Naqueles anos, cinquenta, o consumo obedecia às ofertas sazonais. Tangerina, laranja-açúcar, abacaxi, uva, só se encontravam na época de cada safra. Maçãs, todas argentinas, envoltas em papel de sede azul-escuro, só para quem estava doente. Chocolate, só na páscoa. As bolachas eram feitas em casa ou compradas em latas grandes mantidas bem fechadas e às quais as crianças não tinham acesso.
As vendas porta-a-porta eram comuns: a carroça de banana do “seu” Marcos Sedrez; a carroça de abacaxi; O “seu” Weiss de pele muito branca e olhos bem azuis vendia na sua carroça queijinho, nata, linguiça, carne de porco, vitela.
Carrinhos-de-mão passavam na rua vendendo peixe fresco sob uma cobertura de folhas de bananeira; outros, o aipim, o milho em espigas e um, especial na lembrança, cujo vendedor gritava: - “Piólha o fatotó!”que deciframos como: “E olha o fato e o mocotó”.
Nas feiras-livres se comprava a produção dos colonos vizinhos: Verduras, legumes, frutas, mel, queijos, morcilhas, linguiças... Realizada uma vez por semana, eu, como filho mais velho, acompanhava minha mãe para carregar as compras. Antes trazidas na bicicleta, minha vida melhorou com a chegada do “carrinho-de-feira”, metálico, de duas rodas, com prateleiras para evitar que as compras de cima amassassem as de baixo. Lembro-me de uma vez que a mãe comprou melado. Este, vinha, em garrafas fechadas com uma rolha de sabugo de milho. Quando chegamos em casa, a garrafa estava quase vazia e sem a rolha. Por todo o percurso, desenhava-se o rastro de um filete de melado.
De vez em quando “pintava” a notícia que uma venda localizava lá no fim do mundo, vendia mais barato. E lá íamos nós, de bicicleta. Lembro-me especialmente de uma, lá no final da rua Uruguai, que alcançávamos, cortando caminho por um pasto imenso atrás da Matriz, pois não existia a avenida Marcos Konder. O caminho era uma trilha de pouco mais de trinta centímetros de largura que subia e descia as ondulações do terreno. A ida era rápida, mas a volta com a bicicleta carregada de compras, era dureza.
Apareceu então o SAPS. Uma entidade, creio que governamental, vendia os produtos básicos a baixo preço. Ficava na rua Silva, nos fundos da Samarco. Levávamos uma lista de casa, dávamos o nosso nomes que era anotado no pé da lista, o que, para mim, era uma dificuldade: - “Homero!” eu dizia. – “O que? Romério? Roberto? Américo? O Mero?”- o que eu, depois de muitas vezes ter ficado roxo de vergonha, simplifiquei para – “Bruno!”. Depois da dita lista completa éramos chamados para pagar.
Muitos anos depois SAPS, já então COBAL, funcionou na esquina da rua Felipe Schmitd com a rua Samuel Heusi. Meu irmão número seis, o Léco, com a bicicleta atulhada de compras de bagageiro e penduradas no guidão, a encostou no muro do escritório da Navegação Ramos, bem em frente, onde meu pai trabalhava. Foi ao balcão, mandou-o chamar e disse, do alto dos seus noves anos: - “Vem aqui fora dar uma olhada na minha bicicleta! Eu aqui me matando e o senhor aí dentro, sentadinho, nesta moleza!”