Os episódios do dia a dia do Colégio interno nos tiravam da rotina imposta pelos horários rígidos e imutáveis. Havia dois dias de comida boa: dia de São Luiz Gonzaga e o dia de Santo Inácio de Loyola. Serviam galinha, o prato de festa da época. Nos demais dias o bife único e nervoso para cada um, arroz, feijão e salada. Nos domingos, carne de porco. Na mesa a moringa d’água e a farinheira de madeira. Na quaresma, muito ovo nas sexta-feiras e um tipo de suflê não identificado que chamávamos de amarelinho. Peixe, às vezes e durante uma época um negócio esquisito que se dizia carne de baleia. O café vinha adoçado, o pão feito no Colégio era bom, fatias fininhas de margarina e um musse de laranja que vinha durante o ano todo e que ficava tão duro que podíamos levantar o pote apenas espetando a ponta do garfo no dito cujo. O jornal mural da Congregação Mariana nos permitia algum tipo de protesto. Lá foram expostos o prego e o barbante encontrados no arroz, a lagartixa que saiu do bico do bule e objetos outros imersos no feijão. Como não tínhamos escolha, o remédio era comer e aprender a não ser “enjoados” como éramos em casa.
 
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Uma vez por ano tínhamos o Retiro Espiritual, na casa do Morro das Pedras. O “Tartaruga”, ônibus do colégio, nos levava. Embora não fosse permitido conversar durante os dias do Retiro, lá o quarto era para dois e a comida feita pela irmãs, muito melhor.
O Rogério Cancellier, organista, permitia que alguns tivessem acesso ao coro da capela nas missas diárias para estudar mais um pouco ou simplesmente dormir. Eu estudava piano e vez por outra arriscava alguma coisa na harmômica de pedal.
Como todos os chuveiros eram frios, muitos evitavam o banho. O dormitório depois de um tempo rescendia a suor e a chulé. Desodorante era raro. Havia os corajosos que no inverno ficavam fazendo exercícios em frente ao chuveiro aberto e então entravam de sopetão. Outros apenas fingiam o banho – ficavam em um canto do boxe, fora do alcance da água. Desses a gente sabia porque as portas tinham um vão aberto e por cima e por baixo. Daí enchíamos um balde d’água e jogávamos por cima. Houve um que no sábado não tinha tomado banho. Arrumou-se todo e começou a trocar a roupa de cama. Resolveu dar uma de fantasma com lençol. Foi seguro e levado assim enrolado para o chuveiro Apareceu com a testa cortada quando bateu na torneira. Não foi ninguém...
O Colégio tinha umas quatro banheiras em um pavilhão separado. Certos sábados o irmão acendia uma caldeira e formava-se a fila. A quantidade de água quente era mínima e quando acabava o tempo muito curto, o irmão esgotava a água pelo lado de fora. Na ânsia de aproveitarmos mais um pouquinho, colocávamos o calcanhar no ralo. Claro que ele conhecia o macete, pois tinha um arame de ponta afiada que enfiava de volta pelo cano....