A minha tristeza é Itajaí não ter um museu naval. Essa frase foi repetida inúmeras vezes pelo carpinteiro Ubiracy Wolf, o Bira, 64 anos, durante a palestra Carpintaria naval no Itajaí-açu, na casa da Cultura Dide Brandão, ontem à noite. Dividindo a bancada com Bira, o modelista naval Rui Flores Junior, 49, e o fotógrafo Ronaldo Silva Junior, 51, conversaram com a plateia sobre a extinção da construção dos barcos de madeira. O plá faz parte da programação da 15ª Cidade Revelada e seguiu por uma linha de dura crítica à preservação histórico-cultural da navegação peixeira.
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O fim das embarcações de madeira foi anunciado quando começaram a surgir os primeiros barcos de aço. Eram mais rápidos de serem construídos. Mas Bira ainda prefere sentir o cheiro da madeira. Ele ...
O fim das embarcações de madeira foi anunciado quando começaram a surgir os primeiros barcos de aço. Eram mais rápidos de serem construídos. Mas Bira ainda prefere sentir o cheiro da madeira. Ele conta que aos nove anos levou uma surra da mãe porque roubou uma garrafa pra comprar pregos e iniciar a criação. Pai de três filhos, sendo dois homens, nenhum deles quis seguir a profissão.
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Pra Bira, o pior não é saber que não existe gente interessada em continuar a serrar madeira e bater pregos. Mas, sim, ver essa fase da construção naval cair no esquecimento. Tá morrendo a carpintaria naval. A minha maior tristeza é Itajaí não ter um museu naval para mostrar como já foram as embarcações pesqueiras. Não temos memória disso, lamenta.
Uma forma encontrada pra perpetuar o pouco que restou foi através da produção do livro fotográfico Carpintaria das ribeiras do Itajaí-açu, com imagens feitas pelo fotógrafo Ronaldo entre os anos 1999 e 2001. Apesar disso, Rui diz que não há registro da história das embarcações dos últimos 30 anos pra cá. Hoje nós precisamos sair com uma lupa e procurar quem guardou registros dessa época. Pra preservar, precisamos primeiro resgatar. Itajaí tem vocação pro mar, mas não tem conseguido preservar isso, lamenta.
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Na plateia do auditório da casa da Cultura, o poeta paraense que participa da Cidade Revelada, Celso de Alencar, pediu um minuto da palavra e defendeu que os políticos precisam acordar pro resgate da memória naval. O governo de Itajaí deve entender esse trabalho como cultura. Se não tem condições de criar um museu, que busque ajuda com o governo federal. Essa arte náutica precisa ser preservada, reforça.
O peixeiro e atual secretário adjunto de Urbanismo de Florianópolis, César Floriano dos Santos, 59, também acompanhava a discussão e sugeriu que um museu e uma escola de carpintaria fossem feitos onde fica a fábrica de papel.
A conversa foi encerrada com tom de cobrança. Tanto os palestrantes quanto o público perguntavam por onde andariam os políticos, prefeito e secretário de Cultura que, apesar de convidados, não participaram da discussão. Nós vamos lutar por um museu. A cidade precisa e nós vamos resgatar a história da carpintaria naval, sentencia Bira.