Itajaí

Smykalla partiu, mas foi feliz

Artista que voltou a morar em Itajaí a convite do DIARINHO, volta pra Taubaté em busca de liberdade

Por Sandro Silva

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Smykalla ficou doente. Não do corpo. Nem da cabeça. O artista sentiu a alma machucada. Talvez, até oprimida. Saudade da liberdade que antes gozava, sem regras, sem horários, sem até mesmo higiene pessoal. Mas também sentiu saudade do frágil laço afetivo que tinha em Taubaté/SP. “Quero ver os meus netinhos do coração. Eles não vão me negar um lugarzinho pra eu botar um colchão no chão”, acreditava, se referindo a uma mulher e dois jovens filhos, a quem ajudava financeiramente no interior de São Paulo. 

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Walter Smykalla, aos 72 anos, quis voltar à cidade onde foi encontrado pelo DIARINHO há cinco meses, vivendo em condições subumanas. Itajaí perdeu novamente o artista que ajudou a popularizar as artes plásticas por aqui e deixou afrescos em quase uma dezena de templos católicos da região. Nos primeiros minutos da madrugada de sábado, 12 de outubro, o pintor embarcou num ônibus da empresa Penha/Itapemirim. Sequer aceitou ser levado de carro até Taubaté.

Há uma semana Smykalla já não pintava – um sinal de que algo estava errado. Sequer ia ao estúdio montado só para ele no asilo Dom Bosco, onde estava desde 26 de julho. O sorriso infantil não surgia mais no rosto. Estava bem, mas bastante diferente do Smykalla que, durante dois meses, se recuperou na casa de repouso. Os elogios ao local, que numa definição dele mesmo “parece um hotel três estrelas”, deram lugar a reclamações, a desconfianças. Smykalla ficou amargo, intransigente, resmungão. Esta foi uma face do artista que veio à tona como reação ao sentir-se preso, oprimido. “Não dá pra ficar no asilo. Aqui é deprimente. Um monte de gente velha. Eu me sinto um passarinho na gaiola”, disse ele, sexta-feira, ao DIARINHO.

O artista plástico itajaiense Walmir Binhotti, 43, acompanhou a mudança. Visitou Smykalla quatro vezes no asilo. Deu o cavalete para o estúdio, apresentou um empresário que lhe comprou algumas obras produzidas durante a estada do velho artista na casa de repouso, conversou longamente com ele. “A última vez em que estive lá, há pouco mais de uma semana, ele ainda pintava. Mas ele já estava meio que incomodando o pessoal do asilo, pois queria sair”, contou Binhotti que, como artista, compreende a alma livre do pintor.

Não adiantaram conversas, sugestões, propostas. Smykalla não queria mais ficar em Itajaí. Queria voltar para Taubaté. Um homem livre que tem plenas condições de fazer as próprias escolhas, afiançou o médico psiquiatra Vitor dos Santos, que sexta-feira pela manhã consultou o artista. Impossível segurar Walter Smykalla em Itajaí. Mesmo com um teto confortável e seguro, comida balanceada, roupas e assistência médica, ele afirmava que não estava bem.

Manteve firme a essência

Smykalla é diferente. Tem três faculdades, fala alemão com fluência e toca violino. Mas não gosta de regras, nem de formalidades. Se não é possível compreendê-lo, deve-se pelo menos respeitá-lo. Há cerca de um mês, quando o empresário Murilo Reis propôs ceder o espaço do tradicional restaurante Célio’s, no centro de Itajaí, para uma exposição onde pudesse vender suas obras, o artista desconversou. Depois confessou: “Não quero dinheiro. Quero me relacionar com a minha arte. Os meus quadros não são mercadorias. Não são sapatos, chinelo, batata”.

Passava da meia-noite de sexta quando o ônibus da Penha/Itapemirim chegou ao terminal rodoviário de Itajaí com quase duas horas de atraso. Sentado tranquilamente num dos bancos da rodoviária, Smykalla não estava mal humorado, como algumas horas antes na casa de repouso. Até brincava. “Eles querem judiar da gente”, dizia, numa risada curta que parecia dar pra si mesmo.

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Mas foi ao se sentar com dificuldades na poltrona de número oito do ônibus que o levaria a Taubaté que seu rosto se encheu de novo daquela alegria infantil. Naquela hora, só naquela hora, ele teve a certeza de que sua liberdade voltara: viveria do jeito que quisesse, sem regimentos ou ordens alheias. Livre. Talvez, a poetisa Cecília Meirelles estivesse certa, ao escrever: “...Liberdade, essa palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda...”

Na madrugada de 22 de maio, o DIARINHO encontrou Walter Smykalla morando num fétido cortiço no centro velho de Taubaté. Seu quartinho, de nove metros quadrados, era todo tomado de entulhos e baratas. Lixo, na opinião dos vizinhos de desventura, que o achavam louco. Matérias-primas, na visão do artista

No final de maio, a convite do DIARINHO, durante cinco dias Smykalla visitou as obras que deixou na região e reencontrou amigos. Uma forma de homenagear, em vida, o homem responsável pelo painel das crianças na praça da Pipa, na rua Uruguai, por afrescos em cerca de 10 igrejas e por cerca de 500 quadros pendurados em paredes de casas, empresas e instituições públicas, em cidades da foz do Itajaí-açu. Durante todo o tempo em que esteve aqui, não tomou banho. A higiene pessoal foi uma das convenções que há anos foram deixadas de lado pelo pintor

Em 26 de julho, Smykalla voltou pra morar em Itajaí. Aceitou o convite do DIARINHO. Foi encontrado no leito de um hospital de Taubaté. Havia caído mais uma vez na rua. Estava debilitado, desnutrido. “Ele chegou aqui com a pressão muito baixa e também com baixa glicose, com pouco açúcar no sangue”, explicou o médico Marcelo Machado. Há dois anos, numa das quedas, quebrou a bacia e hoje anda com extrema dificuldade. “Eu não quero bengala. Bengala é pra velho”, repete, contrariado, quando alguém lhe propõe que use um apoio para andar

Sem nenhum problema de saúde crônico, não demorou para que Walter Smykalla voltasse à vitalidade. Pintou vários quadros, recebeu visitas de gente importante – como o artista plástico Walmir Binhotti, o prefeito Jandir Bellini (foto) e o ex-prefeito e ex-deputado estadual Arnaldo Schmitt Júnior -, fez passeios, foi ao parque Beto Carrero Wolrd, almoçou como convidado no Célio’s Restaurante. Durante quase dois meses, foi como se tivesse dado uma trégua à liberdade. A mesma liberdade que o prejudicou fisicamente mas que lapidou a alma do artista

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Há uma semana, Smykalla se vestiu novamente de homem avesso às regras e convenções. Relutou terminantemente a ficar na cidade, onde estaria protegido, alimentado, cuidado. Quis voltar para o interior de São Paulo. E sozinho, de ônibus. Como se essa solidão, que o acompanhou por boa parte da vida, simbolizasse sua libertação. E foi assim, sem eira nem beira, mas feliz, muito feliz, que Smykalla tomou a estrada com várias telas em branco, que ganhou do DIARINHO e de Arnaldo Schmitt, bem como tintas, pincéis, seus dois inseparáveis violinos e algum dinheiro no bolso por conta dos quadros que vendeu aqui.




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