Itajaí

UMA VOLTA PELAS AMÉRICAS

Velejador parte de Itajaí para uma viagem solitária de três anos e mais de 42 mil quilômetros

Aos 68 anos, Elio viajará sozinho em um veleiro de apenas 12 metros
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Marcone Tavella, especial para o DIARINHO No último sábado, Elio Somaschini se lançou ao mar para virar um ponto no oceano. Partiu pouco antes do meio-dia da Marina de Itajaí a bordo do veleiro Crapun rumo ao Norte, em uma aventura que ele próprio afirma ser difícil concluir com vida. Aos 68 anos, o ítalo-brasileiro pretende dar a volta à América. Uma viagem solitária de três anos, passando pela Groelândia, Estreito de Bering, Alasca, Cabo Horn, dentre outros lugares remotos do mundo com tempestades apocalípticas, geleiras móveis e afiadas, onde a presença humana se confunde a natureza selvagem. O feito raro não é inédito. Em 2012, o americano Matt Rutherford, a quem Elio ironicamente classifica como louco, completou o percurso de 42.600 quilômetros em um barco a vela de 27 pés (oito metros), sem tocar em solo, em um total de 309 dias. A família do rapaz, que então tinha 31 anos, chegou a celebrar uma missa de corpo ausente depois que perdeu contato com o velejador. Pois o tal louco é um dos consultores de Somaschini, que conta ainda com um anjo da guarda particular. Victor Wejer, um senhor de 65 anos e que por 50 trabalhou com prospecção de petróleo no Ártico a ponto de conhecer as baleias pelo nome. “Posso dizer que estou bem de amigos. O Vic contribuiu para a elaboração de cartas náuticas precisas da região e topou me auxiliar por dois meses. A cada seis horas enviarei minhas coordenadas e ele vai me dar informações sobre gelo, tempestade e o que posso fazer para me safar”, contou. Elio também estará amparado pela Marinha do Canadá. A reportagem subiu ao Crapun e conversou com o velejador na última terça-feira, dia 4, entre telefonemas de despedida e os últimos reparos na embarcação de 40 pés (12 metros), um Beneteau First. Trancado oito meses Após carimbar o passaporte em Natal (RN), o velejador vai desembarcar nos EUA. É que diferente do americano Rutherford, Somaschini fará paradas estratégicas, como em Newport (EUA) e Rhode Island, quase na fronteira com o Canadá. “Tenho que esperar por oito meses lá até o inverno passar, que é quando as geleiras diminuem e os canais se abrem para que eu possa contornar pelo extremo norte da América e cruzar o Estreito de Bering, entre EUA e Rússia”, explicou à reportagem. A Nortwest Passage, ou Passagem Noroeste, é na visão dele o grande desafio da viagem. Trata-se de uma via marítima composta por uma sequência de canais margeados e minados por icebergs e que fazem a ligação do Atlântico com o Pacífico. Em alguns pontos, como no Estreito de Ballot, o velejador ítalo-brasileiro terá poucos dias para atravessar, aproveitando o degelo e um novo congelamento da água. Embora repleta de riscos, engana-se quem precipitadamente classifica a missão como suicida. “Venho me preparando nos últimos cinco anos para isto. É muito estudo envolvido. Todo inverno vou até o Canadá para aprender estratégias de sobrevivência, resistência, os diferentes tipos de gelo, a rota em si e até a construção de iglu”, enumerou o físico, formado pela Unicamp. Perguntado sobre como pretende lidar com a solidão, o velejador sorri. “Não me sinto só no mar. Barco, água, peixes, pássaros, vento. Tudo se comunica de alguma forma comigo. No mar não estou sozinho. Sinto mais solidão caminhando pelas ruas de São Paulo”. “Eu tinha sede de conhecer o mundo, novas culturas” Elio Somaschini é certamente um homem do mar. Sua casa é o Crapun desde 2006, quando partiu em uma viagem de sete anos ao redor do mundo. A experiência resultou no livro “O que sobra de uma viagem: histórias de um velejador em solitário”, lançado em 2016 pela editora Grafar. A aventura foi a realização de um sonho. “Eu tinha sede de conhecer o mundo, novas culturas. Não me contento em navegar. Gosto de descer, caminhar, desbravar, fazer amigos. É o que me move em uma viagem”, contou. Explorando o Mar Mediterrâneo, no norte da África, Somaschini não só desembarcou e andou pelas cidades litorâneas, como comprou um dromedário e viajou dias pelo deserto. Na Polinésia Francesa, no Oceano Pacífico, conheceu um discípulo do famoso velejador Mau Pailug, dono de uma frase que mudaria para sempre sua relação com a vela. “Cada ilha tem sua estrela. Ele disse. Fiquei com aquilo na cabeça. Dias depois, nas Bermudas, uma tempestade queimou todo meu sistema. Naveguei por horas sem qualquer controle de direção. Lembrei do que tinha dito o amigo, olhei para cima e passei a me guiar pelas constelações”, disse o físico, que a partir daquele dia desenvolveu um método próprio de velejar. Em seu rastro deixado pelos mares do mundo, Somaschini cruzou 15 vezes o Atlântico e pelo menos cinco o Pacífico. Milhas e milhas proporcionadas por um hobby que virou profissão. É que apesar de ter feito carreira no ramo das comunicações, sua principal fonte de renda atual também é a navegação. Com o título inglês de skipper, ele frequentemente é contratado por seguradoras para transportar veleiros em viagens continentais entre fornecedor e comprador. A relação do homem com a vela começou em 1978, quando o ítalo-brasileiro foi apresentado ao windsurfe. “Na minha primeira competição, fiquei tão em último lugar na regata que o juiz da prova encerrou sem que eu cruzasse a linha final”, lembrou. Depois de colecionar prêmios em disputas nas mais diferentes categorias da vela, no início dos anos 2000 o velejador decidiu se aposentar dos torneios. “Estou mais para superar meus limites. Competir é você contra outros. Prefiro competir comigo mesmo,” disse. Quando o Polo Norte é a Disneylândia Elio Somaschini fala com um fascínio juvenil sobre o Ártico. O rosto marcado pelo sol se abre em um sorriso quando compartilha algum conhecimento sobre a região. “Sabia que a Rússia e os EUA estão separados por apenas cinco quilômetros?”, indagou em determinado momento da entrevista. “É uma loucura imaginar que os ursos polares podem nadar até 200 quilômetros. Duzentos quilômetros!”, exclamou em outro trecho. A Passagem Noroeste virou uma obsessão em 2012, quando ainda estava em seu giro pelo globo a bordo do Crapun. “Veja que o Cabo Horn, considerado perigoso, de tempestades constantes, ondulações que chegam a nove metros de altura e de poderosos vendavais, foi vencido ainda no século 17. A Nortwest Passage só foi feita em 1905, pelo Roald Amundsen”, destacou. Na gélida rota entre a Groelândia e o Alasca, a rotina do ítalo-brasileiro será de pouco sono, intercalando sete horas acordado com três dormindo, interrompidas por alarmes a cada 20 minutos para averiguações ligeiras da situação. A ausência da noite durante os dois meses que ele estima levar para fazer o percurso deve ser um desgaste a mais. Entretanto, Somaschini quer tirar proveito da claridade ininterrupta. “Pretendo observar as baleias belugas, espécie que está em extinção, e também os narvais. São animais fantásticos”, descreveu. A relação de afeto com a vida marinha é tamanha que o velejador não pesca. As refeições no Crapun se resumem a frutas, legumes, cereais e, como se espera de um italiano, pasta. “No Canadá sou obrigado a ter uma espingarda a bordo por determinação da Marinha deles, por causa dos ursos. Espero não encontrar com nenhum muito faminto,” disse. Navegando entre a sobrevivência e a contemplação, Somaschini é aguardado na Marina Itajaí para o primeiro semestre de 2020, quando estará com 71 anos e o título de homem mais velho a completar a volta nas Américas. “Aí eu posso descansar, comprar uma casinha de pedra na Ilha das Flores, nos Açores, onde as casas são separadas por hortênsias e as portas não possuem fechaduras”. Bons ventos ao capitão Nascido em 1949, em Seregno, norte da Itália, Somaschini veio ao Brasil com 11 anos de idade. Teve sua formação acadêmica em física, na Unicamp, e dedicou boa parte da vida ao ensino em várias universidades e cursinhos, tendo inclusive realizado trabalhos na Universidade de Roma (Itália). Ao longo da vida, teve um casal de filhos, “que já estão muito bem encaminhados”. Sobre a paixão por aventuras, o velejador reconhece: “eles aturam”. De 1986 a 2002 foi empresário nas áreas de comunicações e tecnologia. Antes disso, em 1999, adquiriu o Crapun, seu companheiro de aventuras. Depois de rodar o mundo, em 2015 abriu o Café do Capitão, em Bombinhas (SC), que tem como especialidade risotos e polpetone. Foi no estabelecimento que Elio reuniu amigos para uma despedida oficial regada a vinho no final de junho. Na manhã do último sábado, uma porção deles estavam na Marina Itajaí para dar um “até logo” e desejar bons ventos ao capitão. [kaltura-widget uiconfid="23448188" entryid="0_3nko0dcb" responsive="true" hoveringControls="true" width="100%" height="56.25%" /]




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