Itajaí
Confundiu boi-de-mamão com o demônio
Painel grafitado em muro na praça da Cultura mostrava figuras do folclore catarina
Redação DIARINHO [editores@diarinho.com.br]

Uma possível ignorância sobre a cultura do litoral catarinense, recheada com uma boa dose de intolerância religiosa, foram responsáveis pela destruição de uma das mais bonitas obras de arte de rua de Balneário Camboriú. Por ordem do síndico do edifício Mariner, da avenida Atlântica, que teria confundido personagens do boi-de-mamão com figuras demoníacas, o painel grafitado na praça da Cultura, nos fundos do prédio, foi apagado com tinta branca. Não bastasse isso, no primeiro dia do estrago da obra, ainda foi escrita a palavra “Jesus”. Ontem, já não havia mais resquícios da obra de autoria do artista Diego José Koraleski, o Diant, 32 anos. A interferência no painel começou na terça-feira à tarde, informa Bia Mattar, diretora da fundação Municipal de Cultura da prefeitura. Foi nesse primeiro dia que o responsável pela destruição da obra escreveu “Jesus” sobre o que achava ser um monte de imagens representativas do ‘mal’. Bia contou ao DIARINHO que há cerca de dois meses recebeu uma ligação de Antônio Carlos, o síndico do Mariner. “Eu gostaria que vocês viessem pintar porque não quero mais”, teria dito o síndico. “Para ele, aquilo era uma pixação do demônio”, lembra a diretora da fundação Cultural. Com paciência, Bia tentou explicar que aquilo não era pixação e sim grafite e que as figuras eram personagens do folguedo de boi-de-mamão, do folclore catarinense. Informou, por exemplo, que uma das figuras não era um bode (representação do demônio para os cristãos) e sim a cabrinha do folguedo. Mas de nada adiantou. Como o grafite é de responsabilidade do artista e havia autorização do condomínio do Mariner para a execução, assinada e registrada em cartório em 2015, Bia sugeriu que Antônio Carlos procurasse Diant. O que não teria acontecido. No começo da tarde de terça-feira, começou a destruição. No primeiro dia, metade do painel foi tapado com uma tinta branca. O nome “Jesus” também foi pintado sobre a obra. Ontem, todo o muro foi pintado e, assim como a figura bíblica Jesus, o mural morreu vítima da injustiça e da intolerância. O síndico do Mariner destruiu uma obra de arte que custou aos cofres públicos R$ 25 mil: recursos da lei de Incentivo à Cultura, por meio do edital LIC 2015. A execução aconteceu no ano seguinte. “É uma pena para a cultura” Ao DIARINHO, Diant diz que esta não é a primeira vez que obras suas são apagadas. “É uma pena para a cultura”, lamentou. O artista ainda estava abismado com a possibilidade do ato ter sido uma intolerância religiosa. “Não diz os mandamentos que é para ‘amar o próximo’? Pra mim não foi amor que ele fez com a cultura, com a cidade, comigo”, alfinetou. Antônio Carlos não quis falar com a reportagem.