Coluna Animal Humano
Por Coluna Animal Humano -
A ponte
A ligação entre duas partes separadas, a ponte é em si, a própria conexão, a oportunidade de unir desunidos, de ampliar os limites e chegar mais além. Comparo a ponte e seus significados e belezas ao ser humano, em sua busca por sentido, por missão. Defendo que todos somos pontes, que atravessamos barreiras, que recebemos inspirações do outro lado, que relacionamos pessoas. Uma obra da engenharia divina que se lança para encurtar distâncias e tempos, destinada a encontrar a plenitude do outro lado, quando bastar a caminhada.
Quando enxergamos o outro e suas necessidades, que vão muito além das que costumamos passar, a ponto de não entender como podem viver com tão pouco, no limite de suas forças, nos limites da cidade, temos a oportunidade de conectar vidas muito diferentes, ensejando afetar o outro com nosso afeto a fim de que a dignidade do outro, do próximo, alcançada com a nossa ajuda, seja para nós um bom motivo para se viver pleno. Assim vivem os projetos sociais, as organizações sem fins lucrativos, que buscam atenuar uma desumanidade que são as condições mais precárias e difíceis que vivem uma boa parte da população, à margem da economia e das oportunidades de vida. Vivem como pontes, dando a oportunidade de dois mundos diferentes conviverem e aprenderem entre si os valores da vida.
No movimento pela educação chamado Multi irão, chamamos a atenção para o voluntário, um dos lados da ponte. Entendemos que quando este voluntário doa um pouco do seu tempo e seus talentos, para ensinar uma criança ou jovem do outro lado da ponte bem distante da realidade social que os separam, ele se completa, encontra novos sentidos para a vida, sente-se em paz com sua própria consciência, como se sua natureza fosse a de amar, a de cuidar do outro, para além dos nossos amigos e filhos, indo até onde mais se precisa e resgatando, um por um. É para ele, o voluntário, uma terapia, e chamamos isso de volunterapia. O conceito de quem é o assistido e quem é o assistente, muda. Inverte. Somos, os voluntários, os assistidos, somos nós quem sentimos o benefício de sermos úteis para alguém, para além das nossas relações. E as crianças e jovens que agradecem o apoio, a aula dada, o curso concluído, a lição bem feita com nossa ajuda, são os que nos assistem, com o carinho. Especialmente quando acompanhado de resultados, um jovem encaminhado para o emprego, uma criança que consegue ler melhor pois ganhou um óculos adequado, outra criança que ganha bolsa numa escola particular pois tem desempenho muito acima de média, outra é uma geniazinha do desenho, outro da poesia, um do basquete, outro do tênis... quantos talentos existem no ser humano? São os tantos de talentos que podemos ajudar a desenvolver nas comunidades, como pontes, entre a vida difícil e a oportunidade de voar.
Então, imagina um coletivo de amigos, uma organização social, onde em cada dia num horário um voluntário pode dar assistência nas matemáticas, outro nas ciências, outro nas artes, esportes, e assim até que todos os talentos possam ser ofertados, complementando com recursos materiais, uma reforma para uma família, um quarto para uma jovem, cestas básicas nutricionais para todos, brinquedos educativos não somente no dia 12 de outubro, chocolates não somente na Páscoa, e atenção não somente no Natal. Mas todos os dias. Em cada nascer do sol, raiar de dia, fim de tarde, a oportunidade de amar pela educação sendo dada, cada um com sua cota de responsabilidade.
O 1º setor, o setor público, não pode ser responsabilizado por todos os males sociais, o chamado 2º setor as empresas também não. A atividade de servir como intermediário é do terceiro setor, a sociedade civil, ou seja, todos nós. Servir como pontes entre as demandas dos governos, que não conseguem atender e os programas de responsabilidade social das empresas, para que sejam unidos com inteligência em projetos sociais inovadores, que impactem a região, que tragam resultados, que transformem paisagens e escolas, que gerem renda e autonomia, que tragam benefícios, independente do governo ou da empresa, mas dependente da própria necessidade em mudar nossa realidade social mais vulnerável.
Estes são os passos futuros das organizações sociais, na visão do Instituto Multi irão, que busquem mais autonomia, mais parcerias, que tragam poesia para o ambiente difícil das comunidades ao mesmo tempo que transformem velhas esperanças em resultados mais práticos para todos. Porque a educação é para agora. E a ponte precisa ser construída já, pelo carente, para o carente, que somos todos nós.