Itajaí

Mais de 200 ambulantes trampam nas ruas

Vendedores prestam serviço ao povão, mas será que é legal usar o espaço público sem ter uma regulamentação?

Sandro Silva

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sandro@diarinho.com.br

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Nem era seis da tarde e dona Maria José de Oliveira, 57, fez algo bem diferente do que costuma fazer. Ao invés de manter o negócio aberto, a espera da farta clientela, fechou a portinhola do trailer do Cantinho do Pastel. Depois foi embora. “No verão, se deixar aberto, a gente amanhece, trabalha direto”, diz, encostada no balcão, comparando o pico da temporada com a falta da clientela de ontem.

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O rebojo, com fortes ventos de sul-sueste, a chuvarada e o frio da terça-feira espantaram não só o ânimo da dona Maria José, mas também quem costuma frequentar uma das mais bonitas praças de Itajaí, a Genésio Miranda Lins, na Beira Rio.

Ontem, o local tava praticamente vazio. Coisa rara de se ver. A ambulante tinha justificativa pra fechar.

Mas nem sempre é assim. Mesmo durante os dias de semana, a Beira Rio ferve de pessoas e de pequenos comerciantes vendendo comida e bebida ou mesmo alugando bicicletas. E é aí que mora a preocupação do empresário Christian Werner Neumann, 42. “O espaço público precisa ser ocupado de forma correta. Esse pessoal tem autorização da prefeitura? Paga alvará?”, questiona o comerciante.

A cabreirice de Christian é com um risco real. “É preciso cuidar da ocupação das praças em Itajaí, senão, daqui a pouco vão virar um grande camelô novamente”, alerta, fazendo referência à praça Arno Bauer, do centro da cidade.

Somente este ano a Arno Bauer voltou ao domínio público, depois de ficar ocupada por quase três décadas por um camelódromo.

Talvez nem mesmo o empresário tenha se dado conta, mas acabou botando o dedo numa ferida. Das pessoas que o DIARINHO ouviu sobre o assunto, há quem levante a lebre de que usar espaços públicos pra fins comerciais não é algo que a lei permite. Há quem, apesar de concordar com isso, admite que, mesmo assim, ambulantes dão vida às praças e prestam um serviço para o povão.

Se você ainda não tem uma opinião formada sobre o assunto, dê uma olhada no que as mais variadas personagens ouvidas pelo DIARINHO– advogado, urbanista, ambulantes, usuários da praça e gente da prefeitura – dizem sobre o assunto. Se já tem uma opinião, leia mesmo assim. Quem sabe, não acaba mudando de ideia.

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Mais de 200 ambulantes

Soraya Silva, da assessoria de comunicação da prefeitura, informa que Itajaí tem 208 comércios ambulantes legalizados. Ou seja, com alvará. Meia dúzia deles na Beira Rio, no entorno da praça Genésio Miranda Lins.

Esses comerciantes podem trampar em quase todo o lugar da cidade e a maioria vende algum tipo de comida. “O veículo equipado para comércio de alimentos pode estacionar em vagas públicas nas ruas secundárias, sendo vedado o uso da calçada ou atrapalhar o trânsito e estacionar a menos de 15 metros das esquinas”, explica Soraya.

Christian Neumann, que deu o pontapé indicial da polêmica, faz questão de dizer que não quer prejudicar ninguém quando levanta a lebre da zona que pode virar a cidade se liberar geral o comércio ambulante. “De forma nenhuma é limitar o empreendedorismo, mas acho que precisa ser feito de forma regrada pra não virar terra de ninguém”, explica.

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E ele não tá errado em se preocupar com o descumprimento de regras. Na prática, é isso o que acontece. Na avenida Sete de Setembro, por exemplo, que não é uma ‘rua secundária’, tem ambulantes perto do hospital Marieta, no centro, e perto do supermercado Xande, no bairro Fazenda. Na Fazenda, pelo menos um deles fica sobre o passeio de pedestres.

Mesmo com esses descumprimentos das regras, o povo da prefeitura garante que fiscaliza e que cai em cima de quem trampa sem alvará. “A fiscalização sempre atua, na primeira abordagem, em caráter orientativo: o ambulante deve retirar-se do local onde estiver realizando as vendas e entrar com pedido de viabilidade para alvará de Ambulante”, afirma Soraya. Quem não obedece, tem os produtos apreendidos e leva multa.

Se alguém questionar na justiça, licença pode melar

Pro advogado Luiz Fernando Osawa, doutor em direito, mestre em gestão de políticas públicas e professor universitário, a presença de ambulantes pelas ruas e praças da cidade pode se transformar num problema jurídico. “Via de regra esses espaços não podem ser utilizados como fonte de lucratividade por entes privados”, alerta.

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Mas, tem percebido, geralmente há uma tolerância das prefeituras para pequenos empreendedores, como pipoqueiros, doceiros ou vendedores de balões, por exemplo. “Muito embora tal tolerância possa vir a ser questionada por aquele que não concordar”, observa. Ou seja, se alguém denunciar ao ministério Público ou acionar a justiça, o bicho pega tanto pra prefeitura quanto pro ambulante.

O que pode acontecer, explica o doutor Luiz Fernando, é a prefeitura conceder licença esporádica e temporária para ambulantes em casos de festas populares ou grandes eventos públicos.

Tipo os mercadores que montam barraquinhas no encontro dos Gidões, em Camboriú, ou na festa junina do São João, em Itajaí. Ponto. Além disso, a lei não deveria prever a liberação de alvarás. “A ocupação sistemática de ente privado no espaço público para fins lucrativos não é republicana. Montar negócio sobre espaço público não é permitido”, reforça.

Comércio ambulante é diferente de quiosques montados em praças, explica o advogado. Nesse segundo caso, a legislação permite. “As construções públicas como quiosques são edificações que pertencem à municipalidade, que podem ser concedidas mediante seleção pública”, completa Luiz Fernando. É o caso dos quiosques na avenida Atlântica em Balneário Camboriú, por exemplo, cuja ocupação foi feita através de uma concorrência.

Já as beiradas de ruas e praças são espaços de uso público constante e, por isso, a lei não permite sua ocupação por um tempo maior para que se monte algum empreendimento econômico. “Sobre espaço público não há consolidação de direitos, direitos adquiridos ou usucapião, por exemplo”, diz o doutor em direito.

Pra urbanista, comércio de rua dá vida às ruas e praças

Não é com muita frequência, mas vez por outra o itajaiense Marcelo Reiser, 50 anos, pinta na praça da Beira Rio. “Vou levar o filho e sobrinhos pra curtir a pista de skate”, conta. Como usuário daquele espaço público, não vê problema nenhum na presença dos ambulantes por lá. “Prefiro isso ao invés de algo fixo como uma lanchonete”, afirma.

É fácil entender a lógica de Marcelo. “Depois fica difícil de tirar, a exemplo do camelódromo”, completa. Ele é mais um que lembra da ocupação da praça Arno Bauer por comerciantes, que durante quase 30 anos tomaram conta do grande espaço entre o calçadão da rua Hercílio Luz e a rua Gil Stein Ferreira, atrás do museu, no centro.

São opiniões como a de Marcelo que reforçam uma tese informal do jovem arquiteto e urbanista Murilo Trevizol, 23. “O ponto principal da discussão é que a lei tem que se adaptar aos acontecimentos e ao contexto da sociedade”, diz.

Mesmo reforçando a interpretação do advogado Luiz Fernando Ozawa de que pode haver problemas legais com a liberação de alvarás para ambulantes, ele defende a permanência dos pequenos comerciantes em praças e ruas. “Estas atividades não têm como parar de ocorrer, por mais que a legislação não permita”, completa.

O urbanista sabe que há um outro lado da moeda. “Os lojistas se sentem prejudicados por terem que pagar alto para manter seus negócios, além de que a fiscalização é falha em muitos casos”, alfineta.

Mas, defende, os ambulantes ajudam a dar vida aos espaços públicos. “Nos países europeus, nos estados americanos e em muitos outros locais se vê este tipo de atividade. Elas podem ser um potencial para a vivência das cidades”, avalia.

Alvará custa só R$ 179

No entorno da Beira Rio, no bairro Fazenda, os alvarás já estariam trancados. Ou seja, não entra mais ninguém. “Aqui já tem a tapioca, tem o pastel, tem o cachorro quente, tem o churros, tem o caldo de cana e tem a pipoca”, lista dona Maria José, que trabalha no carrinho Cantinho do Pastel, que pertence à enteada.

Ela conta que aos domingos estava vindo um ambulante de Camboriú vender churros ao lado da praça Genésio Miranda Lins, sem ter licença. Os pequenos comerciantes teriam feito a denúncia à fiscalização da prefeitura. “Acho que eles vieram ver, porque nesse domingo que passou ele (o vendedor de churros sem alvará) já não tava mais”, conta.

Qualquer pessoa pode fazer o pedido pra trabalhar como comerciante de rua em Itajaí. Mas tem que solicitar licença na secretaria Municipal de Urbanismo. “É preciso ter alvará de ambulante”, reafirma Soraya Silva, da secretaria de Comunicação.

O documento até que não é caro. “Quando emitido como autônomo o valor é de R$ 179,” informa Soraya. Quem é microempreendedor individual (o tal do MEI), não paga o primeiro alvará. Dona Maria José diz que a enteada pagou bem mais caro pra poder trampar na beira rio. Uns R$ 700.

Ontem, quando o DIARINHO pediu pra fotografar dona Maria José com os alvarás, pra mostrar que o negócio tá legalizado, ela disse que a papelada tava com a enteada. Pelas regras da prefeitura, tanto o alvará de funcionamento quanto o alvará da vigilância sanitária devem estar expostos pro público.

Mas o que pode vender pelas ruas? Melhor é perguntar o que não se pode vender. “Aguardente ou quaisquer bebidas alcoólicas; armas e munições; fumos, charutos, cigarros ou outros artigos para fumantes; gasolina, querosene ou substâncias inflamáveis ou explosivas; carnes e vísceras; quaisquer artigos que ofereçam perigo à saúde e à segurança públicas”, lista Soraya.

Bicicletas ocupam espaços públicos

Oferecer serviços também é possível pelas ruas de Itajaí. É caso do microempreendedor individual Luiz Belmiro, 56. E ele faz uma coisa legal: aluga bicicletas e um quadriciclo a pedal pro povão, bem pertinho da praça Genésio Miranda Lins, na Beira Rio.

É justamente o uso da praça pelas bikes do microempreendedor individual que deixa o leitor Christian Werner Neumann intrigado. “É permitido esse empresário usar as ciclovias e ele pode usar a praça e a Beira Rio pra explorar seu negócio como ponto de estacionamento e locação?”, questiona.

Luiz aluga um espaço particular na esquina da rua Jorge Tzaschel com a Onze de Junho. É por lá que na maioria das vezes ficam suas zicas e bicicletas de quatro rodas. O povo loca as magrelas e sai andando pelas ciclovias da Beira Rio e também da praça. “Nós estamos de acordo com o código de trânsito. Aquilo ali é uma multipista. As ciclovias não são só para bikes”, argumenta. Mas admite: “Às vezes deixo os quadriciclos na pracinha, pois fica mais prático”.

Soraya Silva, da prefeitura, argumenta que Luiz tá dentro da lei, já que as ciclovias que têm na Beira Rio e na praça são pra uso de zicas, quadriciclos, skates e rollers. Mas, afirma, se ele botar os quadriciclos pra alugar em cima da praça, comete uma irregularidade.




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