A relação entre o abuso de ivermectina e surtos de sarna já foi estudada em 2021, apontando para o desenvolvimento de uma “super-resistência” do ácaro responsável pela sarna a partir do uso excessivo do remédio.
Em Balneário Camboriú, a prefeitura diz que o surto está restrito ao ambiente das creches, onde houve transmissão entre alunos e funcionários. A secretaria de Saúde orienta que as pessoas que identificarem qualquer alteração na pele devem procurar imediatamente um posto de saúde.
A cidade já registrou 41 casos de sarna humana em duas creches. Foram 36 casos no Núcleo de Educação Infantil (NEI) Sementes do Amanhã, no bairro dos Municípios, sendo 33 em crianças e três em funcionárias. Inicialmente, foram 10 casos na creche, que voltou às aulas, mas suspendeu de novo as atividades após novos casos. Outros cinco casos foram no NEI Rio das Ostras, no São Judas Tadeu, afetando quatro alunos e um funcionário.
As aulas nas unidades foram suspensas para serviços de higienização e dedetização. As aulas só voltam na próxima segunda-feira, dia 24.
A médica infectologista Rosalie Knoll comentou que pode haver resistência do parasita responsável pela sarna com o uso do remédio, mas ressalta que seria preciso fazer testes pra verificar a situação.
Mesmo já passada a pandemia, quando a ivermectina se popularizou e foi usada por conta própria pelas pessoas, com indicação do então presidente Jair Bolsonaro (PL), o tempo não seria fator de influência. “O tempo não é importante numa resistência a medicamento, mas sim o uso abusivo. O mesmo pode ser pensado para a azitromicina, que foi usada como água”, comentou Rosalie, lembrando outro remédio do “kit covid”.
No mesmo kit também estavam a cloroquina e a hidroxicloroquina. Em 2021, o próprio Ministério da Saúde confirmou em documento para a CPI da Covid que os remédios não mostraram nenhum benefício para pacientes infectados com coronavírus. No mesmo ano, pesquisa do Núcleo de Estudos em Farmacologia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) apontou relação entre surtos de sarna na região de Recife (PE) com o uso indiscriminado de ivermectina.
“O uso irracional de medicamentos é um problema de saúde pública, porém, no caso de antibióticos, antiparasitários e antifúngicos, esse problema ganha proporções maiores. Quando utilizamos de forma irracional/incorreta medicamentos, como a ivermectina, corremos o risco de induzir a resistência do parasita ao medicamento que deveria tratar a doença causada por ele”, comentou na época a professora e pesquisadora Sabrina Neves.
De lá pra cá, surtos de sarna já ocorreram em várias cidade do país, como em Garulhos e Praia Grande (SP), e em Estrela (RS). A doença não tem monitoramento específico, sendo apenas recomendável – sem obrigatoriedade – que os municípios informem ocorrências de surtos ao Ministério da Saúde.
Doença é transmitida por ácaro em locais e objetos com pouca higiene
A sarna humana ou escabiose é causada pelo ácaro sarcoptes scabiei, transmitido pelo contato direto e prolongado com uma pessoa infectada ou pelo uso de roupas e objetos contaminados. Segundo o Instituto Butantan, a fecundação do ácaro ocorre na superfície da pele, onde a fêmea penetra para depositar os ovos que, quando abrem, liberam as larvas e provocam coceira intensa.
O instituto destaca que locais onde há aglomeração de pessoas sem acesso à higiene adequada são propícios aos surtos de sarna. Coceira e feridas na pele são os sintomas iniciais, mas se não tratadas, elas podem causar complicações infecciosas ou infecções secundárias por bactérias.
O tratamento é com remédio aplicado diretamente na pele, pelos e cabelo, ou uso de medicamentos orais receitados por um médico. A prevenção envolve evitar contato com pessoas e roupas contaminadas. "Se a escabiose for detectada, todos que tiveram contato com o infectado devem ser examinados e tratados para interromper a cadeia de transmissão”, informa o Butantan.