
Coluna esquinas
Por Coluna esquinas -
Tirando poeira das ideias
Sou de uma geração com ideias corrompidas pelos métodos racionalistas que exigiam certa postura, escolhas fixas ou discursos prontos. Uma geração que nasceu sob a mão de ferro dos militares e bailando ao som da Tropicália. Ideia? Nunca faltou, o que faltou mesmo foi ar para respirarmos melhor naquele ar contaminado por chumbo e violência.
Como me safei desse impasse de vida? Criando um mundo em que eu pudesse acreditar. Um amigo nesse caminho, o filósofo Gilles Deleuze escreveu que não falta comunicação hoje, o que falta é criatividade para resistir ao que nos afoga, ao que nos mata como humanos. Quero acreditar em alguma coisa, senão sufoco.
A vida é necessariamente mudança. O que produz novos pensamentos é a pergunta.
A intensidade é necessária para mudar, é o pulso que nos indica vida. Produzimos caminho ao andar. Não há ponto final, apenas caminhos. De que importa o resultado se o caminho para chegar é o que reúne suores, sorrisos e batalhas?
Gosto de rascunhos na escrita, de livros rabiscados com brigas feitas na ponta do lápis, do inacabado, do imperfeito. Tudo em construção. Fazemos conexões o dia inteiro e...se essas conexões servirem para criar outros modos de estar no mundo?
Ahh leitores! Devem estar tentando entender onde irá chegar esse que lhes escreve. Se me permitem, hoje terão o desabafo desse colunista. Como diz uma música do tropicalista Caetano Veloso: gente é pra brilhar, não pra morrer de fome. Quero humanos à minha volta e não máquinas de produção ou possíveis eleitores ou futuros consumidores. Gente que teme, ri, fala, cria, grita, ama, arrota, sente...sente...sente.
Fome de ética! O mundo é negociação, perdemos o bom senso. Fome de intensidade! Eis princípio básico para que mudanças aconteçam. Fome de sensibilidade! Ouvimos porcarias saindo de telas como se nossos ouvidos fossem penicos. Fome de memória! Como esquecemos os que aprontaram poucas e boas para os brasileiros e ressurgem como os redentores da moral e dos bons costumes?
Como ficar impassível diante de comentários tristes que insistem em fórmulas gastas já testadas e reprovadas? Fome de ideias corajosas para dizer, fazer e assumir mesmo que as línguas ferinas da sociedade sejam o destino do seu voraz dizer.
Assumo minhas ideias na certeza de que o caminho é muito mais belo do que o produto final.
E, a tempo, é bom relembrar que os humanos enchem o espaço de palavras quando faltam ideias. Traduzido por meu velho pai: uma carroça vazia faz mais barulho.
Fica a dica:
O documentário Como o Cérebro Cria (The Creative Brain) (Ano 2019. Direção: Jennifer Beamish) toma como princípio que ser criativo não se trata de criar algo novo do zero, mas de repensar e ressignificar o que é trivial, o que já faz parte da nossa rotina de forma ordinária.