risco de extinção
Proibição de captura de raia e outras espécies pode gerar prejuízo de R$ 60 milhões ao ano
Proibição vale a partir de 6 de setembro; são seis espécies de peixes vetadas, a mais importante é a raia-carimbada
Redação DIARINHO [editores@diarinho.com.br]





A atualização da lista de espécies ameaçadas de extinção, lançada em portaria do Ministério do Meio Ambiente em junho, mobiliza o setor pesqueiro e lideranças políticas no estado para que o documento seja revisto. Nesta semana, audiência pública na Assembleia Legislativa decidiu que os deputados vão votar moção ao Congresso Nacional, ao ICMBio e à Secretaria Nacional da Pesca pedindo a suspensão da inclusão de parte das espécies na lista.
O encaminhamento foi após debate da comissão de Turismo e Meio Ambiente, presidido pelo deputado Ivan Naatz (PL), com a participação de representantes do setor pesqueiro, entidades e órgãos ambientais. O pedido para revisão de lista, após aprovado em plenário, deverá também ser levado ao Fórum Parlamentar Catarinense, para que senadores e deputados federais reforcem o movimento.
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Para representantes da pesca, a atualização da lista pelo governo federal foi feita sem aviso prévio e não definiu um cronograma para que as empresas e pescadores se adequem à medida, levando apenas à proibição da captura e comercialização das espécies consideradas em risco. Pela portaria, a captura de peixes ameaçados de extinção – são mais de 400 na lista - será passível de punição a partir do dia 6 de setembro.
De acordo com o Sindicato dos Armadores e das Indústrias de Pesca de Itajaí e Região (Sindipi), a nova lista incluiu seis espécies de peixes. O caso mais preocupante é o da raia-carimbada, por movimentar as indústrias da região e gerar renda aos pescadores. As espécies de raias representam cerca de 10% de todo o pescado exportado de Santa Catarina e 70% delas são raia-carimbada. O estado exporta cerca de 1 mil toneladas de tipos de raias por ano, movimentando milhões de dólares.
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O impacto ao setor, no entanto, não se restringe às novas espécies incluídas. O oceanógrafo da coordenadoria técnica do Sindipi, Luiz Carlos Matsuda, que apresentou dados técnicos na audiência, aponta que após oitos anos da última atualização, em 2014, cerca de 50 recursos pesqueiros do país ainda seguem na lista, sem haver políticas públicas de gestão de estoque. “De forma conservadora, o impacto desta portaria é estimado em R$ 60 milhões/ano, considerando apenas as embarcações associadas ao Sindipi. Se considerarmos todas as embarcações de Santa Catarina e do resto do país, essa cifra é infinitamente maior. Sem contar ainda o impacto na pesca artesanal”, informa.
Gestão pra recuperação de estoque
Todas as espécies que entram na lista de ameaçadas ficam proibidas de captura e venda, conforme prevê a lei de crimes ambientais. Se capturadas, elas devem ser descartadas no mar. O entendimento do sindicato é de que a lista deveria nortear estratégias de gestão, mas fica restrita às proibições, sem diálogo com o setor.
Na audiência na Alesc, o oceanógrafo do Sindipi lembrou que a gestão para recuperação do estoque nunca foi feita, apesar de prevista em portarias há quase 10 anos. “Do jeito que está não se resolve o problema ambiental, porque muitas espécies ainda são capturadas e lançadas ao mar, nem o problema social e nem o econômico, porque simplesmente proibir não é uma medida eficaz de gestão”, analisa.
Diante da falta de estudos para avaliar a abundância das espécies, o Sindipi desenvolve em parceria com a Univali uma pesquisa com observadores científicos a bordo das embarcações industriais de Santa Catarina. O trabalho vai registrar a quantidade capturada, mas que é descartada no mar porque não pode ser trazida para terra.
Esses registros vão gerar dados sobre os estoques pesqueiros. Segundo o sindicato, a principal informação para elaborar a lista de peixes ameaçados é obtida dos desembarques pesqueiros, mas não há pesquisas no mar com barcos científicos.
Lista é ferramenta para ordenamento que não avança no país, diz pesquisador
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O professor da Univali Roberto Wahlich, pesquisador do projeto de monitoramento da atividade pesqueira em Santa Catarina, destaca que a lista do Brasil segue a metodologia da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN), utilizada pela maior parte dos países que atualizam suas listas periodicamente.
“A lista é um medidor para avaliar a situação das espécies. Ela não é feita com a intenção de proibir a pesca, mas para direcionar políticas públicas”, frisa. Roberto explica que a lista em si não proíbe a captura, mas está vinculada à lei de crimes ambientais, que diz que as espécies classificadas como em risco de extinção não podem ser capturadas.
Com base nos graus de ameaças indicados pela lista, o professor comenta que o governo poderia dar mais atenção a determinadas espécies, fazendo o ordenamento e trabalhando para que esses animais saiam da lista. Ele observa, porém, que no Brasil esse trabalho não avança porque a proibição não vem acompanhada de políticas públicas.
Para avanços na gestão pesqueira, o pesquisador aponta que a necessidade de pesquisas pelo poder público e mais projetos como o do Sindipi com a Univali. “Hoje, a grande dificuldade é ter informações dessas espécies”, considera. Os estudos também permitiriam uma atualização mais frequente da lista. As últimas no Brasil foram em 2004, 2014 e agora em 2022, com a promessa do governo federal em renovar a listagem anualmente.
O setor pesqueiro aponta melhorias para o próprio entendimento da lista, que traz apenas os nomes científicos das espécies. A proposta é de que haja indicação do nome comum das espécies pelo qual os pescadores conhecem o peixe, o que facilitaria o cumprimento da norma.
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Coleta de dados norteia a lista
A analista ambiental do ICMbio Roberta Aguiar dos Santos explicou na audiência que a lista é elaborada após um processo de avaliação de coleta de dados, inclusive com a participação de pescadores artesanais e industriais. Ela reconheceu a falta de mais dados públicos.
“Desde 2007 não temos o monitoramento adequado, com todas as informações necessárias. As que temos vêm de universidades, da estatística pesqueira oficial, das entrevistas com pescadores. O instituto compila tudo, com vários pesquisadores”, disse.
A lista leva em conta o tempo de vida de cada espécie, de forma que quanto mais lento é o tempo de reposição, mais crítica é a situação populacional e mais necessidade há de preservar a espécie.
“Essa lista não está aí à toa, é para saber o que fazer para garantir que a pesca possa ser feita no futuro”, defendeu Roberta. Ela considerou, porém, que só proibir não resolve o problema, sendo necessário mais ações além da lista.
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"A lista é apenas o sintoma da doença”
Roberto Wahlich
Pesquisador do projeto de monitoramento da atividade pesqueira em Santa Catarina