Investigação do MP
Empresários e agentes públicos seriam os financiadores de bloqueios em rodovias
Relatório do Ministério Público aponta que um grupo de 12 pessoas organizou e financiou os atos contra as eleições
Redação DIARINHO [editores@diarinho.com.br]
Ao menos 12 empresários e agentes públicos, incluindo políticos de Santa Catarina, teriam organizado e financiado os bloqueios em rodovias do estado durante as manifestações antidemocráticas contra o resultado das eleições.
O levantamento está em relatório do Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) entregue pelo procurador-geral, Fernando Comin, ao ministro Alexandre de Moraes, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nesta semana.
O relatório é sigiloso e os nomes dos envolvidos não foram divulgados para não prejudicar a continuidade das investigações.
O documento será juntado ao processo da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 519, que corre no STF. A apuração está rastreando os suspeitos e busca identificar o “fluxo financeiro” que financiou os bloqueios.
Também estiveram na reunião com o ministro os procuradores-gerais do Ministério Público de São Paulo, Mário Sarrubbo, e do Espírito Santo, Luciana Andrade.
“Há uma grande organização criminosa com funções pré-definidas, financiadores, arrecadadores, como é de conhecimento público, tem vários números de pix”, afirmou o procurador-geral de Justiça de São Paulo, durante uma entrevista coletiva.
Segundo Sarrubbo, a participação de empresários está por trás das manifestações. Ele informou que as procuradorias já identificaram um grande fluxo de transações financeiras, como aluguéis de banheiros e transferências por pix. As operações indicariam que as ações seriam organizadas pelo país todo.
“Os movimentos são interestaduais, muito parecidos em todo o Brasil. Os bloqueios nas estradas, uma vez desfeitos, iam para outros trechos. Há algo em nível nacional, e os MPs vão trabalhar, junto ao TSE, para que o Brasil prossiga sem golpe ou qualquer movimento que atente contra a democracia”, declarou.
Matéria jornalística cita Luciano Hang entre organizadores
Reportagem da Agência Pública apurou que Luciano Hang e outros empresários catarinenses, como Emílio Dalçóquio, conhecido por incentivar a greve de caminhoneiros em 2018, tiveram ativa participação nas manifestações golpistas que ocorrem no estado desde 30 de outubro.
Um documento da Polícia Rodoviária Federal (PRF) a que a reportagem teve acesso aponta que caminhões a serviço das lojas Havan foram enviados para os bloqueios. O relatório registra que na manhã do dia 31 de outubro a Havan e a Transben Transportes, empresa do cunhado de Hang, “haviam deslocado veículos de carga até a manifestação no km 83 e estavam presentes de forma organizada”.
O bloqueio em questão foi na BR-101, na altura de Barra Velha, com protesto em frente ao posto Maiochi, perto do centro de distribuição das lojas Havan e de uma das filiais da Transben.
Em nota, Hang reafirmou que não tem participação em qualquer ato realizado nos últimos dias. “Desde o dia 30 de outubro, Hang tem se dedicado exclusivamente às suas atividades empresariais”, diz o esclarecimento. “Tanto é mentira a matéria publicada que a própria empresa responsável por todo o transporte de cargas da Havan mantém suas atividades normais, tendo inclusive documentos para comprovar”, informou.
A nota ressalta que centenas de caminhões, de frota terceirizada, saem todos os dias do centro de distribuição de Barra Velha. “O caminhão citado em reportagem havia se envolvido em um acidente indo parar no canteiro lateral da rodovia e ficando atolado, fato também comprovado pelas autoridades competentes”, finalizou.
Pagamento de comida e até de banheiros químicos
Em Santa Catarina, conforme o procurador-geral Fernando Comin, o grupo de financiadores ofereceu estrutura logística, de alimentação e banheiros químicos para os manifestantes. Os empresários atuariam nos bastidores, estimulando lideranças de caminhoneiros e da população em geral a promoverem os atos golpistas. No estado, cerca de 70 bloqueios fecharam rodovias na semana passada.
Entre as lideranças identificadas está um vereador. O relatório aponta apenas a atuação dos empresários e agentes políticos em Santa Catarina, mas eles teriam ligação com outros financiadores por todo o país.
Mesmo com o fim de bloqueios, a investigação segue para apurar os movimentos que ainda trancavam vias urbanas com atos em frente a quartéis e batalhões militares. Conforme os procuradores, o financiamento permite a permanência de grupos nos atos dentro das cidades.
Além do financiamento, a apuração quer saber de onde partiram as ordens às ações coordenadas das manifestações. De acordo com o MP, não está confirmada se a origem seria em Santa Catarina, mas o relatório indica ramificações no estado com algumas lideranças já identificadas.
O procurador-geral reforçou a preocupação com a violência praticada contra forças de segurança, a presença de crianças e idosos nos protestos. Ele considerou o movimento antidemocrático, “porque não são pacíficos, impedem o direito de ir e vir e atentam contra a democracia”.
Manifestação segue na Marinha de Itajaí; trânsito foi liberado
Em Itajaí, os manifestantes seguem com um acampamento montado no trecho da avenida Paulo Bauer, em frente à delegacia da Capitania dos Portos em Itajaí e ao lado do Mercado Público municipal. Eles agora ocupam o passeio público.
A Polícia Militar informou que o trânsito no local está desbloqueado desde a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que ordenou a liberação de vias públicas. Segundo o batalhão, a manifestação não interrompe mais o trânsito.
Nesta semana, o Mercado recebe atrações culturais. A Fundação Cultural enviou ofícios às autoridades cobrando a realização e a segurança dos eventos. Na quarta-feira, houve a comemoração em memória dos 60 anos do poeta itajaiense Bento Nascimento, e no fim de semana, entre quinta-feira e sábado, rola o Mercado Blues Festival.
Os documentos da fundação foram enviados à Secretaria Municipal de Segurança, Guarda Municipal, Codetran, Procuradoria-geral e polícias Militar e Civil. Os ofícios pediram providências e que sejam mantidas a segurança e a ordem no local.
No estado, o MPSC pediu via ofício que a Polícia Militar cumprisse ordens judiciais para liberar vias públicas bloqueadas por manifestantes.
A PM respondeu o ofício do MP, na quarta-feira à noite, sobre a obrigação de desobstrução da via. O MP informou que a resposta da corporação está sendo analisada.
A orientação do MP à população é que, ao se deparar com ruas bloqueadas por manifestantes, acionem a PM ou a Guarda Municipal para a desobstrução da rua. O telefone de emergência da PM é 190, o da GM é 153.