Itajaí
Entidades são contra decreto que prevê separação de alunos deficientes
AMA e OAB de Itajaí repudiam a mudança e engrossam movimento contrário. Diretora de escola vê a medida como um retrocesso
Redação DIARINHO [editores@diarinho.com.br]



O decreto presidencial que prevê a separação de alunos com deficiência nas escolas provocou críticas de entidades e órgãos públicos pelo país afora e também repercute negativamente na região. A associação dos Pais e Amigos dos Autistas (AMA) de Itajaí e a subseção da OAB Itajaí divulgaram uma nota de repúdio contra a mudança, considerando a medida um retrocesso na educação inclusiva.
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O decreto muda a política Nacional de Educação Especial e incentiva a criação de salas e escolas especiais para crianças com deficiências e transtornos de desenvolvimento, como o autismo e a superdotação. A resolução não é obrigatória para os municípios, mas vem sendo criticada por ser discriminatória e abrir brechas para que as escolas particulares não aceitem alunos especiais.
Em nota de repúdio, a presidente da AMA Itajaí, Alexandra Rodrigues, destacou que a entidade recebeu manifestações de insatisfação por porte dos autistas, pais e famílias e que é contra qualquer movimento que prejudique o livre acesso e a permanência da pessoa com deficiência em escolas regulares.
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“Não apoiamos movimentos que possam ter interpretação, técnica ou educativa, errônea sobre as formas de inclusão ou possibilidades de escolas especiais e exclusivas, que possam interferir no desenvolvimento pessoal, social e emocional das pessoas com transtorno do Espectro Autista (TEA)”, diz.
Na manifestação, a entidade considera que o direito à educação é irrevogável e que a nova política de educação especial não representa a luta pela inclusão e pode provocar a perda de avanços conquistados ao longo de mais de 10 anos. A AMA Itajaí oferece atendimento terapêutico, oficinas de música, grupos de mães e de conscientização e divulgação do autismo.
Alexandra informa que são quase 500 famílias cadastradas e que não concordam com a separação. “Nossos filhos precisam ser compreendidos, precisam de adequações, mas somos a favor da inclusão e sabemos que nossos autistas têm condições e devem permanecer no ensino regular”, defende. Ela ainda frisa que a convivência com crianças com deficiência ajuda no desenvolvimento das demais crianças.
Discussão no conselho
Uma comissão foi formada ontem junto ao conselho Municipal da Criança e do Adolescente (CMDCA) de Itajaí, que ainda vai discutir o assunto pra definir uma posição. Alguns conselheiros, que atuam com educação especial, estão mobilizados contra as possíveis mudanças. O decreto deve ser debatido pelo conselho numa próxima reunião.
Ainda em Itajaí, a AMA encaminhou a nota de repúdio à assembleia Legislativa. O objetivo é buscar forças junto a outras instituições pra barrar o decreto. Em Balneário Camboriú, o assunto foi discutido ontem pela secretaria de Educação. “A secretaria está realizando um estudo cuidadoso. Ajustes são necessários e faremos o que for preciso para melhorar os serviços que oferecemos. Respeitamos a inclusão acima de tudo e nossa maior preocupação é o atendimento adequado e de acordo com a real necessidade de cada aluno”, diz, em nota, a secretaria.
Decreto desrespeita convenção internacional, segundo OAB
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A OAB de Itajaí também ser manifestou contrária ao decreto federal. Para a entidade, a mudança traz graves retrocessos na defesa da educação inclusiva, explicando que o decreto também desrespeita a convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência e a lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).
Segundo a OAB, é direito dos estudantes com deficiência, transtornos do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação receberem educação escolar na rede regular de ensino. Pelo novo decreto, esses alunos poderiam ser atendidos em salas separadas das outras turmas ou mesmo em escolas exclusivas.
“Não é pertinente que os alunos público-alvo da Educação Especial sejam separados nem privados de convívio com outros alunos, já que é confirmado que se aprende em coletividade. A inclusão significa um modo de convivência sem distinções, sem discriminações e em um ambiente de fraternidade,” diz o documento assinado pelo presidente da entidade, Renato Felipe de Souza.
Retrocesso de décadas, alerta educadora
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Reconhecida por projetos de inclusão entre alunos, Melania Horst, diretora da escola Quintal Mágico, no bairro Ariribá, em Balneário Camboriú, afirma que o decreto representa um atraso de 50 anos na educação. Ela destaca que é preciso aprofundar as discussões sobre o ensino especial mas que as mudanças não podem ser impostas.
“Não sou contra as escolas especiais, que precisam de uma atenção maior com as escolas regulares,” avalia. Para Melania, as escolas precisam se integrar e trocar informações, “construindo pontes” para o aprendizado e desenvolvimento das crianças.
A diretora considera que o tempo da criança com deficiência na escola regular pode ser diferente por diversas condições, mas que separar não é o caminho. Ao mesmo tempo Melania defende que se deve equipar melhor as escolas e entidades como as Amas e Apaes.
No Quintal Mágico, 15% dos alunos – cerca de 40 crianças – são especiais, atendidas dentro da proposta de educação inclusiva. As atividades, eventos e oficinas integram todos os alunos. As crianças contam com apoio de especialistas pra ajudar em questões emocionais e de aprofundamento da socialização e aprendizagem.
Desde a publicação do decreto, Melanie relata que os pais demonstraram preocupação com as mudanças. Diante dos movimentos contrários, ela acredita que os municípios não devem aderir à nova política. “Balneário e Itajaí avançaram muito na educação pra voltar atrás”, completa.
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Conforme a OAB, diversos órgãos estão mobilizados para que o decreto seja revisado ou revogado, incluindo a comissão Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, do Conselho Federal da OAB, que instaurou um procedimento administrativo para evitar o retrocesso de direitos. O decreto também é questionado pelo ministério Público do Trabalho (MPT).