ITAJAÍ
Pai de filho autista acusa motorista de aplicativo de racismo
Caso ocorreu durante uma corrida em Itajaí na última sexta-feira; vítimas estavam saido da AMA
Franciele Marcon [fran@diarinho.com.br]

Um homem negro, de 40 anos, e o filho autista, de 10 anos, passaram por momentos constrangedores na sexta-feira, ao solicitarem um Uber na saída da associação de Pais e Amigos do Autista de Itajaí (Ama Itajaí). O motorista de aplicativo começou a ser grosseiro porque o homem não era o titular da conta que solicitou a corrida para pai e filho, após o atendimento na associação. Quem fez a solicitação foi a secretária da associação.
Segundo o pai do garoto contou à reportagem do DIARINHO, ele estava com dificuldade para chamar o Uber do seu celular. A secretária da Ama fez a gentileza de solicitar a corrida do telefone dela. O transporte era da rua Herculano Corrêa, no centro, até o loteamento São Pedro, na Itaipava.
“Ela chamou e logo informou o valor. Aceitei o valor e finalizamos o pedido. A chegada do motorista tinha uma previsão de quatro minutos, nos despedimos e aguardamos na frente da associação. Assim que avistei o veículo, confirmei a placa, e levantei o braço para que o motorista notasse que estávamos na calçada”, contou.
O motorista abriu o vidro do carona e perguntou se ele era fulana de tal. O senhor respondeu que não era, mas que a corrida tinha sido solicitada por eles. “Ele resmungou algo que não entendi. Meu filho embarcou pelo lado direito, do passageiro, e eu embarquei logo em seguida. Sem que falássemos algo, ele começou a falar que ao solicitar transporte para terceiro, o solicitante tem que informar para quem é o serviço, porque poderiam ter roubado o cartão ou até ser assalto”, narra o pai da criança.
O homem começou a ficar incomodado com a reclamação do motorista e interviu. “O senhor está falando isso porque somos negros. Se fossem dois homens brancos, na calçada, solicitando seus serviços, a conversa seria diferente...”, acusou.
O motorista tentou voltar atrás e alegar que o pai da criança estava ´levando para o outro lado´. “Eu falei para meu filho vir junto comigo, pois não iríamos mais naquele carro e o motorista, irritado, disse que o carro tinha câmera e ele iria cancelar a corrida. Respondi a ele que poderia cancelar, ao invés de reclamar ao passageiro. O correto seria ele abrir uma reclamação para quem faz a gestão do aplicativo”, opinou o homem.
Pai e filho retornaram à recepção da Ama e informaram o que tinha acontecido. A secretária cancelou a corrida. “Voltei no tempo com tudo aquilo, lembrei de quando esse preconceito separava as pessoas: você é negro não pode comprar, não pode morar, não pode usar... Infelizmente, meu filho autista presenciou essa atitude preconceituosa desse motorista. Não vou generalizar, sei que há pessoas boas, mas não esperava vivenciar esse fato triste nos tempos de hoje”, desabafa.
Pai e filho foram, a pé, até o terminal de ônibus. Eles pegaram o transporte coletivo público até a Itaipava. A família não registrou o boletim de ocorrência contra o motorista de aplicativo, mas decidiu tornar o caso público para evitar que outras pessoas passem por este constrangimento. “Ele não disse 'vocês são negros e não irei atendê-los', mas o jeito que ele falou, o contexto, deixa bem explícito o ato de racismo. Gostaria que olhassem para o próximo e entendessem que não vou julgar por cor ou pelo dinheiro, diferença social, religiosa ou por opiniões contrárias...”, analisa o pai.
Associação acompanha
A família é atendida pela Ama desde julho deste ano. Alexandra Rodrigues, presidente da Ama de Itajaí, reforça que faz parte das atribuições da associação ajudar as famílias com o transporte. “Sempre que solicitado, as pessoas que estão na recepção chamam do celular delas mesmo ou do telefone da Ama. O transporte é uma necessidade muito grande das famílias atendidas pela associação”, explica.
A presidente revela que nunca tinha tido problema com os motoristas de aplicativos. Além do constrangimento sofrido pelo pai e filho, Alexandra lembra que a situação de estresse vivida pode afetar emocionalmente a criança autista.
A Ama irá colocar à disposição da família um advogado voluntário para entender o caso e orientar a família caso queira ingressar com alguma ação.
Continua depois da publicidade
Uber não tolera racismo
Em nota, a Uber diz que não tolera qualquer forma de discriminação. A empresa pede que, nos casos em que usuários sentirem que o tratamento não foi respeitoso, ou que desrespeitou os termos da lei, é importante que o usuário reporte os incidentes à Uber, através do aplicativo. “Sabemos que o preconceito, infelizmente, permeia a nossa sociedade e que cabe a todos nós combatê-lo. Como parte desses esforços, a Uber lançou, por exemplo, o podcast Fala Parceiro de Respeito, com conteúdos educativos sobre racismo”, explica. Além disso, a empresa revisou o processo de atendimento na plataforma, a fim de facilitar as denúncias de racismo e acolher melhor o relato das vítimas.
“Nada justifica qualquer atitude discriminatória, mas de acordo com os Termos e Condições de uso da Uber as contas de usuários são pessoais e não podem ser emprestadas a outras pessoas ou utilizadas para chamar viagens para terceiros”, informou ainda a empresa.