Não foi o caso da contadora Fabiana da Silva, 37 anos. Quando a pequena Luiza Helena nasceu, há nove anos, Fabiana percebeu que havia algo errado nos olhos da filha. Ela não tinha o olhar fixo e procurava sempre olhar em direção à luz, conta. Encasquetada, disse isso ao pediatra quando tinha apenas dois meses de vida. Na hora o médico viu e explicou que a pequena tinha catarata congênita. Eu percebi que a íris era clara, mas achei que ela teria o olho claro, como meu outro filho, explica Fabiana. O pediatra explicou que o bebê teria de fazer uma cirurgia até o terceiro mês de vida.
A notícia deixou a família atordoada, mas Fabiana diz que, até então, não entendia a gravidade da doença, que pode deixar sequelas graves ou até cegar os pequerruchos. Luiza foi operada 14 dias depois. A família procurou um centro de referência em Curitiba e desembolsou R$ 6 mil.
Cinco dias depois da cirurgia, a pequena Luiza fez a consulta de retorno e já recebeu os primeiros óculos. Eram quase duas lupas, com 30 graus em cada lente. Mesmo com a catarata e a necessidade precoce do uso de óculos, Fabiana conta que a filha não teve nenhum atraso no desenvolvimento. Ela é atenta, inteligente e faz as mesmas atividades desenvolvidas por qualquer criança da idade dela. Hoje, Luiza Helena tem nove anos e usa óculos com 24 graus. Ela foi apresentando dor de cabeça, por isso os médicos foram diminuindo aos poucos, conta a mãe.
Quando a menina for mais velha, ela deve voltar à mesa de cirurgia para implantar o cristalino do olho, parte onde a catarata se instala e que foi retirada na primeira operação. Depois disso, a expectativa é que ele deixe de usar óculos.
O caso de Luiza Helena é raro. O mais comum é ver crianças com óculos a partir dos sete anos de idade, quando começa a alfabetização. E aí que os pequenos forçam mais a visão, tornando os problemas perceptíveis. Foi o que aconteceu com Isadora Machado da Silva, 7. Ela começou a reclamar muito de dor de cabeça. Levamos ao pediatra, e ele recomendou levá-la a um oftalmologista, explica a mãe da menina, a professora Christiane da Silva, 39.
Primeiro, ela levou a pequena num otorrinolaringologista, que analisou a hipótese de sinusite. Depois, foi num oftalmo, o qual descartou a necessidade do uso dos óculos. Por fim, foi a um neurologista, que disse que a menina não tinha nada. Teimosa, procurou outro oftalmologista e não deu outra: a pequena Isadora tinha deficiência de dois graus em cada olho. O primeiro médico mal a examinou, lasca. A menina começou a usar óculos há cerca de dois meses e até curtiu a novidade.
Na escola, eu ainda esqueço. Quando tenho dor de cabeça, eu me lembro e coloco os óculos, conta a pequena. A mãe confirma que as dores de cabeça quase sumiram, e a família encarou na boa a mudança no visual da menina.
Número de crianças consultadas por oftalmologistas no SUS peixeiro aumentou 67% em um ano
O número de crianças consultadas por oftalmologistas do SUS em Itajaí aumentou. Em 2008, 1487 pequerruchos foram consultados. Já em 2011 foram 3189 pirralhos e, neste ano, até o mês de setembro, o número de pequerruchos que passaram pelo médico dos zoio já chegou a 4281.
De acordo com a secretaria da Saúde, o motivo do aumento é o trabalho das equipes de estratégia de saúde da família, que percorrem os colégios aplicando os testes básicos de visão na pirralhada. Caso seja detectado o problema, é mandado um bilhete aos pais para que procurem a unidade de saúde mais próxima, explica Juliana Righetto, assessora de imprensa da secretaria. A city peixeira tem, atualmente, três médicos especialistas em zoio.
Para consultar um especialista, a família precisa procurar o postinho de saúde, pegar a ficha de manhã cedinho e passar por um clínico geral, que vai encaminhar para a consulta com um especialista. O tempo de espera é de cerca de três meses.
No começo do ano passado, a administradora Kátia Binder, 43, notou algo diferente com o filho, Madson Roberto Pereira Filho, na época com seis anos. Vi que tinha alguma coisa errada, porque na hora de fazer a tarefa ele encostava a cara no papel pra escrever, conta. A mulher não perdeu tempo: pagou consulta com um especialista. Madson foi diagnosticado com miopia e hoje usa óculos com 1,5 grau em cada olho. Ficamos chateados. Fiquei com medo de que ele sofresse bullying na escola, mas nada disso aconteceu. Ele até se acha bonito e charmoso de óculos, diz.
Segundo a mãe, o moleque é baita responsável e não tira os óculos para nada. Brinca no parque, faz educação física, tudo de óculos, conta. Mas nem sempre foi assim. No começo, mesmo se achando lindinho com o novo apetrecho, ele esquecia de colocar os óculos e ficava enjoado.
Para alívio da família, o problema não é grave e pode ser resolvido quando ele tiver 21 anos, através de uma cirurgia. Até lá, o grau aumenta um pouco a cada seis meses. A médica explicou que pode fazer a cirurgia, mas tem que esperar até os 21 anos, conta.
O oftalmologista Felipe Eing diz que aumentou o número de crianças usando óculos porque os pais descobrem cada vez mais cedo os problemas. Isso porque precocemente os pequenos forçam a visão com o uso frequente de computadores e equipamentos eletrônicos. Ele explica que a exposição aos computadores por si só não causa o problema, mas exige mais dos pequenos, deixando os problemas já existentes mais evidentes. O especialista alerta para que haja um descanso de 10 minutos para cada hora de leitura ou de brincadeira em frente aos eletrônicos.
Felipe conta que os pequerruchos só têm a visão igual a de um adulto a partir dos quatro anos e que o recomendado é que os pais levem os filhos ao oftalmologista a partir dos dois anos, quando o anjinho já consegue interagir melhor.
Depois dos sete anos, a parte neurosensorial não se desenvolve e o paciente fica com o problema o resto da vida, explica o médico. Ele cita como exemplo uma criança que tenha problema em apenas um dos olhos. O olho que não for corrigido antes dos sete anos acaba não se desenvolvendo, e a solução é o uso de lentes corretivas.
Lions oferece óculos digrátis
O Lions Clube Itajaí tem como uma das principais ações a doação de óculos de grau para crianças carentes. O programa começou há seis anos e atende, em média, 100 pequerruchos por ano. O bancário aposentado Miguel dos Santos, 81, é quem coordena o programa. Ele conta que a prioridade é ajudar pequenos que frequentam o ensino fundamental em escolas públicas.
Essa seria uma tarefa para o governo fazer. Como não acontece, acabamos fazendo, lasca. Miguel explica que o pessoal do clube vai às escolas mais afastadas e conversa com professores e coordenadores sobre crianças que têm dificuldade de aprendizado ou que já passaram pela consulta, mas não conseguiram adquirir os óculos.
Já tivemos caso de criança de 12 anos com 17,5 e 17 graus nos olhos. Como conseguiria estudar?, conta. Miguel fala que, depois que os óculos são fornecidos, o maior problema é conseguir a consulta de retorno para a criança.
Ele avisa que os pais com dificuldade em comprar os óculos podem entrar em contato e pedir uma forcinha pelo telefone (47) 3344-4247. Claro que a gente conversa antes, pra saber se a pessoa realmente tem necessidade, mas isso é feito de coração, porque o Lions é feito de pessoas que estão imbuídas com o intuito de auxiliar. O nosso lema é servir, finaliza.