Deivid, que estava internado na capital e foi transferido do hospital Celso Ramos para o Marieta, recebeu a visita dos dois companheiros sobreviventes. A visita foi entre lágrimas e abraços apertados.
No reencontro, Deivid, ainda acamado e se recuperando das mais de 48 horas à deriva no mar gelado, também desabafou lamentando que possivelmente Alisson da Silva Santos e Diego Silva de Brito, os dois pescadores ainda desaparecidos, estejam mortos.
Deivid e Domingos são amigos de infância de Curuçá, no interior do Pará. Foi Domingos que indicou Deivid para trabalhar embarcado no Safadi Seif. “Eu arranjei o trabalho e se ele morresse, eu ia me culpar. Essa era a minha preocupação, eu ficava pensando nisso...”, falou, emocionado, no vídeo. Deivid estava morando há um mês dentro da embarcação e sofreu o naufrágio na primeira saída para alto mar.
Domingos e os colegas Zoel, Mário Gomes Soares, Djalma dos Santos da Silva e Luiz Carlos Messias foram resgatados de uma balsa inflável. O grupo foi o primeiro a ser resgatado, na noite de sábado. Já Deivid, Alisson e Diego se jogaram no mar assim que o Safadi deu sinais de naufrágio. Eles se separaram do outro grupo que esperou o último momento para abandonar o barco que estava naufragando. Deivid acredita que sobreviveu porque se enrolou em dois salva-vidas ao se jogar no mar. Os dois pescadores que estavam com ele sumiram.
Deivid foi localizado na noite de domingo, boiando, sozinho, com desidratação e hipotermia. Além de sobreviver ao frio, fome, sede e ao mar revolto, Deivid teve que passar uma madrugada no corredor do hospital Celso Ramos aguardando um leito para internação ao ser hospitalizado.
Durante a visita no hospital, os amigos compartilharam vídeos nas redes sociais e narraram momentos que viveram em alto-mar. “O barco começou a estalar e eu fui ver o que era, porque eu sou o motorista. O porão não estava cheio de água, mas de repente eu olho e estava enchendo”, contou Domingos.
Foi Domingos quem pegou coletes salva-vidas e jogou para os colegas. Ele não vestiu o item de segurança porque tentava pegar os documentos em uma bolsa. “A gente esperou até o último... Quando não deu mais, falei vamos embora, mas eles ainda não queriam sair. Quando eles viram eu sair, vieram atrás”, revela. “Eu peguei uma boia, enrolei na minha mão. Chamei o Zoel e falei para pegar a boia. Ele se agarrou e ficou. O cozinheiro boiou, ficou ali. O mestre, Djalma, também apareceu”, completa Domingos.
Como Djalma contou, a balsa salva-vidas não abriu imediatamente, e eles tiveram que fazer o procedimento manualmente. “Abrimos o lacre, s a corda e entramos. Apitamos e chamamos, mas o vento estava forte e o mar o agitado. A gente não pode ficar perto do barco, porque o casco ia furar a boia. Nós soltamos o barco, o vento estava a mil por hora e nos levou para cada vez longe. Eles [Deivid, Alisson e Diego] ficaram na água Eles pularam antes e não nos achamos mais”, narra.
Gritos desesperados
Já Deivid relembrou os momentos de pânico ao lado de Alisson e Diego – antes dos companheiros desaparececerem. “Estava escuro e foi pelo grito. Diego se apavorou e ficava gritando pelo primo dele. Eu falava: 'Diego, te acalma'. O Alisson também gritava pelo Djalma. Eu falava: ´calma, eles vão ficar bem´. Eu fui acalmando até eles pararem de gritar. Só que a maré foi afastando. Não conseguimos alcançar o barco”, revela.
No tempo que ficaram à deriva, os três encontraram dois suprimentos que caíram do barco, uma caixa de leite e um refrigerante. “No escuro, eu bati em uma caixinha de leite e bebemos para saciar a sede. Nas costas do Alisson bateu uma garrafa de Coca-cola...”, conta.
Com o passar das horas, e o mar cada vez agitado, os três foram se distanciando. Deivid lembra a última vez que viu os dois colegas boiando. “Eles estavam inchados. Tudo branco..”, narra emocionado.
"Sinais" pra retornarem
Deivid falou ainda do que entendeu como "sinais" ignorados que seriam para abandonar a pescaria e voltar para terra firme antes da tragédia acontecer. “Duda [Domingos] você lembra do fogo na sala de máquina? Explodiu a bateria...Isso porque Deus queria que a gente voltasse antes de arriar o material... Mas fazer o que, Deus quis assim. Estamos aqui, vamos ser os mesmos amigos e mais agarrado ainda”, desabafou.
O encontro entre Deivid, Domingos e Zoel no hospital terminou quando uma enfermeira interrompeu o relato e levou o paciente para uma tomografia.
Buscas continuam
A Marinha do Brasil informou que prosseguem as buscas aos pescadores desaparecidos na noite dessa terça-feira. A embarcação Safadi Seif segue emborcada e parcialmente submersa entre a costa de Florianópolis e Garopaba. “Cabe ressaltar que a responsabilidade para retirada do casco é do proprietário/armador, o qual foi notificado para realizar a ação brevemente”, informou a Marinha. O inquérito administrativo da Capitania dos Portos tem 90 dias para apurar as causas e as responsabilidades pelo naufrágio.