roubo”.
Sobre a conduta do delegado, o juiz diz que “apesar de a autoridade policial ter optado em não lavrar o flagrante por roubo, porque entendeu não estarem presentes as hipóteses do art. 302, o fez pelo delito de posse de arma de fogo e tráfico de drogas, que são permanentes. Ora, se não havia legalidade da prisão em flagrante do conduzido pelo delito de roubo, por conseguinte, o ingresso na residência do acusado e a apreensão das drogas e do artefato bélico foi absolutamente ilegal, o que impõe o relaxamento da prisão”, finaliza.
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Estado não pode agir como criminoso, afirma delegado

“Não lavratura de auto de prisão em flagrante não corresponde a qualquer espécie de absolvição ou impunidade,” delegado David de Queiroz
O delegado David se pronunciou após as críticas do promotor. Ele informou que ainda não teve acesso à decisão judicial ou ao parecer do MP, mas diz que sua decisão foi técnica e baseada na lei. “Sem entrar no mérito de qualquer decisão, vale ressaltar que o sistema de justiça criminal é constituído por filtros de análise sobre o fato supostamente criminoso e sua legalidade. Assim, o delegado de polícia realiza o primeiro filtro de legalidade acerca de uma prisão e encaminha sua decisão ao juiz e promotor, que realizam os respectivos demais filtros, com a participação do advogado de defesa. Portanto, decisões contrárias nesse sistema de filtros fazem parte do processo democrático e não significam, necessariamente, a existência de erro de qualquer dos envolvidos. É útil destacar que a não lavratura de auto de prisão em flagrante não corresponde a qualquer espécie de absolvição ou impunidade”, disse.
Mesmo sem o flagrante do roubo, o delegado determinou a abertura de um inquérito pra apurar o crime. “Em que pese não ter havido flagrante pelo roubo, no caso em contento, determinei a imediata instauração de inquérito policial para melhor esclarecimento dos fatos e identificação dos coautores. Logo, os autores serão devidamente investigados e, possivelmente, processados, o que pode resultar em condenação e prisão. A Polícia Civil não tem satisfação em deixar de prender supostos criminoso. É ingrata a tarefa de ter, como manda a lei, que soltar o suposto autor de um crime e ir de encontro aos anseios da população e ao sentimento de justiça. Todavia, em um estado democrático de direito não se admitem prisões a qualquer preço, desprovidas da legalidade. O Estado, para prender um criminoso, não pode agir como um criminoso, desrespeitando as regras processuais”, acrescentou.
“O que por vezes não é entendido pela população em geral é que eu, delegado de polícia, estou absolvendo um culpado quando realizo uma prisão ilegal ou produzo uma prova ilicita, e não propiciando justiça. As leis possuem caráter pedagógico. O recado que a lei dá ao policial ao proibir certas condutas é: não produza prova ilícita ou prenda indevidamente porque do contrário seu trabalho será em vão”, concluiu.
“Buscas incessantes”, diz comando da PM

Comandante Rafael respalda as prisões
O comandante da Polícia Militar de BC, tenente-coronel Rafael Vicente, afirma que respeita o posicionamento do judiciário e do delegado, porém apoia a fala do promotor de justiça e a ação dos PMs. “Se tratou de um crime que aconteceu na área central da cidade de BC, onde os agentes estavam portando arma de fogo, ameaçaram as vítimas, no local havia mulheres crianças, e as buscas foram incessantes, continuadas... Ao longo da noite os criminosos foram presos com as armas de fogo usadas no crime, com os objetos roubados, e com as roupas vistas nas filmagens, que foram encontradas com os autores. Além do reconhecimento das vítimas dos autores do crime. O comando do 12º Batalhão entende que o posicionamento do MP é o mais adequado para essa situação que seria a prisão em flagrante dos autores do crime”, alegou.