Olho nas orlas
Câmara acaba com o laudêmio e aprova cessão de áreas de marinha
Projeto permite a transferência gratuita das terras para estados e municípios e a venda para particulares; PEC vai ao senado
Redação DIARINHO [editores@diarinho.com.br]
Imóveis em terras de marinha na região serão diretamente impactados pela Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que foi aprovada na Câmara dos Deputados nessa terça-feira. A mudança retira da União a propriedade exclusiva sobre áreas de marinha, permitindo a transferência gratuita das terras para estados e municípios e também a venda para particulares. A medida ainda acabará com o laudêmio e taxas de foro e ocupação das áreas.
A proposta tramitava desde 2011 e foi aprovada por 389 votos favoráveis e 91 contrários, no segundo turno. Agora, o projeto segue para o Senado e aguarda ser colocado em votação. Na Câmara federal, entre os 16 deputados federais catarinenses, apenas Pedro Uczai (PT) votou contra. As bancadas do PT, Psol, PSB e Rede defendiam que a votação fosse retirada de pauta.
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“Estamos falando de uma proposição que levará à privatização de parte da orla brasileira, sem haver qualquer tipo de consideração no que diz respeito ao meio ambiente”, disse a deputada federal pelo Distrito Federal Erika Kokay, líder do PT na Câmara.
Para o deputado federal catarinense Rogério Peninha (MDB), favorável à proposta, a nova legislação vai impactar grande parte dos municípios de Santa Catarina, auxiliando na regularização dos terrenos. “A legislação, que incide sobre estes terrenos, e a instituição das taxas aconteceu há mais de 150 anos em uma realidade que já não cabe mais atualmente”, avalia.
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Peninha considera que, durante esse período, municípios de variados tamanhos cresceram ao longo da costa nos terrenos de marinha, caso de muitas cidades do litoral catarinense, sendo necessário atualizar a legislação.
“Além das altas taxas que têm que ser pagas pelos moradores, há muitas dificuldades em implantar determinadas políticas públicas nas terras da União. Regularizar vai proporcionar uma situação juridicamente mais segura”, defende.
Propriedades da União, os terrenos de marinha são aqueles que ficam na faixa litorânea de 33 metros contados a partir da linha do preamar-médio (maré alta), conforme medição em 1831. Também entram na classificação ilhas, margens de rios e lagoas que sofrem influência de marés.
Se a PEC passar a valer, a União não será mais a única dona das terras. Para estados e municípios, a proposta prevê transferência gratuita de imóveis, onde estejam instalados serviços estaduais ou municipais, mesmo sob concessão. A gratuidade ainda valerá no caso de uso para habitação de interesse social, como vilas de pescadores.
Ficariam nas mãos da União apenas áreas não ocupadas, as de unidades ambientais federais e as de serviço público federal, inclusive, para uso de concessionárias, como no caso de portos e unidades de conservação do patrimônio histórico.
Regras de transferência para particulares
A transferência para particulares será mediante compra, devendo ser concluída pela União em até dois anos de vigência da nova regra. As pessoas que ocupam ou têm posse de terras de marinha precisam estar regularmente inscritas junto à Secretaria de Patrimônio da União (SPU) para adquirir, definitivamente, o imóvel.
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Elas poderão deduzir do valor a pagar o que já foi pago como taxa de ocupação ou de foro nos últimos cinco anos, atualizado pelos juros da Selic. Para ocupantes não inscritos na SPU, a compra do terreno só poderá ser feita se a ocupação ocorreu, no mínimo, cinco anos antes da nova emenda e mediante comprovação de boa-fé.
Na votação na Câmara, foram derrubadas as propostas que proibiam a compra com desconto equivalente às últimas taxas pagas e por ocupantes irregulares. De acordo com o governo federal, são cerca de 500 mil imóveis classificados como terrenos de marinha no Brasil, dos quais 271 mil têm registros em nomes de pessoas ou empresas.
Na região da Amfri, são 22.199 imóveis cadastrados como área de marinha, sendo a maior parte em Balneário Camboriú (15.674). No estado, são cerca de 50 mil imóveis registrados. Parte dessas áreas já está sendo ofertada pela União em programa de venda de imóveis públicos do governo federal lançado em 2021.
O presidente da Câmara, deputado Arthur Lira (PP/AL), destacou, durante a votação da PEC, que a nova emenda não trará perdas à União e que o fim do laudêmio representa um avanço. Ele ressaltou que as mudanças não afetam florestas e áreas de preservação, apenas terrenos já ocupados em áreas urbanas.
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Terras de marinha são da época de invasões
O conceito de terreno de marinha vem desde o Brasil colonial, para garantir a proteção do território contra invasões estrangeiras. A legislação atual está amparada no decreto-lei 9.760, de 1946, que regulamentou a demarcação dos terrenos pela medição da maré, em 1831, quando as taxas sobre as terras começaram a ser cobradas.
Com a vigência da nova PEC, as cobranças não poderão mais ser feitas pela União. Hoje, são três taxas previstas para quem ocupa ou tem posse de terras de marinha. A taxa de ocupação varia de 2% a 5% do valor do terreno, sendo cobrada devido ao uso do bem público.
Já a taxa de foro – 0,6% do valor do imóvel - é cobrada de áreas do chamado regime de aforamento, quando a pessoa detém a posse da área, sendo dona de 83% da propriedade e a União, 17%.
Essas duas taxas são anuais, enquanto que o laudêmio, percentual de 5% do valor do imóvel, é cobrado quando há negociação da área para outra pessoa, sendo uma espécie de ITBI para terras de marinha.
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Como votaram os deputados federais de SC:
Angela Amin (PP): Sim
Carlos Chiodini (MDB): Sim
Carmen Zanotto (Cidadania): Sim
Caroline de Toni (União): Sim
Celso Maldaner (MDB): Sim
Coronel Armando (União): Sim
Daniel Freitas (União): Sim
Darci de Matos (PSD): Sim
Fabio Schiochet (União): Sim
Geovania de Sá (PSDB): Sim
Gilson Marques (Novo): Sim
Hélio Costa (Republicanos): Sim
Pedro Uczai (PT): Não
Ricardo Guidi (PSD): Sim
Rodrigo Coelho (Podemos): Sim
Rogério Peninha (MDB): Sim