Itajaí
Bromélia é vilã ou injustiçada?
Estudo da Fiocruz diz que as bromélias não têm papel importante na proliferação do mosquito da dengue. DIARINHO ouviu especialistas contra e a favor da planta, que foi dizimada na maioria das cidades da região
Redação DIARINHO [editores@diarinho.com.br]
Maikeli Alves
Especial para o DIARINHO
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No auge da epidemia de casos de dengue em 2015, Itajaí passou a eliminar todos os possíveis recipientes que poderiam acumular água, inclusive as bromélias consideradas responsáveis por ajudar a proliferar o mosquito Aedes Aegypti. Por orientação da Secretaria Estadual de Saúde, até hoje muita gente teve que abrir mão da planta e foi obrigada a retirá-la de casa.
No entanto, alguns especialistas contestam essa posição e defendem que as bromélias não trazem riscos. Para engenheira agrônoma e professora da Univali, Dalva Sofia Schuch, a planta é injustiçada, pois existem diversos estudos que comprovam que ela não ajuda a proliferar o Aedes. Não adianta tirar a bromélia da cidade, se nossas florestas e morrarias estão cheias delas. Acredito que é um problema muito mais de saneamento e de conscientização das pessoas com o cuidado com sua casa e o descarte de resíduos do que da bromélia. Lixo em terrenos baldios e entulho são os maiores focos, afirma.
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De acordo com Dalva, na água que se acumula no copinho da planta existe uma enorme biodiversidade de algas, bactérias e fungos microscópicos, o que a torna um ambiente pouco propício para a fêmea do mosquito colocar seus ovos. A bromélia também é muito visitada por sapos e pássaros que acabam se alimentando dessas larvas. Existe toda uma cadeia biológica em seu entorno, explica.
A agrônoma relata que a Univali também precisou retirar as bromélias do campus mesmo argumentando contra. As plantas foram levadas para o Parque da Atalaia, onde ficarão em seu habitat natural. Segundo Dalva, a retirada da bromélia do meio urbano é questionável. Fiz um levantamento de várias pesquisas que dizem que a planta não prolifera o mosquito. Alguém tinha que levar a culpa e na dúvida acabam retirando a planta, pontua.
Dalva ressalta ainda que existe muita desinformação em relação ao que fazer com a planta. A especialista argumenta que é um crime pôr água sanitária na bromélia, porque isso vai matá-la. Para ela, uma estratégia mais natural é diluir borra de café e colocar no copinho onde é acumulada água. Também há desconhecimento do que é uma bromélia. Já vi arrancarem todas as plantas de uma vizinha, que não eram bromélias, mas uma outra espécie, observa.
Estudo diz que bromélias não proliferam o mosquito
Um estudo do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), em 2007, apontou que, em parques e encostas de morros, as bromélias não têm papel importante na proliferação do mosquito da dengue. A pesquisa foi desenvolvida durante um ano pelo biólogo Marcio Mocelin. Ele avaliou 156 bromélias no Jardim Botânico do Rio de Janeiro e concluiu que apenas 0,07% de um total de 2816 larvas ou pupas coletadas nas plantas correspondiam ao Aedes Aegypti e 0,18% ao Aedes Albopictus (transmissor da febre Chikungunya).
Conforme o estudo, a prevalência de espécies como o Culex (pernilongo) nas bromélias indica que a invasão do vetor da dengue neste espaço não deve ser simples, já que teria que competir com insetos mais adaptados ao ambiente. A pesquisa reforçou ainda que a prevenção da doença deve ser voltada aos focos principais, como caixas dáguas destampadas, tonéis, piscinas e outros depósitos com água parada.
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Orientação da Secretaria de Saúde vai contra pesquisa
Apesar da Fiocruz ser ligada ao Ministério da Saúde, as orientações para prevenção da dengue são contrárias ao que apontou o estudo. O coordenador do Programa de Combate à Dengue em Itajaí, Lúcio Vieira, observa que a Secretaria Estadual de Saúde pediu que se mantenha o cuidado com as bromélias. Não é o local preferencial para o mosquito colocar os ovos, mas já encontramos focos positivos em bromélias, argumenta.
Vieira diz que conhece o estudo da Fiocruz, mas acredita que as condições são outras quando a bromélia está na zona urbana. Quando se tira da mata e coloca a planta em casa ela se torna mais um criadouro. Se o mosquito não tiver outro ponto para colocar seus ovos, ele vai colocar na bromélia, avalia.
O infectologista e professor da Univali, Pablo Sebastian Velho, afirma que a questão das bromélias é controversa e que é preciso considerar que o país está perdendo a luta contra o mosquito, com o surgimento de doenças mais graves que a dengue. O criadouro evoluiu de forma favorável para o mosquito. Uma vez sabíamos que ele precisava de certa quantidade de água limpa e pouca incidência de luz para colocar seus ovos. Porém, ele tem perdido essas preferências e agora basta qualquer estrutura que possa ter acúmulo de água. A maior parte dos focos ainda é em lixo, mas o mosquito mudou de comportamento, alerta.
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Focos reduzem no frio, mas combate continua
As ações de combate ao mosquito transmissor da dengue, chikungunya e zika vírus seguem em todos os municípios considerados infestados na região. Apesar da redução do número de focos positivos do Aedes Aegypti e de casos suspeitos no inverno, os ovos depositados são resistentes e podem sobreviver até 18 meses sem receber água.
Em Itajaí, o coordenador do Programa de Combate à Dengue, Lúcio Vieira, explica que os agentes de endemias estão reforçando o monitoramento no centro da cidade. O mosquito tem um desenvolvimento mais lento no inverno, mas ele continua ali. Por isso, estamos fazendo esse reforço no centro antes da primavera. Esse ano tivemos um surto de casos nessa área. Foram 31 pessoas contaminadas, o que nos preocupou, porque podem haver mais casos, relata.
As ações são voltadas, principalmente, para eliminação de criadouros. Segundo Vieira, neste ano a cidade conseguiu fazer o dever de casa no combate ao mosquito e reduziu muito o número de casos. Agora a gente consegue fazer o bloqueio quando o caso é notificado, diminuindo o risco de transmissão. Em 2015, não conseguimos fazer isso porque a equipe era pequena e foram muitos casos, pontua.
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Balneário Camboriú segunda cidade mais afetada pelos casos de dengue na região segue com as vistorias em residências, comércios e terrenos baldios. Somente nos cinco primeiros meses, os agentes fizeram 47.688 visitas em áreas de tratamento. No período, foram feitos ainda 1504 bloqueios após suspeitas e confirmações de casos da doença, além do monitoramento de armadilhas.
Os casos positivos de dengue fizeram com que Itapema também reforçasse a prevenção da doença no inverno, através de vistorias e eliminação de criadouros. Em junho, os agentes do município ainda receberam uma capacitação sobre como usar o atomizador portátil, uma espécie de bomba de veneno utilizada para eliminar o mosquito transmissor quando são confirmados casos. Com a qualificação, os agentes podem dar uma resposta mais rápida e precisa à população.
Os números
O último relatório da Diretoria de Vigilância Epidemiológica do Estado (DIVE) apontou 4306 casos confirmados de dengue em Santa Catarina em 2016, sendo 3951 autóctones, 260 importados e 95 em investigação. Neste ano, Itajaí registrou 69 casos contraídos na cidade, enquanto Balneário Camboriú teve 35 e Itapema 14.
Penha registrou ainda o primeiro caso de zika vírus contraído no município. A suspeita é que uma mulher, moradora do centro, possa ter contraído a doença do marido, que pegou zika em outro Estado, ou que o mosquito com o vírus tenha chego ao município através de cargas de caminhões. Isso porque no local onde a paciente mora não foram localizados focos. Ela recebeu acompanhamento e não corre riscos.
Além de Penha, as cidades de Balneário Camboriú (1), Camboriú (2) e Itajaí (1) tiveram casos importados de zika. A região também contabiliza casos importados de febre Chikungunya: foram seis em Itajaí, um em Balneário Piçarras e um em Penha.
Univali vai pesquisar plantas que podem curar ou controlar a dengue
A Univali, em parceria com o Laboratório Nacional de Biociências (LNBio) do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) e outros centros de pesquisa do país, tiveram proposta aprovada para a implantação de um Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT) focado em pesquisas para descoberta de medicamentos voltados para doenças negligenciadas, como a dengue.
A universidade receberá cerca de R$ 750 mil para a realização das pesquisas e ficará responsável pela bioprospecção de produtos naturais e substâncias sintéticas. O vice-reitor e pesquisador do Programa de Pós-graduação em Ciências Farmacêuticas da Univali, Valdir Cechinel Filho, explica que os estudos ainda não começaram, mas a ideia é investigar plantas para controle e cura dessas doenças. Além da dengue, a malária, doença de Chagas, doença do sono, leishmaniose visceral, filariose linfática e esquistossomose são exemplos de doenças negligenciadas.
Cuidados com o seu jardim:
-Elimine pratos de vasos com plantas. Se usar, coloque areia até a borda.
-Lave as bromélias ou plantas que acumulam água com a mangueira em jatos fortes duas vezes por semana para retirar a água que estava acumulada e que pode ter larvas do mosquito.
-Ao invés de usar água sanitária nas plantas, opte pela borra de café diluída. Ela também é eficaz na eliminação das larvas e não prejudica as plantas.
-Remova e limpe todo e qualquer reservatório de água inútil no jardim, como pneus, tampinhas, garrafas, vasos e pratinhos velhos.
-Mantenha o jardim limpo e lixeiras fechadas. Lixo e entulho atraem pragas, mosquitos e acabam com o visual.
-Guarde pratinhos, vasos e garrafas sempre com a boca para baixo.